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Opinião: O avanço populista na América Latina

Thofern Uta
Uta Thofern
29 de dezembro de 2017

O populismo em si poderá ser o grande vitorioso de 2018. Por toda parte, a interminável onda de escândalos de corrupção abalou a confiança na política, sem fortalecer a confiança no Estado de Direito, opina Uta Thofern.

O presidente da Venezuela, Nicolás MaduroFoto: picture-alliance/abaca/C. Becerra

And the winner is…. Nicolás Maduro. O presidente da Venezuela chega ao fim do ano como vencedor indiscutível, não só da luta pelo poder no próprio país, mas também em comparação à maioria dos demais chefes de Estado da América do Sul.

Seus índices de popularidade são atualmente mais altos do que os do prêmio Nobel da Paz Juan Manuel Santos, na vizinha Colômbia; o Parlamento em Caracas foi destituído; a divisão de poderes em favor da tão seleta quanto onipotente Assembleia Constituinte está suspensa; e a oposição, fragmentada. Esse sujeito está muito além do populismo e não precisa mais se preocupar com a re-"eleição" em 2018.

Da mesma forma, Raúl Castro nem precisa cogitar se a herança comunista de sua família estará em perigo, depois que ele abdicar. Em Cuba, tudo seguirá seu passo socialista, o Partido Comunista tem tudo sob controle, e, desde Donald Trump, não é mais de se esperar uma mudança através da aproximação com os Estados Unidos.

O legado de Santos na Colômbia, por sua vez, é frágil. O processo de paz com as Farc vai mancando atrás do cronograma, decepcionando muitos colombianos que esperavam um dividendo de paz rapidamente perceptível. Além disso, é fortemente controvertida a participação política dos ex-guerrilheiros, assim como as penas relativamente brandas impostas pela Justiça interina, e a oposição não hesita em espalhar os boatos mais tenebrosos a esse respeito.

A eleição legislativa em março já poderá dificultar ou reverter os passos seguintes no processo de paz, ao trazer novas maiorias. No pleito presidencial de maio, Santos não pode mais concorrer, e se parte do princípio que a decisão só chegará num segundo turno. A polêmica populista contra o acordo de paz certamente definirá a campanha eleitoral. Fica em aberto até que ponto o próximo presidente ainda vai poder ou querer implementar o pacto.

O populismo em si poderá ser o grande vitorioso de 2018. Por toda parte, a interminável onda de escândalos de corrupção sempre renovados abalou a confiança na política, sem fortalecer a confiança no Estado de Direito.

Nas duas maiores economias da América Latina, Brasil e México, a corrupção igualmente desacredita os esforços por uma economia mais sustentável, que aposte antes em crescimento autônomo do que na redistribuição de renda. 

O Brasil precisa, a rigor, diante da catastrófica crise de confiança no país, de uma reforma fundamental do sistema político, antes que se realizem eleições. Os fronts entre as alas políticas se endureceram desde o altamente polêmico processo de impeachment contra Dilma Rousseff.

As investigações de corrupção nos mais altos escalões acabaram por comprometer a reputação de todos os grandes partidos. O presidente Michel Temer é o chefe de Estado mais impopular do mundo, com um nível de apoio de, no máximo, 5%. O único político que ainda desfruta de boa reputação, pelo menos entre seus correligionários, é o legendário Luís Inácio Lula da Silva. Devido às acusações de corrupção, entretanto, ele provavelmente não poderá se candidatar à presidência.

E assim, no momento o inextricável e clientelista sistema partidário brasileiro propele Jair Bolsonaro, um desagradável populista de direita, racista homofóbico e defensor declarado da velha ditadura militar, ao segundo lugar nas pesquisas de opinião, atrás de Lula.

No México, em contrapartida, a insatisfação com o atual presidente, Enrique Peña Nieto, favorece a corrupção que grassa, e a consequente impunidade para os inúmeros assassinatos e outros crimes capitais de um populista de esquerda: Andrés Manuel López Obrador, vulgo AMLO, já se candidatou duas vezes, inutilmente, à presidência. Mas desta vez suas chances são boas.

Afinal, ele concorre, de um lado, com uma aliança pouco credível de democratas cristãos, social-democratas e um movimento de cidadania, do outro, com o ex-ministro do Exterior e das Finanças José Antonio Meade, representando o eterno partido presidencial PRI.

Muitos eleitores possivelmente responsabilizam Meade pelo monte de ruínas que sobrou do ambicioso "Pacto para o México" de Peña Nieto. Nenhum progresso econômico ou ambiental é capaz de apagar a brutal violência quotidiana, que permanece impune no México. Uma outra questão, contudo, é se política de redistribuição de renda sem crescimento econômico vai melhorar a situação.

As eleições em Costa Rica e no Paraguai, apesar de pouco influenciarem a dinâmica na América Latina, poderão contribuir um pouco para a estabilidade, de forma que esse papel não caiba apenas às ditaduras de Cuba e Venezuela.

Uta Thofern é chefe do Departamento América Latina da DW.

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Uta Thofern Chefe do Departamento América Latina. Democracia, Estado de direito e direitos humanos são seu foco.
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