Processo de conciliação Alemanha-Namíbia apenas começa
Daniel Pelz
28 de maio de 2021
Berlim pretende se desculpar oficialmente pelo genocídio dos herero e nama na Namíbia. No entanto, é longo o caminho até as feridas coloniais sararem, e o processo ainda exigirá muito trabalho, opina Daniel Pelz.
Anúncio
Finalmente a Alemanha assumiu oficialmente a responsabilidade pelo genocídio dos povos herero e nama. Finalmente um presidente alemão pronunciará as palavras que o Sudoeste da África está esperando há mais de 100 anos. Finalmente não se calará, minimizará, nem tentará ignorar um crime atroz praticado por alemães.
Finalmente, um grande passo – do ponto de vista alemão. As primeiras reações da Namíbia soam diferente: a admissão seria "um passo na direção certa", como formulou, cautelosa e diplomaticamente, um porta-voz da presidência namibiana.
Enquanto isso, tanto (alguns) líderes tradicionais dos herero e nama quanto políticos oposicionistas gritam: "Traição! Ofensa! Golpe de relações públicas!" Eles querem negociar diretamente com Berlim, não confiam nas asserções de que as duas etnias é que se beneficiarão em primeira linha do planejado programa de desenvolvimento.
Eles estão revoltados por o governo alemão afirmar repetidamente que não há base jurídica para reparações: para eles soa como se Berlim considerasse isso uma espécie de presente. Certamente também há hereros e namas que saúdam o acordo, mas ninguém sabe quem representa sua maioria.
Anúncio
Um longo caminho
Agora muita responsabilidade pousa sobre os ombros de ambos os governos. O pedido de conciliação só vale alguma coisa se a maioria dos namibianos o aceitarem, e isso depende de confiança. Há que desejar ao presidente alemão, Frank-Walter Steinmeier, sorte para encontrar as palavras certas. As chances são boas: trata-se de um homem que conhece o poder das palavras e é capaz de encontrar o tom certo no momento adequado.
Contudo, gestos também contam: um pedido de desculpas no parlamento da Namíbia é um grande momento. Mas é igualmente importante pronunciar esse pedido de perdão no local onde o genocídio ocorreu, concretamente: nos territórios dos herero e nama, diante dos memoriais para as vítimas e na presença de seus descendentes.
E aí? Aí é que começa o trabalho de verdade, as desculpas não podem ser o ponto final, e sim o começo. A conciliação começa quando, na Alemanha, ruas e monumentos não mais recordarem, acriticamente, os protagonistas do colonialismo alemão na Namíbia, mas sim as vítimas.
A conciliação começa quando os livros e currículos escolares alemães não mais silenciarem sobre o genocídio, mas o tematizarem amplamente; quando os turistas alemães na Namíbia não mais virem apenas os prédios pitorescos da era colonial, mas sim a horrível história por trás deles; quando não só o presidente e o governo federal assumirem a história alemã na Namíbia, mas sim a maioria dos alemães.
A conciliação começa quando os cidadãos namibianos, sobretudo os herero e nama, virem e acreditarem que a Alemanha leva o assunto a sério. A conciliação começa quando alemães e namibianos prantearem juntos as vítimas. Mas, até lá, o caminho é longo.
---
Daniel Pelz é jornalista da DW. O texto reflete a opinião pessoal do autor, não necessariamente da DW.
Dez fatos sobre a Alemanha colonialista
Os dolorosos legados do passado colonial alemão.
Foto: Jürgen Bätz/dpa/picture alliance
"Nosso futuro está na água"
Sob o chanceler Otto von Bismarck, o Império Alemão estabeleceu colônias nos atuais territórios da Namíbia, Camarões, Togo, partes da Tanzânia e do Quênia. O imperador Guilherme 2°, coroado em 1888, procurou expandir ainda mais as possessões coloniais através da criação de novas frotas de navios. O império queria seu "lugar ao Sol", declarou Bernhard von Bülow, um chanceler posterior, em 1897.
Foto: picture alliance/dpa/K-D.Gabbert
Colônias alemãs
Foram adquiridos territórios no Pacífico (Nova Guiné do Norte, Arquipélago de Bismarck, Ilhas Marshall e Ilhas Salomão, Samoa) e na China (Qingdao). Em 1890, uma conferência em Bruxelas determinou que o Império Alemão obtivesse os reinos de Ruanda e Burundi, unindo-os à África Oriental Alemã. Até o final do século 19, as conquistas coloniais da Alemanha estavam praticamente concluídas.
Foto: picture-alliance / akg-images
Um sistema de desigualdade
Nas colônias, a população branca formava uma minoria pequena e altamente privilegiada – raramente mais de 1% da população. Em 1914, por volta de 25 mil alemães moravam nas colônias. Desses, pouco menos da metade vivia no Sudeste Africano Alemão. Os 13 milhões de nativos nas colônias germânicas eram vistos como subordinados, sem acesso a nenhum recurso da lei.
Foto: picture-alliance/dpa/arkivi
O primeiro genocídio do século 20
O genocídio praticado contra os hereros e os namas no Sudeste Africano Alemão, hoje Namíbia, foi o crime mais grave da história colonial da Alemanha. Durante a Batalha de Waterberg, em 1904, a maioria dos rebeldes hereros fugiu para o deserto, com as tropas alemãs bloqueando sistematicamente seu acesso à água. Estima-se que mais de 60 mil hereros morreram na ocasião.
Foto: public domain
Crime alemão
Somente 16 mil hereros sobreviveram à campanha de extermínio. Eles foram aprisionados em campos de concentração, onde muitos morreram. O número exato de vítimas nunca foi constatado e continua a ser um ponto de controvérsia. Quanto tempo esses hereros debilitados sobreviveram no deserto? De qualquer forma, eles perderam todos os seus bens, seu estilo de vida e suas perspectivas futuras.
Foto: public domain
Guerra colonial de longo alcance
De 1905 a 1907, uma ampla aliança de grupos étnicos se rebelou contra o domínio colonialista na África Oriental Alemã. Por volta de 100 mil locais morreram na revolta de Maji-Maji. Embora tenha sido, posteriormente, um tema pouco discutido na Alemanha, este capítulo permanece importante na história da Tanzânia.
Foto: Downluke
Reformas em 1907
Na sequência das guerras coloniais, a administração nos territórios alemães foi reestruturada com o objetivo de melhorar as condições de vida ali. Bernhard Dernburg, um empresário bem-sucedido (na foto sendo carregado na África Oriental Alemã), foi nomeado secretário de Estado para Assuntos Coloniais em 1907 e introduziu reformas nas políticas do Império Alemão para seus protetorados.
Foto: picture alliance/akg-images
Ciência e as colônias
Junto às reformas de Dernburg, foram estabelecidas instituições técnicas e científicas para lidar com questões coloniais, criando-se faculdades nas atuais universidades de Hamburgo e Kassel. Em 1906, Robert Koch dirigiu uma longa expedição à África para investigar a transmissão da doença do sono. Na foto, veem-se espécimes microscópicas colhidas ali.
Foto: Deutsches Historisches Museum/T. Bruns
Colônias perdidas
Derrotada na Primeira Guerra Mundial, em 1919, a Alemanha assinou o tratado de paz em Versalhes, especificando que o país renunciaria à soberania sobre suas colônias. Cartazes como o da foto ilustram o medo dos alemães de perder seu poder econômico, como também o temor da pobreza e miséria no país.
Foto: DW/J. Hitz
Ambições do Terceiro Reich
Aspirações coloniais ressurgiram sob Hitler – e não somente aquelas definidas no Plano Geral de Metas para o Leste, que delineou a colonização da Europa Central e Oriental através do genocídio e limpeza étnica. Os nazistas também almejavam recuperar as colônias perdidas na África, como evidencia este mapa escolar de 1938. Elas deveriam fornecer matérias-primas para a Alemanha.