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Scholz e a nova realidade da política alemã

Berlin DW  Michaela Küfner
Michaela Küfner
17 de março de 2022

Passados apenas 100 dias do governo do novo chanceler federal, a Alemanha já não é mais a mesma de antes. Mais do que a Putin, isso se deve à determinação do próprio Scholz, opina a jornalista Michaela Küfner.

"Desde o início da guerra na Ucrânia, Olaf Scholz mostra uma determinação surpreendente"Foto: Odd Andersen/Pool/AP/picture alliance

Após a invasão da Ucrânia pela Rússia, o chanceler federal alemão, Olaf Scholz, precisou de exatamente três dias para derrubar as pedras angulares da política externa e de segurança de Angela Merkel. No 79º dia da era pós-Merkel, Vladimir Putin quebrou a ordem de paz da Europa. No 81º dia, contrariando todas as declarações anteriores, Scholz assegurou, em um tuíte, armas alemãs à Ucrânia. Menos de 24 horas depois, Scholz até anunciou uma "virada dos tempos" e delineou uma nova e remilitarizada política alemã. Poucos dias antes, isso lhe teria custado sua cabeça em seu próprio partido, o social-democrata SPD.

Ele decidiu destinar 100 bilhões de euros adicionais para as Forças Armadasalemãs – a Bundeswehr −, e a partir de agora pelo menos (!) 2% do Produto Interno Bruto para a defesa − algo que vai além da meta da Otan. Não apenas jornalistas, mas sobretudo os deputados de seu próprios partido esfregaram os olhos e em parte levaram as mãos à cabeça diante das palavras que vinham da boca de seu chefe de governo eleito recentemente. Para Scholz, desde aquele dia não há limites nem linhas vermelhas.

Início de governo tímido e contido

No início de fevereiro, os usuários do Twitter ainda estavam procurando o chefe de governo alemão com a hashtag #WoIstScholz (onde está Scholz). Por volta do 50º dia do novo governo, o partido conservador União Democrata Cristã (CDU) já estava à frente do Partido Social-Democrata (SPD) nas pesquisas. Por muito tempo, Scholz disse muito pouco publicamente sobre a rápida disseminação da variante ômicron, sobre a vacinação compulsória, sobre qualquer coisa. Tão tímido, tão contido, ele não parecia ser um novo chanceler federal com vontade de moldar as coisas.

Inicialmente, Scholz foi cauteloso em relação à Rússia. Em vista da mobilização das tropas do Kremlin, ele se manteve fiel à diplomacia. Até mesmo quando os serviços de inteligência dos EUA advertiram sobre um ataque iminente. Mesmo sob os holofotes da Casa Branca, ele ainda deixou a porta diplomática entreaberta para Putin. E preferiu morder a língua em vez de mencionar o gasoduto Nord Stream 2, entre a Rússia e a Alemanha. Isso abriu margem para dúvidas quanto à confiabilidade da Alemanha como parceira em alianças. A questão era se o presidente francês, Emmanuel Macron, se tornaria o novo líder da Europa, em vez do sucessor de Angela Merkel.

Mas Scholz agiu de forma decisiva quando se tornou claro que todos os esforços diplomáticos eram em vão e que Putin provavelmente planejava o ataque há meses. Junto com sua ministra do Exterior, Annalena Baerbock, do Partido Verde, o chanceler federal mostra que a Alemanha quer defender uma política guiada por valores. Ao fazer isso, ele deixa para ela a exigência máxima de que Putin seja levado à Corte Internacional de Justiça em Haia. Embora ele mesmo fale de uma "guerra de agressão a sangue frio", ele continua à procura de soluções também com Putin.

"Dividendo da paz" está esgotado

Olaf Scholz chegou a uma nova realidade política como resultado da pressão dos fatos, especialmente a pressão do próprio Putin. Como chanceler federal de um partido que tem a reputação de "entender a Rússia", isso é um feito por si só. Entretanto, os parceiros da UE com fronteiras com a Rússia − como a Polônia e os Estados bálticos − ainda acham essa nova realidade alemã muito sutil.

Uma proibição total de importação de energia da Rússia continua sendo uma linha vermelha para Scholz. Isso seria muito doloroso para a maioria dos 83 milhões de alemães que ainda estão tentando entender o que Putin está fazendo. A maioria apoia a atitude resoluta do chefe de governo. Mas o aumento dos preços da energia é apenas o prenúncio de que o "dividendo da paz" na Europa está esgotado.

Ainda mais claro fica agora que a guerra na Ucrânia exigirá um preço pela liberdade e democracia que cada cidadão, cada eleitor, inclusive na Alemanha, terá que pagar pessoalmente. Mesmo que, no final, haja um acordo aceitável com Putin.

Realidade que não perdoa erros

Assim, o 82º dia após sua eleição no Bundestag foi o primeiro dia real de trabalho do novo chanceler federal. Apesar da nova alta no número de infecções pelo coronavírus, a pandemia parece ter sido apenas um estágio no período que antecedeu o histórico desafio imposto pela Rússia.

Scholz surpreendentemente manteve muitos dos funcionários de Merkel na chancelaria federal. Vários afirmam que Scholz é muito mais tolerante a erros do que Merkel. Esta nova realidade não perdoa erros. Scholz não tem nenhuma intenção de cometer algum.

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Michaela Küfner é jornalista da DW. O texto reflete a opinião pessoal da autora, não necessariamente da DW.

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