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Cristina Kirchner deveria renunciar

7 de dezembro de 2022

Vice-presidente da Argentina foi condenada a seis anos de prisão por corrupção. Ela se diz vítima de perseguição política, uma posição comum entre populistas, opina Gabriel González.

"Cristina Kirchner sempre polarizou o país. Ela é odiada por muitos argentinos – e idolatrada por tantos outros"Foto: LUIS ROBAYO/AFP/Getty Images

Não é todo dia que um político proeminente é indiciado e condenado pela Justiça de seu país enquanto ainda está no cargo. O caso atual na Argentina é espetacular: a atual vice-presidente e ex-líder da Argentina, Cristina Fernández de Kirchner – a mulher mais poderosa do país –, está no centro de um julgamento que alcançou seu clímax neste 6 de dezembro.

Nesta terça-feira, um tribunal de Buenos Aires condenou Cristina Kirchner a seis anos de prisão e inabilitação perpétua para exercer cargos públicos por corrupção, embora a sentença possa ser apelada e ainda não seja definitiva.

Kirchner sempre polarizou o país. Ela é odiada por muitos argentinos – e idolatrada por tantos outros. Por seu poder e influência sobre os estratos mais pobres da sociedade argentina, é frequentemente comparada a Eva Perón. Foi presidente do país sul-americano de 2007 a 2015 e é viúva de seu antecessor imediato no cargo, Néstor Kirchner. Atualmente, ela é vice-presidente no governo do presidente Alberto Fernández e uma mestre no tráfico de influência.

"Eles não estão vindo atrás de mim, estão vindo atrás de vocês", disse Kirchner recentemente. Nos mais de três anos desde o início do julgamento contra ela, a vice-presidente não perdeu nenhuma oportunidade de desacreditar o processo e classificá-lo de politicamente motivado.

A propósito, a autoria da frase que acabamos de citar é de Donald Trump. Uma cópia literal. Políticos populistas – e Kirchner certamente se enquadra nessa categoria – muitas vezes tendem a equiparar seu bem-estar pessoal ao de seu próprio país ou a comparar ataques contra sua pessoa como ataques a seus apoiadores e eleitores.

"Este não é um julgamento de Cristina Fernández, é um julgamento do peronismo, dos governos nacionais e populares", afirmou Kirchner, lamentando a "perseguição política e midiática" à qual ela – em sua opinião – tem sido submetida.

Em muitos países latino-americanos, o Judiciário é instrumentalizado em disputas políticas e frequentemente utilizado contra adversários que estão à direita ou à esquerda do espectro político – e isso não é novo.

O problema é que a motivação política nem sempre pode ser comprovada de forma clara e contundente. Entre os casos mais conhecidos internacionalmente estão os polêmicos julgamentos contra o ex- e atual presidente eleito do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, e o julgamento e condenação da ex-presidente interina da Bolívia Jeanine Áñez.

Mas os verdadeiros culpados são os políticos, seja de direita ou de esquerda, que repetidamente usam o Judiciário para seus jogos de poder. E a confiança nas instituições democráticas é a grande perdedora nesse jogo.

Os apoiadores de Cristina Fernández de Kirchner se sentiram respaldados por esse veredicto em sua crença de que a vice-presidente foi vítima de uma conspiração política. Enquanto isso, seus adversários querem vê-la atrás das grades o mais rápido possível – e as acusações de corrupção ficam em segundo plano.

O verdadeiro perdedor nesse processo não é Cristina Kirchner, mas a credibilidade no Estado de direito e na independência do Judiciário. E a crescente polarização e o agravamento do clima político na Argentina podem resultar numa revanche amarga nas próximas eleições presidenciais de 2023.

Há outro aspecto que infelizmente tem sido deixado de lado até agora. Por que Kirchner já não renunciou há muito tempo? Não é uma questão de decência política renunciar a todos os cargos políticos no caso de acusações tão graves e não esperar até que o veredito seja proferido?

Na Áustria, Sebastian Kurz renunciou ao cargo de chanceler federal em outubro de 2021 devido a investigações de corrupção. Cristina Kirchner deveria seguir o exemplo, antes tarde do que nunca.

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Gabriel González Zorrilla é jornalista da DW. O texto reflete a opinião pessoal do autor, não necessariamente a da DW.

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