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Opinião: Somália entre o terrorismo e o êxodo dos jovens

Ludger Schadomsky
17 de outubro de 2017

Devastador atentado em Mogadíscio expõe mais uma vez falência do Estado somali e fracasso de todas as tentativas de estabilização e combate ao terrorismo, opina o chefe da redação amárica da DW, Ludger Schadomsky.

Prédio destruído pelo atentado com bombas na cidade de Mogadíscio, capital da Somália
Prédio destruído pelo atentado com bombas na cidade de Mogadíscio, capital da SomáliaFoto: Getty Images/AFP/M. Abdiwahab

O momento foi, de novo, estrategicamente escolhido: no fim da semana, o chefe da Africom (Comando dos Estados Unidos para a África) havia visitado a Somália e, ao lado do presidente somali, reforçado seu comprometimento com a luta contra a milícia terrorista Al Shabaab.

Em paralelo, numa ação aparentemente coordenada, o ministro da Defesa e o chefe das Forças Armadas do país renunciaram. Os motivos oficiais não foram divulgados, mas aparentemente os dois se ressentiam de não serem consultados, pela liderança do país, sobre decisões de segurança relevantes.

Tratava-se, portanto, de um momento adequado para evidenciar a impotência do governo somali e de seus aliados ocidentais, em franco contraste com todas as declarações presunçosas vindas de Washington e Mogadíscio, de que finalmente dariam cabo dos terroristas.

É verdade que, até agora, ninguém assumiu a autoria do atentado, mas pode-se partir do princípio de que a Al Shabaab está metida nisso. Afinal, ela já havia revidado, com vários atentados, o anúncio do governo Donald Trump de ampliar a guerra de drones contra o terrorismo. O último ataque ocorrera no vizinho Quênia, na metade da semana passada.

Ao optarem por Hodan, o movimentado bairro comercial da metrópole de 2 milhões de habitantes, os terroristas escolheram, de forma cínica, um local que garantiria um grande número de vítimas e, com isso, a maior atenção possível.

Os protestos dos somalis, que foram às ruas no domingo, voltavam-se sobretudo contra o terrorismo e seus cruéis executores. Mas, assim que os mortos estiverem contados e enterrados, eles também irão se voltar contra o governo recém-eleito. Afinal, este conseguiu manter a tradição de, em apenas poucos meses, perder a confiança dos eleitores.

Até agora, o presidente Mohamed Abdullahi Mohamed, que começou seu mandato em fevereiro em meio a grandes expectativas, não conseguiu superar o notório fosso da política clientelista da Somália, o que dizer então da luta contra a corrupção desenfreada. A rota para uma Somália estável, concebida por governo, Nações Unidas e doadores, está se perdendo pelo caminho.

"Temos de nos manter unidos contra os terroristas", disse o prefeito de Mogadíscio no local do ataque. Só que falar é fácil num país onde vale apenas a lealdade ao próprio clã e onde a casta política adaptou, com grande afinco, o modelo político colonialista "dividir para governar".

Como em outros Estados da região, também na Somália, tradicionalmente moderada, o terrorismo, que mata sobretudo muçulmanos, não é uma aberração religiosa, ainda que a exportação do wahhabismo saudita também produza efeitos negativos perceptíveis no Chifre da África.

O fenômeno Al Shabaab é, antes de mais nada, um modelo de negócios nesse Estado em situação de falência desde 1991, onde a pirataria e a exportação ilegal de carvão vegetal garantem lucros bilionários. O status quo de Estado fracassado interessa tanto aos governantes como aos criminosos, o que explica por que também o novo governo está condenado ao fracasso.

Relatos de pessoas que deixaram esse sistema mostram que, também na Somália, aqueles que se unem aos radicais são muito mais pessoas de espírito desequilibrado ou cheias de dúvidas do que fanáticos religiosos. A incompetência da casta política, aliada a uma propensão ao enriquecimento que é despudorada até mesmo para padrões africanos, faz com que cada vez mais jovens duvidem de um futuro digno no próprio país.

Eles pegam o que têm e fogem para a Europa – ou se deixam seduzir por aliciadores. Eles já perderam há muito a esperança que a comunidade internacional, para além da (fracassada) luta contra o terrorismo, ainda deposita na estabilização desse país estrategicamente tão importante. E com razão, como mostra a realpolitik de britânicos, americanos e, recentemente, xeques do Golfo.

O fato de o atentado devastador também ter atingido a embaixada do Catar e ferido um diplomata de alto escalão é tão lamentável quanto irônico. A crise política entre o emirado e a Arábia Saudita, que se expande até o Chifre da África, divide há tempos o governo somali (que já sofre com divisões internas incuráveis de uma forma ou de outra). E impede, assim, que os mandatários eleitos se dediquem às suas tarefas: a pacificação desse país maltratado e de seus cidadãos.

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