Ministro Seehofer volta à carga contra a chanceler federal e deixa claro que conservadores alemães não falam mais a mesma língua, observa o jornalista Jens Thurau.
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O ministro alemão do Interior, Horst Seehofer, andava quieto. Depois de semanas tumultuadas, nas quais a parceria estreita e de décadas entre os dois partidos conservadores alemães, a CDU e a CSU, fora questionada abertamente, os ânimos voltaram a esfriar. Mas, se a chanceler federal Angela Merkel pensou que o pior já passara, se enganou.
Seehofer chamou a questão de como lidar com a imigração de "mãe de todos os problemas". Primeiro, numa reunião interna, depois em público. E enumerou tudo o que aconteceu desde que, há três anos, o "Nós vamos conseguir" de Merkel deu um nome a uma política de refugiados relativamente liberal: a sociedade se dividiu, o partido populista AfD se estabeleceu como uma força à direita dos partidos conservadores e a reputação dos partidos tradicionais junto aos alemães se erodiu cada vez mais.
Então tudo isso é consequência da política de refugiados? É uma questão complexa e difícil de responder. Talvez a resposta mais próxima da verdade seja dizer que o acolhimento de pessoas ameaçadas de todo o mundo foi o catalisador de muitos conflitos internos que já existiam há muito tempo: leste contra oeste, democracia liberal contra "democracia guiada", papel e significado do Estado de Direito, questões sociais.
Mas fica cada vez mais nítido, e pelo jeito Seehofer quis destacar isso mais uma vez, que apesar de todo o horror diante das manifestações e da perseguição a requerentes de refúgio em Chemnitz, a chanceler não tem mais maioria favorável à sua política de refugiados. Nem na Alemanha, nem na Europa.
Por falar em Chemnitz: com alguns dias de atraso, fica claro que, na análise dos acontecimentos, não se encontra mais um linguajar comum entre os conservadores. A chanceler fala em perseguição e é contestada pelo governador da Saxônia, Michael Kretschmer, que como Merkel também é membro da CDU. E também Seehofer observa que ele entende a indignação das pessoas se requerentes de asilo assassinam um alemão, como teria acontecido em Chemnitz.
Internamente, Merkel disse constantemente que o motivo pelo qual ela se candidatou a chanceler federal nas eleições de 2017 foi a preocupação com o dilaceramento da sociedade alemã, com uma possível devastação da União Europeia.
Um ano depois fica cada vez mais claro: até agora, ela não avançou nem um passo. A Europa elege populistas (Itália), cai cada vez mais no nacionalismo (Reino Unido e outros), esvazia o Estado de Direito (Polônia). E, na Alemanha, os descontentes, os radicais, aqueles que desprezam a democracia, os adversários internos só conseguem chegar a consenso em um ponto: a culpa é de Merkel.
O que mantém Merkel no poder é o fato de que a erosão atinge outros partidos de maneira até mais forte do que a CDU – a começar pelo SPD e pela CSU na Baviera. Mas por quanto tempo isso ainda vai continuar? Já se cria o sentimento de que Merkel está se isolando na chancelaria federal – um sinal perigoso.
Há dez dias que toda a Alemanha olha para Chemnitz, vê cidadãos furiosos, extremistas de direita que procuram a violência, simpatias abertas por slogans nazistas. E uma poderosa manifestação contrária por meio de um show de rock organizado por pessoas que, há tempos, já não se preocupam somente com a política de refugiados, mas com o clima que predomina no país, com a sociedade, com o futuro da democracia.
E Merkel? Ela também irá a Chemnitz – mas só em outubro. A data exata ainda está em aberto.
O clima na Chancelaria Federal está cada vez mais solitário.
Fotos impressionantes do enorme fluxo de migrantes para a Europa em 2015 e 2016 circularam pelo mundo. No Dia Mundial do Refugiado, vale lembrar a perseverança dos que foram forçadas a deixar seus países.
Foto: Getty Images/AFP/A. Messinis
A meta: sobreviver
Uma jornada combinada com sofrimento e perigo para corpo e alma: para fugir da guerra e da miséria, centenas de milhares de pessoas, principalmente da Síria, viajaram pela Turquia para a Grécia em 2015 e 2016. Ainda há cerca de 10 mil pessoas nas ilhas de Lesbos, Chios e Samos. De janeiro a maio deste ano, chegaram mais de 6 mil novos refugiados.
Foto: Getty Images/AFP/A. Messinis
A pé até a Europa
Em 2015 e 2016, milhões de pessoas tentaram, a pé, chegar à Europa Ocidental através da Turquia ou da Grécia até a Macedônia, Sérvia e Hungria. Este fluxo não parou mesmo depois de a chamada rota dos Bálcãs ter sido fechada e muitos países terem bloqueado suas fronteiras. Hoje, a maioria dos refugiados vai para a Europa usando a perigosa rota pelo Mediterrâneo através da Líbia.
Foto: Getty Images/J. Mitchell
Consternação mundial
Esta foto chocou o mundo em setembro de 2015: numa praia da Turquia foi encontrado o corpo do menino sírio Aylan Kurdi, de 3 anos. A imagem se espalhou rapidamente pelas redes sociais e se tornou um símbolo da crise dos refugiados. Depois dela, a Europa não podia mais se omitir.
Foto: picture-alliance/AP Photo/DHA
Caos e desespero
Sabendo que a rota de fuga para a Europa seria fechada, milhares de refugiados tentaram desesperadamente entrar em trens e ônibus na Croácia. Alguns dias depois, em outubro de 2015, a Hungria fechou a fronteira e criou campos com contêineres, onde os refugiados seriam mantidos durante a análise de seu pedido de asilo político.
Foto: Getty Images/J. J. Mitchell
Hostilidades
A indignação foi grande quando uma repórter cinematográfica húngara deu uma rasteira num refugiado sírio que corria com um menino no colo. Ele tentava passar por uma barreira policial na fronteira húngara em setembro de 2015. No auge da crise de refugiados aumentavam as hostilidades contra imigrantes, com ataques xenófobos a abrigos de refugiados também na Alemanha.
Foto: Reuters/M. Djurica
Fronteiras fechadas
O fechamento oficial da rota dos Bálcãs, em março de 2016, gerou tumultos nos postos de fronteira, onde milhares de migrantes não puderam mais avançar e houve relatos de violência policial. Muitos, como estes refugiados, tentaram contornar os postos de fronteira entre a Grécia e a Macedônia.
Uma criança ensanguentada coberta de poeira: a fotografia de Omran, de 5 anos, chocou o público em 2016 e se tornou um símbolo dos horrores da guerra civil da Síria e do sofrimento de seu povo. Um ano mais tarde, novas imagens mostrando o menino bem mais feliz circularam na internet. Apoiadores do presidente sírio afirmam que a primeira imagem foi usada para fins de propaganda.
Foto: picture-alliance/dpa/Aleppo Media Center
Em busca de segurança
Um sírio carrega a filha na chuva em Idomeni, entre a Grécia e a Macedônia. Ele procura abrigo na Europa. Segundo o Regulamento de Dublin, o asilo político precisa ser solicitado no primeiro país da União Europeia a que o refugiado chegou. Por isso, muitos que prosseguem viagem são mandados de volta. Por sua localização fronteiriça, Itália e Grécia são os países onde mais chegam refugiados.
Foto: Reuters/Y. Behrakis
Esperança
A Alemanha continua sendo o principal destino dos migrantes, embora a política de refugiados e de asilo do país tenha se tornado mais restritiva após o grande afluxo no final de 2015. Nenhum outro país europeu acolheu tantos refugiados como a Alemanha, que recebeu 1,2 milhão de pessoas desde 2015. A chanceler federal Angela Merkel foi um ícone para muitos dos recém-chegados.
Foto: picture-alliance/dpa/S. Hoppe
Miséria nos campos de refugiados
No norte da França, um enorme campo de refugiados, a chamada "Selva de Calais", foi fechado. Durante a evacuação, em outubro de 2016, houve um incêndio no acampamento. Cerca de 6.500 moradores foram removidos para outros abrigos na França. Meio ano depois, organizações de ajuda relataram sobre muitos refugiados menores de idade que vivem como sem-teto em volta da cidade de Calais.
Foto: picture-alliance/dpa/E. Laurent
Afogamentos no Mediterrâneo
ONGs e guardas costeiras estão constantemente à procura de barcos de migrantes em perigo. Eles preferem atravessar o mar em embarcações precárias superlotadas a viver sem perspectivas na pobreza ou em meio à guerra civil. Só em 2017, a travessia já custou 1.800 vidas. Em 2016 foram registrados 5 mil mortos.
Foto: picture alliance/AP Photo/E. Morenatti
Milhares esperam na Líbia
Centenas de milhares de refugiados da África Subsaariana e do Oriente Médio esperam em campos líbios para atravessar o Mar Mediterrâneo. Muitos estão nas mãos de contrabandistas humanos e traficantes de pessoas. As condições nesses locais são catastróficas, dizem ONGs. Testemunhas relatam casos de escravidão e prostituição forçada. Ainda assim, continua vivo o sonho de chegar à Europa.
Foto: Narciso Contreras, courtesy by Fondation Carmignac