1. Pular para o conteúdo
  2. Pular para o menu principal
  3. Ver mais sites da DW

Presidente alemão acerta ao discursar sobre Dresden

Thurau Jens Kommentarbild App
Jens Thurau
14 de fevereiro de 2020

Ao lembrar 75 anos do bombardeio da cidade alemã, Steinmeier fez discurso surpreendentemente atual, abordando antissemitismo e xenofobia e mostrando ser um claro defensor da democracia, opina Jens Thurau.

Steinmeier em Dresden: "Temos que enfrentar quem falsifica fatos históricos"Foto: picture-alliance/dpa/R. Michael

Qualquer discurso sobre o aniversário do terrível bombardeio de Dresden na noite do dia 13 para o dia 14 de fevereiro de 1945 é um ato na corda-bamba. A tempestade de fogo que atingiu a cidade da Saxônia, às margens do rio Elba, foi repetidamente instrumentalizada pelos mais diversos grupos: primeiro pelos nazistas, ainda nos últimos meses da guerra, depois pelo governo da antiga Alemanha Oriental, e atualmente por neonazistas e por aqueles que permanecem presos no passado.

Na maioria das vezes, isso acabava culminando numa disputa absurda pelo número de mortos – que os nazistas, por exemplo, estimavam em centenas de milhares. Ainda assim, depois da Reunificação alemã, as discussões sobre a noite do bombardeio se concentravam sobretudo na questão de a tragédia dever ser lembrada isoladamente ou se apenas sua contextualização histórica pode realmente fazer jus às vítimas. 

Quando escreveu seu discurso, portanto, Frank-Walter Steinmeier sabia do escrutínio ao qual suas palavras seriam submetidas. E o presidente alemão não conseguiu apenas contextualizar o ocorrido – ele pronunciou um discurso surpreendentemente atual, que fala abertamente sobre as origens da guerra e a destruição que se seguiu.

Por isso, a palavra Dresden só apareceu depois que ele leu três longos parágrafos iniciais. Steinmeier começou com a invasão alemã da Polônia e da violência que em seguida assolou a Europa.

Em nenhum momento, porém, o chefe de Estado da Alemanha relativizou o sofrimento dos cidadãos de Dresden. Pelo contrário: pintou um quadro visceral daquela noite, falou do barulho estrondoso dos aviões, do céu vermelho, do fogo que sugou todo o oxigênio das ruas da cidade. Mas ele também mencionou outras cidades, tanto na Alemanha quanto em outros locais da Europa: Hamburgo, Würzburg, Nápoles, Belgrado, Varsóvia e Coventry.

E ele fechou esse trecho do discurso com a clara frase: "Quem hoje ainda tenta equiparar os mortos de Dresden aos mortos em Auschwitz, quem tenta minimizar as injustiças da Alemanha, quem falsifica fatos históricos apesar de conhecer a verdade – são essas pessoas que nós, como democratas, temos que enfrentar."

"Nós, como democratas." Steinmeier sabe que há novamente negacionistas dos crimes nazistas nos parlamentos alemães e ele se distanciou claramente deles. Trata-se de uma nova interpretação do papel do presidente alemão, que, historicamente, sempre teve o dever de ser apartidário, resumindo e mediando todas as opiniões da população. Mas não neste momento.

Steinmeier foi até mais além, falando de antissemitismo e xenofobia na atualidade. E acrescenta: "Quando legisladores traem e ridicularizam os parlamentos em que atuam, isso é uma tentativa de destruir a democracia a partir de seu interior." Os populistas de direita nas assembleias legislativas estaduais e no Bundestag (Parlamento alemão) podem vestir a carapuça.

Sim, isso tudo cabe num discurso em memória aos 75 anos da tempestade de fogo contra Dresden. E, de forma consciente, a fala acabou com a resposta a todos os que vivem no passado. O presidente fez o que seu cargo exige, além de toda a parcela simbólica.

Ele lembrou aquilo que deve unir todos os alemães: a Lei Fundamental, ou seja, a Constituição de um Estado democrático. "Vamos proteger a dignidade de cada ser humano, também – e especialmente – aqui em Dresden." De cada ser humano, e não apenas de cada alemão.

Steinmeier deverá conseguir viver com críticas de setores direitistas, não é a primeira vez que lida com isso. Mas é bom saber que o presidente alemão se enxerga como um defensor da democracia, e de forma mais nítida do que nunca. Uma democracia que não é composta apenas por leis, regulamentos e regras parlamentares, mas se define mais por entendimentos, posturas claras, por responsabilidade histórica.

A grande maioria dos alemães ainda compartilha da visão de Steinmeier. É bom que ele levante sua voz por esse amplo grupo.

______________

A Deutsche Welle é a emissora internacional da Alemanha e produz jornalismo independente em 30 idiomas. Siga-nos no Facebook | Twitter | YouTube 
App | Instagram | Newsletter

Pular a seção Mais sobre este assunto