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Guerra da Rússia na Ucrânia será longa e arrastada

EU Cristina Vanberghen
Cristina Vanberghen
26 de dezembro de 2022

Da batalha das Termópilas a Waterloo, da guerra de Troia ao Vietnã, semear confusão sempre foi uma ferramenta calculada de conflitos. A guerra de Putin contra Kiev não é exceção, opina a especialista Cristina Vanberghen.

Foto: Jeff J Mitchell/Getty Images

O ministro do Exterior da Rússia, Serguei Lavrov, afirmou recentemente que o país não tem planos de usar armas nucleares. Inicialmente, a retórica "vamos ou não vamos" de Moscou sobre o uso do arsenal nuclear foi utilizada como um argumento para impedir que a Otan interferisse na guerra.

O presidente Vladimir Putin pode não escalar o conflito, mas, para encontrar uma saída, ele apoiaria uma guerra de desgaste em vez de aceitar o fracasso. Supondo que uma guerra nuclear não esteja prevista – e acho isso improvável, dada a capacidade da Rússia de usar outras armas de guerra não convencionais –, temos a perspectiva clara de uma guerra longa e arrastada.

Especialistas preveem de três a quatro anos. Essa suposição difere totalmente do apelo arrogante por uma blitzkrieg [guerra-relâmpago] por parte de Putin, que queria ver um desfile da vitória russa quatro dias após a mobilização. Bem, como se sabe, não foi bem assim.

"O general em seu labirinto"

No nível político, Putin está tentando influenciar a agenda da ONU. Mas isso não funcionou, e ele se torna cada vez mais um pária isolado no Kremlin. Somos lembrados do título de um livro do escritor Gabriel García Márquez: O general em seu labirinto.

Putin se escondeu nas entranhas do Kremlin e enviou seu ministro do Exterior pouco convincente para substituí-lo, fazendo discursos para públicos inexistentes no meio do nada. Mesmo as repetidas tentativas do Ministério do Exterior da Rússia de se aliar a antigos Estados coloniais na África, América do Sul e Sudeste Asiático não tiveram sucesso.

A maioria dos países africanos, que erroneamente veem a guerra como um teatro europeu e, em alguns casos, dependem das armas russas ou da diplomacia russa para suas disputas regionais, percebeu as narrativas de notícias falsas da Rússia e suas tentativas de "armamentizar" alimentos e fertilizantes e passou a exigir a desescalada como uma questão de segurança alimentar regional.

A ameaça de armas nucleares reflete a entrada do Kremlin num reino de delírio político que beira o patológico, e nada mais é do que a apresentação de uma narrativa que contradiz a realidade da guerra. A mobilização de tropas nas últimas semanas é outro sinal de que a Rússia está perdendo.

O controle vacilante sobre a sociedade

Por 22 anos, Putin manteve um pacto implícito com o povo russo: não se envolva em ondas políticas e você viverá confortavelmente. Esse pacto está desmoronando. A ordem de mobilização foi a gota d'água, e é por isso que mais e mais russos estão corajosamente saindo às ruas e falando verdades, ou correndo para as fronteiras para fugir do país. Nessas circunstâncias, uma vitória russa é praticamente impossível.

A política de mobilização de Putin evidentemente não é uma solução para seus problemas militares, mas simboliza um novo, embora vacilante, nível de controle sobre a sociedade em uma atmosfera na qual a guerra contra a Ucrânia está levando a um enfraquecimento do poder central na Rússia. A crescente discórdia em todo o país está finalmente enfraquecendo a posição de Putin.

A redefinição da ordem mundial pela Rússia

A questão fundamental para a Europa na guerra atual é como restaurar o respeito pelo direito internacional em todas as suas múltiplas dimensões, terra, mar, espaço. O foco está na estabilização e reconstrução da Ucrânia como pedra angular para o fortalecimento da prosperidade e da paz em todo o mundo.

E talvez seja por isso que o presidente francês, Emmanuel Macron, sentiu que "uma das questões-chave que precisamos abordar – como o presidente Putin sempre disse – é o medo de que a Otan esteja bem às portas [da Rússia], bem como o uso de armas que possam ameaçar a Rússia".

Obviamente, isso não é uma justificativa para a guerra de Putin, mas sim uma forma de se opor à invasão de Putin enquanto se examina se as preocupações de segurança da Rússia têm alguma base na realidade. Na nossa opinião, embora essa seja uma premissa razoável, ela não responde à verdadeira questão: por que a guerra começou e para onde ela está indo?

A Rússia não invadiu a Ucrânia por medo da expansão da Otan – os Acordos de Minsk deram à Rússia as garantias de que ela precisava. Mas foi alimentado pela necessidade de assumir um empreendimento estrangeiro a fim de ocultar ou justificar a instabilidade e o declínio domésticos – o que o grande poeta grego Constantine P. Cavafy chamou de "esperar pelos bárbaros".

A Rússia quer redefinir a ordem global. E é por isso que esta guerra persiste e será difícil de acabar. É impossível permitir que a Rússia exerça hegemonia regional mantendo a integridade territorial da Ucrânia.

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Cristina Vanberghen é doutora, leciona na Universidade Livre de Bruxelas e atua como especialista sênior na Comissão Europeia. O texto reflete a opinião do autor, não necessariamente a da DW.

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