Quem quer vença a eleição deste domingo não devolverá a estabilidade política ao país. O mais provável, porém, é que o Brasil siga o exemplo britânico: votar e depois se arrepender, opina a jornalista Astrid Prange.
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Para uns ele é "Hitler dos trópicos", para outros um "messias", como seu nome do meio sugere: Jair Messias Bolsonaro, o candidato de extrema direita favorito na eleição presidencial deste domingo (28/10), deve, segundo as pesquisas, sair vencedor. Seu triunfo representaria para o Brasil um "exit" da democracia, um desastre para a liberdade e o Estado de Direito – apenas 33 anos depois do fim da ditadura militar.
O possível "Braxit" seria a consequência mais recente de uma crise política que já se estende por cinco anos e de uma campanha eleitoral com traços antidemocráticos. No Brasil, a força destrutiva das fake news teve impacto indiscutível, descarregado, em grande parte, no ódio ao PT de Fernando Haddad.
O Brasil não é o primeiro país onde campanhas de ódio influenciam processos eleitorais. Mas o enorme alcance do Twitter, Facebook e, sobretudo, Whatsapp no maior país da América do Sul gerou um terremoto político, cuja força acabou sendo subestimada pelas mídias tradicionais e pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
A campanha eleitoral brasileira faz lembrar a campanha do Brexit de 2016: uma trupe profissional de propaganda digital dispara notícias falsas, sem ser punida, sabendo muito bem que uma correção dessa avalanche de desinformação não é mais possível.
Essa tragédia está longe do fim. Afinal, quem quer vença a eleição deste domingo não devolverá a estabilidade política ao Brasil. No improvável cenário da vitória de Haddad, o resultado das urnas seria posto em dúvida por apoiadores de Bolsonaro, o que poderia dar origem a uma onda de violência.
Já a vitória de Bolsonaro sofreria com três fatores: ele vai encontrar uma resistência ferrenha, tanto em parcelas do Congresso como de parte da sociedade civil. A posse do seu vice, o general Hamilton Mourão, na Presidência não pode ser totalmente descartada diante das condições de saúde de Bolsonaro, originadas da facada que ele sofreu durante a campanha eleitoral.
O fator mais pesado, porém, seria a denúncia de fraude eleitoral encaminhada ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE): a acusação afirma que a campanha de Bolsonaro recebeu o apoio ilegal de empresas, que teriam financiado uma ampla disseminação de notícias falsas nas mídias sociais já antes do primeiro turno. Se as investigações comprovarem que houve crime eleitoral, a candidatura de Bolsonaro poderia, em tese, ser cassada, e a eleição, anulada.
Ao menos na teoria, não há o que discutir: um resultado eleitoral influenciado por fake news não pode ser válido, pois, sem as notícias falsas, o resultado provavelmente seria outro. A questão central, porém, é outra: o tribunal estaria em condições de anular e mandar repetir a eleição presidencial?
O Brasil teria a chance de deter a manipulação digital. O país poderia se tornar referência para a vitória da democracia sobre as fake news e os misantropos que pregam o ódio nas redes sociais. Poderia assumir um papel precursor na já mais do que atrasada regulamentação de plataformas como Facebook, Whatsapp, Twitter e afins.
Poderia. O mais provável, porém, é que o Brasil siga o exemplo britânico: votar e depois se arrepender. Um Braxit teria consequências tão desastrosas para o Brasil como o Brexit para o Reino Unido. Na melhor das hipóteses, o país está diante de mais quaro anos de paralisia política e insatisfação. Na pior, está diante do início de uma ditadura.
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Treze candidatos se apresentaram para disputar o Planalto. O líder das pesquisas acabou fora da corrida, e vários nomes tentam contornar isolamento partidário. Veja os principais episódios da disputa.
Foto: Reuters/A. Machado
Bolsonaro é eleito presidente
Em segundo turno, os brasileiros elegeram Jair Bolsonaro (PSL) como presidente. Após uma campanha eleitoral polarizada, o militar reformado de extrema direita recebeu 55,13% dos votos, contra 44,87% de Fernando Haddad (PT). Com bandeiras do Brasil e vestidos nas cores verde e amarelo, eleitores comemoram pelo país. No discurso da vitória, Bolsonaro prometeu um governo constitucional e democrático.
Foto: picture-alliance/AP Photo/S.Izquierdo
TSE abre investigação contra Bolsonaro
A pouco mais de uma semana do segundo turno, o Tribunal Superior Eleitoral abriu uma ação para investigar suspeitas de compra de disparos de mensagens antipetistas no WhatsApp por parte de empresários aliados a Bolsonaro. O pedido de investigação foi feito pelo PT, após uma reportagem do jornal "Folha de S. Paulo". A PF também abriu inquérito para investigar a disseminação em massa de "fake news".
Foto: Reuters/R. Moraes
Bolsonaro e Haddad vão ao segundo turno
Numa das eleições mais polarizadas da história, em 7 de outubro os brasileiros levaram ao segundo turno os dois candidatos que, segundo sondagens, são também os mais rejeitados: Bolsonaro (PSL) e Haddad (PT). Favorito no Sul e Sudeste, o ex-militar teve 46% dos votos válidos contra 29% do petista, que foi o mais votado em oito estados do Nordeste e no Pará. Em terceiro, Ciro Gomes (PDT) teve 12%.
Foto: Reuters/P. Whitaker/N. Doce
Bolsonaro cresce nas pesquisas
Já líder nas pesquisas, o candidato do PSL ampliou sua vantagem no início de outubro, ultrapassando pela primeira vez a marca de 30% em sondagens do Ibope e do Datafolha. Ao longo da semana que antecedeu as eleições, o ex-capitão foi subindo e, na véspera do pleito, cruzou a barreira de 40% dos votos válidos. Após ser esfaqueado, a campanha do candidato se concentrou nas redes sociais.
Foto: Reuters/P. Whitaker
A troca de Lula por Haddad
Após meses de suspense e com aval de Lula, Fernando Haddad foi oficializado candidato à Presidência pelo PT em 11 de setembro, a menos de um mês do primeiro turno, após se esgotarem as chances de o ex-presidente concorrer. Preso e virtualmente inelegível pela Ficha Limpa, Lula era líder nas pesquisas de intenção de voto. O desafio agora será transferir votos para o ex-prefeito.
Foto: Agencia Brasil/R. Rosa
Ataque a Bolsonaro
O candidato do PSL foi esfaqueado durante um ato de campanha em Juiz de Fora, um ataque que prometia mudar os rumos da corrida presidencial. Seus adversários condenaram a agressão, e alguns chegaram a mudar o tom da campanha. Não houve, contudo, um impacto decisivo sobre o eleitorado. Ele segue líder das intenções, mas com percentual praticamente igual. A rejeição a ele, por outro lado, aumentou.
Foto: picture-alliance/dpa/Agencia O Globo/A. Scorza
O "plano B" do PT
Com Lula virtualmente inelegível, a escolha do seu vice passou a ser encarada como um trampolim para um candidato substituto. No início de agosto, o PT acabou indicando Fernando Haddad, que desde o início do ano era cotado como "plano B". Manuela D'Ávila (PCdoB) ficou com a curiosa posição não oficial de "vice do vice", assumindo a posição com Lula candidato ou não.
Foto: Agência Brasil/F.Rodrigues Pozzebom
A novela dos vices
A fase de convenções começou no fim de julho sem que a maioria dos pré-candidatos tivesse um vice. Bolsonaro teve três convites recusados até fechar com o general Mourão (PRTB). Henrique Meirelles (MDB) e Ciro Gomes (PDT) se contentaram com nomes do próprio partido. Alckmin teve convite recusado pelo empresário Josué Alencar, cuja família é ligada a Lula, antes de optar por Ana Amélia (PR).
Foto: Agência Brasil/F.Frazão
Os candidatos isolados
A jogada de Alckmin com o "centrão" acabou isolando outros candidatos. Jair Bolsonaro (PSL) tentou negociar com o PR, mas teve que se contentar com o nanico PRTB. Ciro Gomes (PDT) também viu suas investidas no grupo naufragarem. Marina Silva (Rede) e Ciro também não conseguiram apoio do PSB, que ficou neutro numa manobra do PT. Os três terminaram a fase de convenções com pouco apoio e tempo de TV.
Alckmin fecha com o "centrão"
Em julho, o tucano Geraldo Alckmin ainda patinava nas pesquisas, mas criou um fato novo na campanha ao conseguir o apoio do "centrão", as siglas que costumam emprestar seu apoio a governos em troca de cargos e verbas. Ao se aliar com PR, PP, PSD, DEM e SD, Alckmin passou a dominar 44% da propaganda eleitoral na TV. Sua coligação também recebe 48% do novo fundo de campanhas.
Foto: Getty Images/AFP/E. Sa
Candidaturas descartadas
A eleição de 2018 parecia destinada a superar o número de candidatos de 1989, quando 22 disputaram. Em abril, 23 manifestavam interesse em concorrer, entre eles o presidente Michel Temer, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, e o ex-presidente Fernando Collor. Mas eles logo desistiram ou foram abandonados por seus partidos. Outros aceitaram ser vices. Em agosto, só 13 permaneciam na corrida.
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Os "outsiders" saem de cena
A possibilidade de Lula ficar de fora e o sentimento antipolítico entre a população sinalizavam que esta seria a eleição dos "outsiders". O ex-ministro do Supremo Joaquim Barbosa e o apresentador Luciano Huck chegaram a ser incluídos em pesquisas. O empresário Flávio Rocha anunciou candidatura. Em julho, todos já haviam desistido, e a disputa ficou restrita a velhos nomes da política.
Foto: Imago/ZUMA Press/M. Chello
Lula é condenado e preso
Quando anunciou, em 2016, a intenção de disputar a eleição, Lula se tornou o líder nas pesquisas. Em janeiro, porém, sua situação se complicou após uma condenação em segunda instância que o deixou virtualmente inelegível. Em abril, foi preso. Com a possibilidade de a candidatura ser barrada, o PT passou a ter dificuldades em formar alianças, e o desfecho do pleito ficou ainda mais imprevisível.
Foto: Reuters/L. Benassatto
Entra em cena o fundo de campanhas
Diante da proibição das doações por empresas, o Congresso criou em outubro de 2017 um novo fundo de R$ 1,7 bilhão para financiar candidaturas, já definindo a capacidade financeira de várias campanhas. Quase 60% do valor ficou concentrado em seis legendas: MDB, PT, PSDB, PP, PSB e PR, deixando candidatos à Presidência de pequenas e médias siglas com menos recursos na largada.