No momento, uma dezena de países europeus depende da Rússia para mais de 75% de sua demanda de gás natural. Isso torna aliados dos Estados Unidos vulneráveis a ter o gás cortado ao bel prazer de Moscou. O presidente russo, Vladimir Putin, tem repetidamente provado sua disposição de usar o suprimento russo como arma, tendo bloqueado o fornecimento a seus vizinhos em 2006, 2009, 2014 e, mais recentemente, em março de 2018.
A dependência da UE em relação ao gás russo apresenta riscos para a Europa e o Ocidente como um todo, e nos torna, todos, menos seguros. O gasoduto Nord Stream 2 aumentará a suscetibilidade europeia às táticas russas de chantagem energética. A Europa deve manter o controle de sua segurança de energia.
Que não haja equívoco: o Nord Stream 2 trará mais do que gás russo. O poder de pressão e influência russos também fluirão sob o Mar Báltico pela Europa adentro, e o gasoduto capacitará Moscou a minar mais ainda a soberania e estabilidade da Ucrânia.
Em troca, a cada ano a Europa transferirá bilhões de euros para Moscou, indiretamente bancando a agressão militar russa em lugares como a Ucrânia e a Síria. Ela também financiará as troll farms e fábricas de desinformação russas que visam instituições democráticas na Europa e nos Estados Unidos. A conclusão da Nord Stream 2 e a importação de mais gás russo para a Europa ajudaria a financiar uma agressão russa ainda maior, por todo o continente.
Devemos fazer a Rússia responder por suas ações malignas. Vinte e quatro marinheiros ucranianos estão padecendo numa prisão russa desde novembro, por ter navegado pelo Estreito de Kerch, uma via marítima que têm permissão legal para utilizar. Com a Rússia à espera de uma reação, permitir que o Nord Stream 2 siga sendo construído envia uma mensagem totalmente errada neste momento.
Os alemães e os demais deveriam considerar as preocupações levantadas por seus vizinhos. A opinião europeia sobre o gasoduto é eloquente: mais da metade dos países-membros da UE tem se oposto publicamente ao Nord Stream 2, e em 12 de dezembro o Parlamento Europeu articulou sua oposição ao projeto numa resolução, reivindicando que o gasoduto seja cancelado e condenando-o como "um projeto político que representa uma ameaça para a segurança energética europeia".
Na Dinamarca, o governo demonstrou ter os instintos certos com a decisão de avaliar atentamente as implicações do projeto para a política externa e de segurança. É louvável a declaração do ministro do Exterior Anders Samuelsen de que a agressão russa torna difícil discutir em favor de um gasoduto russo em águas dinamarquesas.
Ao mesmo tempo, alguns promovem em interesse próprio a narrativa de que é tarde demais para sustar o Nord Stream 2. Isso simplesmente não é verdade. O gasoduto está longe de concluído e mais ainda de estar operacional. A Europa ainda tem tempo para regular e dar um basta ao gasoduto, mas o tempo se escoa.
A UE deveria revisar a Diretriz sobre o Gás de seu Terceiro Pacote de Energia, de forma que as leis do bloco se apliquem a projetos como o Nord Stream 2. Por que companhias não europeias, como a Gazprom, deveriam ter permissão de distorcer a competição no mercado de gás europeu, enquanto estão submetidas a padrões mais baixos do que as companhias da UE?
Revisões da Diretriz beneficiarão todos os europeus, ao incrementar a transparência, fortalecer a segurança energética da Europa e melhorar as práticas comerciais dos fornecedores de gás não europeus da UE.
O Parlamento Europeu e a Comissão Europeia apoiam essas revisões. A maioria dos Estados-membros do Conselho Europeu também os sustenta. Mas o apoio da Alemanha e outros países-chave, como a França, será crítico para que as revisões sejam implementadas.
Não será fácil abandonar o Nord Stream 2, mas muitas vezes não é fácil fazer a coisa certa. Qualquer perda decorrente de sustar o projeto será recompensada com o ganho de segurança energética em todo o continente. A Europa realmente deseja aumentar sua dependência de um país que recentemente empregou armas químicas na Europa, numa tentativa de matar um opositor político? Que invadiu e anexou ilicitamente território de um país soberano? Ou o país que abateu o voo 17 da Malaysia Airlines sobre a Ucrânia, matando 298 civis inocentes?
As capitais europeias deveriam mostrar que são solidárias à Ucrânia e salvaguardam os interesses energéticos de suas populações, e ajudar a encerrar o capítulo desse projeto mal concebido. A Europa não deveria entregar voluntariamente a um adversário o controle de sua segurança de energia. Encerrar o projeto enviaria a mensagem clara de que Moscou não pode sair impune da agressão aos países vizinhos e a ingerência em nossas democracias.
Os autores deste artigo de opinião são Richard Grenell, Carla Sands e Gordon Sondland, respectivamente embaixadores dos Estados Unidos na Alemanha, Dinamarca e União Europeia.
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