Fato de comissário do governo para o combate ao antissemitismo aconselhar judeus a deixarem de usar quipá em público é um escândalo, opina Michel Friedman.
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Que admissão de culpa! Que declaração de falência! E que conclusão terrível! O comissário de combate ao antissemitismo da República Federal da Alemanha disse: "Não posso recomendar aos judeus que usem o quipá a todo momento e em todo lugar na Alemanha".
Pensada até o fim, a frase soa assim: se a tendência de violência contra judeus na Alemanha – incluindo tanto os danos morais quanto os ataques físicos – já é tão grande que os judeus não podem mais usar um quipá sem correr riscos, então os judeus precisam tirar os quipás.
Mas a resposta certa a essa situação teria sido a seguinte: combatemos o ódio e os seus autores por tanto tempo que os judeus nunca precisarão tirar seus quipás para se locomover em espaços públicos.
Segundo o Artigo 4º da Constituição, esse país garante a liberdade religiosa, ou seja, dá a todas as religiões a oportunidade de demonstrar livremente a sua confissão em público. Ninguém na Alemanha sequer pensaria em aconselhar aos cristãos a não usarem mais crucifixos. E, por isso, é ainda mais surpreendente – mas também revelador – quando se aconselha aos judeus que não usem mais a cobertura na cabeça.
Se continuarmos o raciocínio dessa sugestão, em breve deverá surgir o conselho de esconder a Estrela de Davi levada num colar no pescoço – ou de eliminar todos os símbolos que identificam um judeu externamente.
No futuro, devo realmente aconselhar meus filhos a exercerem sua identidade judaica apenas internamente e de se esconderem em público? Se seguirmos consequentemente o conselho de Felix Klein, a vida visível de um judeu na Alemanha é insegura. E o invisível, aparentemente, é seguro. Só é possível ser judeu a portas fechadas na Alemanha? Nesse caso, porém, a vida dos judeus no país não tem futuro.
Se o diagnóstico de Felix Klein estiver certo, isso mostra que não aconteceu o suficiente nas últimas décadas para melhorar o clima sócio-político, fazendo com que o antissemitismo – assim como o ódio contra as minorias na Alemanha – se transformasse numa quantidade ignorável de incidentes.
Pela primeira vez desde que os alemães se libertaram de Hitler e a fundação da República Federal da Alemanha, temos um partido que foi eleito com mais de 10% para o Parlamento nacional e para todos as assembleias estaduais com suas narrativas antissemitas, distorção e banalização do nazismo e do racismo.
Em outras palavras: parcelas da liderança desse partido tentam minimizar Hitler e o Terceiro Reich, não temem incêndios morais e desejam uma outra democracia na Alemanha. Definitivamente, os lobos em pele de cordeiro mostraram sua verdadeira cara no Bundestag. Quem ainda vota nesse partido hoje em dia não pode dizer que é eleitor de protesto – pelo contrário, se torna cúmplice.
Se o diagnóstico de Felix Klein estiver certo, as instituições políticas também fracassaram há décadas. "Wehret den Anfängen!" (algo como "resista desde o começo!") é uma frase-padrão carregada há dezenas de anos por políticos alemães em relação ao antissemitismo.
Mas faz tempo que estamos mergulhados nele. Por tempo demais, gente demais ignorou esses "começos". Por tempo demais, pessoas demais não reagiram a esses "princípios", deixando de comandar o debate sócio-político. Cada indivíduo precisa olhar no espelho – em associações, na família, no trabalho. Quantas vezes piadas com judeus contadas en passant pelo chefe, pelo pai, pelo líder da comunidade, foram ignoradas, sem reação? Mas quem não reage aos primórdios vira cúmplice. E também altera seu próprio sistema de coordenadas.
"A dignidade humana é inviolável", diz o Artigo 1º da Constituição alemã. Mas parece que os judeus na Alemanha não podem mais confiar 100% nessa afirmação. Quem, agora, ainda profere as palavras conciliatórias de costume, como "A partir de agora, polícia e Ministério Público precisam lidar com isso de forma mais sensível", ou "Por um dia, vamos todos usar o quipá num gesto de solidariedade" (e nos outros dias?), ou quem defende um grandioso discurso do presidente alemão, no qual ele exorta ao combate ao antissemitismo – ainda não entendeu que tudo isso já não é mais suficiente há muito tempo.
A situação é séria. Se realmente estiver certo que os judeus na Alemanha não podem viver seu cotidiano sem ameaças a partir do momento em que se tornam visíveis, então essa república está mergulhada numa crise democrática.
Michel Friedman é advogado, autor, comentarista político e apresentador de televisão. Ele é também professor de mídia na Universidade de Ciências Aplicadas de Frankfurt. Na DW, Friedman modera os talk shows "Conflict Zone" e "On a Word... com Michel Friedman".
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Desde o fim da Segunda Guerra Mundial, em 1945, diversos memoriais foram inaugurados na Alemanha para homenagear as vítimas do conflito e os perseguidos e mortos pelo regime nazista.
Foto: picture-alliance/dpa
Campo de concentração de Dachau
Um dos primeiros campos de concentração criados durante o regime nazista foi o de Dachau. Poucas semanas depois de Hitler chegar ao poder, os primeiros prisioneiros já foram levados para o local, que serviu como modelo para os futuros campos do Reich. Apesar de não ter sido concebido como campo de extermínio, em nenhum outro lugar foram assassinados tantos dissidentes políticos.
Foto: picture-alliance/dpa
Reichsparteitagsgelände
A antiga área de desfiles do Partido Nacional-Socialista em Nurembergue, denominada "Reichsparteitagsgelände", foi de 1933 até o início da Segunda Guerra palco de passeatas e outros eventos de propaganda do regime nazista, reunindo até 200 mil participantes. Lá está atualmente instalado um centro de documentação.
Foto: picture-alliance/Daniel Karmann
Casa da Conferência de Wannsee
A Vila Marlier, localizada às margens do lago Wannsee, em Berlim, foi um dos centros de planejamento do Holocausto. Lá reuniram-se, em 20 de janeiro de 1942, 15 membros do governo do "Terceiro Reich" e da organização paramilitar SS (Schutzstaffel) para discutir detalhes do genocídio dos judeus. Em 1992, o Memorial da Conferência de Wannsee foi inaugurado na vila.
Foto: picture-alliance/dpa
Campo de Bergen-Belsen
De início, a instalação na Baixa Saxônia servia como campo de prisioneiros de guerra. Nos últimos anos do conflito, eram geralmente enviados para Bergen-Belsen os doentes de outros campos. A maioria ou foi assassinada ou morreu em decorrência das enfermidades. Uma das 50 mil vitimas foi a jovem judia Anne Frank, que ficou mundialmente conhecida com a publicação póstuma do seu diário.
Foto: picture alliance/Klaus Nowottnick
Memorial da Resistência Alemã
No complexo de edifícios Bendlerblock, em Berlim, planejou-se um atentado fracassado contra Adolf Hitler. O grupo de resistência, formado por oficiais sob comando do coronel Claus von Stauffenberg, falhou na tentativa de assassinar o ditador em 20 de julho de 1944. Parte dos conspiradores foi fuzilada no mesmo dia, no próprio Bendlerblock. Hoje, o local abriga o Memorial da Resistência Alemã.
Foto: picture-alliance/dpa
Ruínas da Igreja de São Nicolau
Como parte da Operação Gomorra, aviões americanos e britânicos realizaram uma série de bombardeios contra a estrategicamente importante Hamburgo. A Igreja de São Nicolau, no centro da cidade portuária, servia aos pilotos como ponto de orientação e foi fortemente danificada nos ataques. Depois de 1945 não foi reconstruída, e suas ruínas foram dedicadas às vítimas da guerra aérea na Europa.
Foto: picture-alliance/dpa
Sanatório Hadamar
A partir de 1941, portadores de doenças psiquiátricas e deficiências eram levados para o sanatório de Hadamar, em Hessen. Considerados "indignos de viver" pelos nazistas, quase 15 mil – de um total de 70 mil em todo o país – foram mortos ali com injeções de veneno ou com gás. O atual memorial engloba a antiga instituição da morte e o cemitério contíguo, onde estão enterradas algumas das vítimas.
Foto: picture-alliance/dpa
Monumento de Seelow
A Batalha de Seelow deu início à ofensiva do Exército Vermelho contra Berlim, em abril de 1945. No maior combate em solo alemão, cerca de 100 mil soldados das Wehrmacht enfrentaram o Exército soviético, dez vezes maior. Após a derrota alemã, em 19 de abril o caminho para Berlim estava aberto. Já em 27 de novembro de 1945 era inaugurado o monumento nas colinas de Seelow, em Brandemburgo.
Foto: picture-alliance/dpa
Memorial do Holocausto
O Memorial ao Holocausto em Berlim foi inaugurado em 2005, em memória aos 6 milhões de judeus assassinados pelos nazistas na Europa. Não muito distante do Bundestag (parlamento), 2.711 estelas de cimento de tamanhos diferentes formam um labirinto por onde os visitantes podem caminhar livremente. Uma exposição subterrânea complementa o complexo do Memorial.
Foto: picture-alliance/dpa
Monumento aos Homossexuais Perseguidos
De formas inspiradas no Memorial do Holocausto e próximo a ele, o monumento aos homossexuais perseguidos pelo nazismo foi inaugurado em 27 de maio de 2008, no parque berlinense Tiergarten. Uma abertura envidraçada permite ao visitante vislumbrar o interior do monumento, onde um vídeo infinito mostra casais de homens e de mulheres que se beijam.
Foto: picture alliance/Markus C. Hurek
Monumento aos Sintos e Roma Assassinados
O mais recente memorial central foi inaugurado em Berlim em 2012. Em frente ao Reichstag, um jardim lembra o assassinato de 500 mil ciganos durante o regime nazista. No centro de uma fonte de pedra negra, está uma estela triangular: ela evoca a forma do distintivo que os prisioneiros ciganos dos campos de concentração traziam em seus uniformes.
Foto: picture-alliance/dpa
'Pedras de Tropeçar'
Na década de 1990, o artista alemão Gunter Demnig começou um projeto de revisão do Holocausto: diante das antigas residências das vítimas, ele aplica placas de metal onde estão gravados seus nomes e as circunstâncias das mortes. Há mais de 45 mil dessas "Stolpersteine" (pedras de tropeçar) na Alemanha e em 17 outros países europeus, formando o maior memorial descentralizado às vítimas do nazismo.