O jogo acabou para o Ocidente, que nem mesmo ousou tentar se impor perante a Rússia. A única tarefa que resta aos países ocidentais é tentar aliviar um pouco o sofrimento dos sírios, opina o jornalista Kersten Knipp.
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As declarações não poderiam ser mais contraditórias: os militares russos afirmam que estão combatendo posições da organização terrorista "Estado Islâmico" (EI) na região em torno da cidade de Homs. Estados Unidos, França e o Exército Livre da Síria têm outra versão: em alguns dos locais atacados nem mesmo há combatentes do EI. O alvo seriam sobretudo opositores do presidente Bashar al-Assad.
Independentemente de qual versão é a correta, uma coisa já é certa: o presidente da Rússia, Vladimir Putin, conseguiu o que queria. Tem-se a impressão de que, ao longo de anos e de forma sistemática, ele vem se preparando para este dia: através dos repetidos vetos no Conselho de Segurança da ONU, das firmes declarações de solidariedade e do amplo apoio militar a Assad.
Putin sabia que podia contar com o apoio da China no Conselho de Segurança e, na própria região, ele tem trabalhado em estreita colaboração com o Irã. Três nações com culturas políticas dúbias, para dizer o mínimo. Três regimes que não têm problemas em adotar um estilo autoritário de liderança. Três regimes que decidirão o futuro da Síria e também de uma grande parte do mundo árabe.
Isso significa que o jogo acabou para o Ocidente. Em retrospecto, parece que o Ocidente, ao longo dos quase cinco anos que já dura a guerra civil na Síria, nunca conseguiu realmente se impor perante a Rússia. Acordo de Genebra I, Genebra II, Amigos da Síria e inúmeras conferências em inúmeros locais: tudo isso não deu em nada. De acordo com as estatísticas da ONU, cerca de 250 mil sírios morreram no conflito. Talvez o número seja até bem maior.
O Ocidente não foi capaz de salvar essas pessoas. Ele não conseguiu se impor perante o obstrucionismo russo. Nem mesmo ousou. E o que poderia ter sido feito? Na Ucrânia, Putin mostrou até onde está disposto a ir para atingir seus objetivos. Na Síria, ele provavelmente teria exibido a mesma determinação – certamente também se o presidente Barack Obama tivesse optado por sanções a Assad caso o ditador tivesse ultrapassado a "linha vermelha" que o líder americano havia estabelecido.
Nenhum gesto mostrou de forma tão enfática como o Ocidente é manso. E sobretudo impotente. Ele simplesmente não sabe como reagir a uma política brutal como a praticada por Putin. E qual seria a resposta apropriada, além de sanções? Ninguém mais quer fazer as bombas falarem, e por bons motivos. Mas isso significa: Putin conseguiu o que queria. A mensagem é clara: um quarto de século depois, a Rússia é de novo uma superpotência.
Para a Síria, isso significa que Assad ficará no poder. Para a oposição secular síria, isso significa: vocês vão ter que aceitar isso. No ínico desta semana, Burhan Ghalioun, ex-presidente do grupo oposicionista Conselho Nacional Sírio (SNC), defendeu indiretamente que Assad se vá. Os motivos são irrefutáveis – ao menos teoricamente. Só que, na prática, é necessário se acostumar com a ideia de que não é bem assim: os sírios terão que continuar vivendo sob seu ditador.
A fim de pelo menos aliviar um pouco o sofrimento deles, resta uma opção aos países ocidentais: eles precisam fazer com que Putin pelo menos domestique o seu protegido. Se Assad vai mesmo ficar, que pelo menos cause o menor dano possível ao seu povo. Ele tem que parar de aterrorizar a sua população com bombas todos os dias, obrigando milhões a fugir. Essa é a tarefa mais urgente para o Ocidente. Mais do que isso ele simplesmente não pode fazer. Ao menos por enquanto, a única coisa que resta é poupar os sírios do pior.
Síria: patrimônio histórico destruído na guerra civil
Cerca de 300 locais de interesse histórico já foram danificados, saqueados ou totalmente destruídos na guerra civil da Síria. Uma excursão aos patrimônios culturais ameaçados do país.
Foto: Fotolia/Facundo
Destruição
Em quase quatro anos, a guerra civil síria contabilizou centenas de milhares de mortos e o deslocamento de cerca de dez milhões de pessoas. Análises do Instituto das Nações Unidas para a Formação e Pesquisa (Unitar, em inglês) feitas por satélites mostram a destruição de patrimônios culturais no país. Nesta foto, o centro histórico de Damasco.
Foto: picture-alliance/dpa/M. Tödt
Mesquita dos Omíadas
A análise revelou que 290 sítios culturais foram fortemente atingidos. Do ano 708, a Mesquita dos Omíadas, em Damasco, teve o mosaico de sua fachada destruído por tiros.
Foto: picture-alliance/blickwinkel/Neukirchen
Imagem de destruição
Especialmente atingida foi a metrópole de Aleppo, que, com 7 mil anos de história de assentamentos, faz parte das cidades mais antigas do mundo. A imagem de satélite à direita mostra a destruição na região próxima à cidadela.
Foto: US Department of State, Humanitarian Information Unit, NextView License (DigitalGlobe)
Antes dos tiros
A Mesquita dos Omíadas, em Aleppo, também foi fortemente danificada. A mesquita, do ano 715, foi reconstruída diversas vezes nos séculos seguintes à sua construção. Especialmente o minarete, do ano de 1092, é considerado uma obra-prima arquitetônica. Aqui, uma foto da mesquita antes de ser destruída.
Foto: picture alliance/Bibliographisches Institut/Prof. Dr. H. Wilhelmy
Troca de acusações
O minarete da Mesquita dos Omíadas foi destruído durante uma batalha, em 2013. Hoje sobrou somente o escombro, já que grande parte da edificação foi gravemente danificada. O governo e os rebeldes acusam-se mutuamente.
Foto: J. Al-Halabi/AFP/Getty Images
Luta implacável
A batalha entre o governo e rebeldes por Aleppo ocorre desde 2012 e faz com que os danos sejam proporcionais ao tempo do confronto. O hotel Carlton, de 150 anos, em frente à cidadela de Aleppo, era famoso, entre outros motivos, por seu interior histórico e bem conservado.
Foto: CC-SA-BY-Preacher lad
Totalmente destruído
Hoje não sobrou nada do hotel. Em maio de 2014 foram acionados explosivos em um túnel localizado embaixo da construção. De 210 prédios históricos analisados pela Unitar em Aleppo, a metade foi danificada e um quinto foi totalmente destruído.
Foto: picture-alliance/AP Photo
Mercado de "conto de fadas"
Visitantes do mercado de Aleppo se sentiam num conto de fadas das mil e uma noites. O bazar, que permaneceu inalterado desde o século 16, consistia de uma longa rede de vielas totalizando sete quilômetros.
Foto: AP
Perdido para sempre
Em 2012, um incêndio causou danos irreversíveis ao mercado. De acordo com números oficiais, 1.500 das 1.600 lojas no bazar foram danificadas ou destruídas.
Foto: AP
Inconquistável, mas…
Numa fortaleza curda, foi construído durante os séculos 12 e 13 o chamado Forte dos Cavaleiros, um castelo para cavaleiros das Cruzadas. A edificação era conhecida por nunca ter sido conquistada por meio de guerra ou de cerco.
Foto: picture-alliance/AP Photo/D. Vranic
… não indestrutível
O castelo, que se localiza ao leste de Homs e próximo à fronteira com o Líbano, foi submetido novamente à artilharia de fogo e ataques aéreos. A luta deixou o teto e muros destruídos, como também partes da edificação desmoronadas.
Foto: picture-alliance/AP Photo/D. Vranic
Impossível de se reconhecer
Dura Europos foi fundada no ano 300 a.C. como uma colônia militar. Aqui não somente as batalhas, mas também os constantes saques foram responsáveis para que muitas edificações da chamada "Pompeia síria" não sejam mais reconhecíveis.
Foto: picture-alliance/akg-images/Leo G. Linder
Templo destruído
A cidade de Palmira é considerada um dos centros culturais da antiguidade. Lutas, saques e o roubo de pedras afetaram consideravelmente as atrações históricas. De 2 mil anos, o templo de Baal – na foto, antes da guerra civil – perdeu uma de suas colunas.