Qual será a gota d'água de Trump para os republicanos?
Michael Knigge
Opinião
22 de junho de 2018
Recuo do presidente em sua política vil de tirar crianças migrantes dos pais é uma pequena vitória para a decência humana. Mas também um mau presságio para os rumos do partido, opina o jornalista Michael Knigge.
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Em grande parte dos casos, uma má política é apenas isso, uma má política. Às vezes, porém, é necessário aplicar categorizações amplas de bem e mal. A decisão do presidente Donald Trump de separar deliberadamente crianças migrantes de seus pais é um desses casos: é mau, cruel e anacrônico. É também indigno de qualquer nação que proclame aderir aos direitos humanos até mesmo mais rudimentares – e ainda por cima os Estados Unidos, uma nação de imigrantes que tradicionalmente se pinta como um farol dos direitos humanos.
Portanto é uma boa notícia que Trump tenha retrocedido na política de separação de famílias, que ele próprio orgulhosamente instituíra, como parte da sua "tolerância zero" contra os imigrantes. Como de costume, seu recuo foi camuflado em um mar de mentiras e distorções. Foi o mesmo mar de mentiras e distorções que ele usou a instituir essa política.
Em sua forma típica de agir, atribuiu a culpa aos democratas, ao Congresso e aos governos anteriores. Tudo isso antes de assinar, numa cerimônia descarada ao lado do vice-presidente, Mike Pence, e da secretária de Segurança Interna, Kirstjen Nielsen, o decreto que acabou com uma prática desumana que ele próprio havia instituído.
Mesmo que o decreto aparentemente ponha fim à prática de tirar crianças migrantes de seus pais, não foram tomadas medidas para reunir as mais de 2 mil que já foram afastadas. O decreto tampouco altera uma decisão da Suprema Corte em vigor, estipulando que menores migrantes não podem ser detidas por mais de 20 dias. E como o governo Trump continua com sua "política de tolerância zero" de processar todos os imigrantes que cruzem ilegalmente a fronteira, isso significa que as crianças ainda podem ser separadas dos pais, após terem sido detidas com eles por 20 dias.
Trump é um piromaníaco político que repetidamente provoca incêndios para depois se vangloriar de tê-los apagado. Isso, em si, não é uma novidade, é simplesmente parte do seu manual de estratégia. A tática foi colocada em prática recentemente no caso da Coreia do Norte. Trump, depois de tomar posse, aumentou a pressão até deixar os dois países à beira da guerra, para então encenar uma cúpula histórica, permitindo aliviar a crise que ele mesmo havia criado e colher elogios públicos por ato de magnanimidade.
O mais significativo neste último episódio é que, na hora H, nenhuma figura do governo e apenas alguns poucos republicanos que controlam o Congresso estão dispostos a enfrentar Trump. Essa tem sido a regra durante todo o seu mandato, com exceção da política dos EUA para a Rússia. Mas a política de Trump de separar as crianças de seus pais foi um teste decisivo para os conservadores, que tradicionalmente se veem como defensores da unidade da família contra supostos ataques dos liberais aos valores familiares.
O fato de ninguém neste governo ter se posicionado contra a separação de filhos de seus pais mostra que Trump conseguiu atingir seu objetivo de se cercar apenas de bajuladores inúteis. Lembram-se da promessa de que os "adultos na sala" iriam vigiar o presidente? Se eles estiveram lá em algum momento, a estas alturas já abandonaram o prédio.
O mesmo tipo de apatia moral marcou a resposta dos republicanos no Congresso e dos apoiadores de Trump por todo o país. Não houve grandes protestos do partido de Abraham Lincoln e Ronald Reagan, quando um governo republicano instituiu uma política que exige que crianças sejam afastadas de seus pais.
Em vez disso, muitos defenderam a política, enquanto outros minimizaram ou tentaram racionalizar a questão por conta própria. O fato de o presidente eventualmente ter voltado atrás em sua política desprezível provavelmente se deveu aos repetidos pedidos da primeira-dama, Melania, e da filha dele, Ivanka, e não devido a pressão dos republicanos. Somado a isso, o episódio é apenas o mais recente sinal de que o Partido Republicano é agora inteiramente o partido trumpista.
Isso é um mau presságio para o futuro do país. Se afastar filhos de seus pais não é suficiente para os republicanos romperem com um presidente impiedoso que claramente não tem qualquer senso moral, o que é então? É uma perspectiva preocupante a ser considerada.
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Filmes sobre a fronteira entre EUA e México
Em seu mandato, o ex-presidente americano Donald Trump prometeu construir um muro entre EUA e México. Mas, muito antes disso, esta fronteira já havia sido foco de filmes espetaculares. Veja a lista.
Foto: picture-alliance/United Archives/TBM
John Wayne em guerra
Em meados do século 19, EUA e México entraram em guerra sobre o estado do Texas, que pertencia aos mexicanos, mas foi anexado pelos americanos. A longa disputa foi muitas vezes retratada por Hollywood nos faroestes que detalhavam os violentos conflitos entre colonos americanos e o Exército mexicano. Entre os mais espetaculares está "Álamo" (1960), estrelado por John Wayne e Richard Widmark.
Foto: picture-alliance/United Archives/TBM
Dietrich e a fronteira
Em 1958, Marlene Dietrich fez uma breve aparição no brilhante suspense "A marca da maldade". O diretor Orson Welles, que teve o papel principal no filme, fez da região fronteiriça entre México e EUA o cenário para falar sobre corrupção, tráfico de drogas e outros crimes.
Foto: picture-alliance/United Archives/IFTN
"Rio Bravo"
Quando John Wayne apareceu em "Álamo", a grande era do faroeste americano estava quase no fim. Mas, quando o gênero cresceu na década de 1950, muitos faroestes se passaram na fronteira entre Texas, Novo México e Arizona de um lado, e o México, do outro. Um marco simbólico era o rio Grande que, localizado nesta fronteira, rendeu o título do legendário filme do diretor John Ford, de 1950.
Foto: picture-alliance/Mary Evans Picture Library
A fronteira em faroestes posteriores
No entanto, a fronteira entre os dois países conseguiu manter sua importância em numerosos faroestes lançados posteriormente. A região desempenhou um papel de destaque em "Meu ódio será tua herança" (1969), do diretor Sam Peckinpah, um épico do faroeste selvagem com muito sangue e que enfoca a ilegalidade em uma terra esquecida.
Foto: Imago/Entertainment Pictures
Variações modernas
O diretor americano Robert Anthony Rodriguez tem uma paixão pela região de fronteira, o que talvez se deva às suas raízes mexicanas. Muitos de seus filmes reproduzem o choque de culturas nesta região fronteiriça. Seu filme "Um drink no inferno", de 1996, viu Quentin Tarantino e George Clooney encenando irmãos que roubam bancos e que tentam fugir para o México.
Foto: picture-alliance/United Archives
Não há lugar para envelhecer
Ganhador de vários Oscars em 2008, entre eles o de melhor filme e direção, "Onde os fracos não têm vez" foi dirigido pelos irmãos Joel e Ethan Coen. A produção aborda as drogas, máfia, assassinatos e fraudes. O filme se passa na fronteira entre EUA e México – um lugar perigoso, onde a morte é comum e poucos envelhecem.
Foto: picture-alliance/dpa/Paramount Pictures
Ao sul de Albuquerque
Albuquerque, no Novo México, é o cenário da extremamente popular série de televisão "Breaking Bad", que foi produzida entre 2008 e 2013. Ela enfoca histórias na região envolvendo drogas. Ao sul de Albuquerque, fica a lendária fronteira entre Estados Unidos e México.
Foto: Frank Ockenfels 3/Sony Pitures
O lado obscuro do comércio
No filme "Desaparecidos" (2007), o diretor alemão Marco Kreuzpaintner escolheu contar a história de crianças mexicanas que atravessam a fronteira para os Estados Unidos como parte do tráfico de escravos sexuais. A estrela de Hollywood Kevin Kline desempenhou o papel principal.
Foto: picture-alliance/kpa
Guerra de drogas na fronteira
"Sicario: terra de ninguém" examina o impacto das guerras do narcotráfico na área de fronteira entre Arizona e México. O cineasta canadense Denis Villeneuve fez o agitado suspense em 2015, tendo Benicio del Toro no papel principal. A obra foi filmada no sul do Arizona.
Foto: picture-alliance/AP Photo/Lionsgate/Richard Foreman Jr.
Filmes sobre drogas
A questão do narcotráfico parece atrair diretores de forma mágica. Em 2013, o cineasta britânico Ridley Scott filmou um suspense também nesta região fronteiriça. "O conselheiro do crime", estrelado por Brad Pitt e Michael Fassbender, foi filmado em El Paso, no Texas, e na Espanha.
Foto: picture-alliance/dpa
Crime e política
Há 17 anos, o diretor Steven Soderbergh lançou o renascimento dos filmes sobre a guerra das drogas. Em "Traffic", ele retrata a complexa relação entre polícia, traficantes e políticos – cujos laços uns com os outros estão indissociavelmente interligados para além das fronteiras geográficas.
Foto: picture-alliance/United Archives
Histórias de detetive
Além de faroestes e suspenses sobre drogas, inúmeras histórias de detetives e assassinatos misteriosos decorrem na fronteira entre EUA e México. Um clássico do gênero é o filme "O perigoso adeus" (1973), de Robert Altman, baseado em um romance de Raymond Chandler. O filme foi gravado na Califórnia, mas também em Tepoztlán, no México.
Foto: picture-alliance/United Archives/Impress
A fronteira em tempos de globalização
Em 2006, o diretor mexicano Alejandro González Iñárritu filmou o drama narrativo múltiplo "Babel". A obra traça os destinos entrelaçados de várias pessoas de diferentes regiões do mundo, e é uma parábola cinematográfica sobre a questão do significado da fronteira para as pessoas em tempos de globalização.
Foto: picture alliance/kpa
Comédia de fronteira
Não há muito o que rir quando se trata de uma fronteira. A maior parte dos filmes que lida com os laços entre EUA e México tendem à seriedade. Mas, em 2004, James L. Brooks fez a comédia "Espanglês" sobre um encontro com muito clichê entre um americano rico (Adam Sandler) e uma faxineira mexicana (Paz Vega).
Foto: picture-alliance/United Archives
Drama sobre imigração
Nos últimos anos, mais e mais filmes foram produzidos sobre imigração e pobreza na região. No ano passado, a coprodução Alemanha-França-México "Soy Nero" estreou na Berlinale. O diretor Rafi Pitts, com raízes iranianas, conta a história de um jovem mexicano que atravessa a fronteira para os EUA em busca de uma vida melhor.
Foto: picture-alliance/dpa/Neue Visionen
Um clássico moderno
Talvez o filme mais impressionante sobre a imigração do Sul para o Norte tenha sido feito por Cary Fukunaga, em 2009. "Sem identidade" retrata o destino de vários jovens do México que estão tentando chegar aos EUA. Enquanto alguns estão tentando escapar de bandos criminosos de suas cidades, outros procuram o paraíso na Terra.