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Teorias da conspiração em alta durante a pandemia

Alexander Görlach
14 de maio de 2020

O que significa quando uma sociedade não consegue mais chegar a acordo sobre os fatos básicos? Teorias conspiratórias não só estão em ascensão, como chegaram também ao centro da sociedade alemã, opina Alexander Görlach.

Manifestante contra medidas de isolamento na Alemanha. Na cabeça, um chapéu com a mensagem "Circo do Corona". Na mão, uma bandeira do antigo Império Alemão (1871-1918)Foto: picture-alliance/dpa/A. Dedert

Teorias da conspiração não só estão em ascensão, como chegaram também ao centro da sociedade na Alemanha. Para tal, os últimos dias forneceram, se não provas empíricas suficientes, pelo menos provas anedóticas: a minha linha do tempo do Facebook está agora repleta de declarações contra os virologistas, contra Bill Gates, contra as vacinas, contra Angela Merkel e contra as medidas de combate à pandemia.

Da noite para o dia, muitos dos meus contemporâneos transformaram-se nos especialistas que, eles próprios, classificam como inimigo. Obviamente, porém, a rejeição é apenas aos especialistas que têm uma opinião diferente. Aqueles que publicam uma opinião no Facebook não se tornam automaticamente especialistas – mesmo que o queiram.

As teorias da conspiração já tinham conquistado uma posição forte na Alemanha durante a crise dos refugiados de 2015. Na época, dizia-se que a chanceler federal havia planejado secretamente um "repovoamento" da Alemanha e que havia intencionalmente inundado o país com pessoas do Oriente Médio.

Já naquela época se suspeitava, nesses círculos, de uma conspiração mundial. Desde então, o nome do bilionário e filantropo George Soros vem sendo repetidamente mencionado, usado como suposta prova de uma conspiração mundial judaica. Tudo isso é semeado pelos chamados "cidadãos do Reich", que negam à República Federal qualquer legitimidade e emitem os seus próprios documentos de identidade.

Manifestante contra o isolamento com uma placa: "Não dê chance para Bill Gates" Foto: picture-alliance/dpa/S. Gollnow

Várias destas teorias conspiratórias, de tão tristes, chegavam a ser engraçadas. Naquele período, não tive a sensação de que a corda dos conspiradores estivesse se estreitando a minha volta. Desta vez é diferente. Por quê? Talvez porque a pandemia esteja realmente afetando todo mundo – todo mundo. 

Ninguém passa ileso por ela: as crianças não podem ir à creche, jardim de infância, escola. Os pais têm de tomar conta deles em casa e continuam a ser responsáveis pelo seu sustento. Universidades estão fechadas. Do restaurante à cabeleireira, todos os negócios estão fechados há semanas. Existências estão sendo destruídas, embora, em muitos países, cada vez mais setores estejam sendo autorizados a reabrir gradualmente. Aqueles que estão doentes, mas não têm covid-19, têm que esperar pela cirurgia. Quem está velho não pode mais ver familiares e amigos. E aqueles que morrem devido à infecção morrem de uma lenta asfixia.

Poderá isso ser realmente verdade? Um vírus pode realmente fazer isso com a gente? Grande parte da sociedade diz que "sim”, com um suspiro e talvez até com lágrimas nos olhos, e é confrontada com uma multidão que ruge, que se acumula, de perto, em locais públicos e exige em voz alta o fim da quarentena. 

Eles estão unidos pela firme convicção de que "aqueles que estão lá em cima" estão mancomunados com o mal. Em 2015, podem ter entrado em cena aqueles que sempre foram contra a imigração. Mas não foram os fatos que estiveram em debate, e sim o plano dos políticos para lidar com um fato - o de haver cerca de um milhão de refugiados que foi criticado.

Hoje em dia, o foco principal está nos fatos – no caso, a propagação de um vírus. E já neste ponto parece não haver mais acordo: para alguns, a covid-19 não é pior do que uma gripe sazonal. Outros se fiam à posição de uma pequena minoria na comunidade internacional - na imunidade de rebanho. Outros – um tal movimento já existente há muito tempo - rejeitam qualquer vacinação como inútil. Embora nem sequer exista ainda uma vacina contra a doença.

O que significa quando uma sociedade não consegue mais chegar a acordo sobre os fatos básicos? Então, se isso ainda não tiver acontecido, mais cedo ou mais tarde faltará a essa sociedade lugar ou instituição que possa criar espaço público de debate e moderar a discussão sobre diferentes formas de interpretar os fatos. 

Na Alemanha, este vírus propagou-se agora a todas as áreas da sociedade: até um pequeno círculo de bispos católicos de alto nível publicou uma carta em que se murmurava algo sobre o "governo mundial".

Para os autocratas, que nos últimos anos desacreditaram os especialistas e menosprezaram as elites, este espetáculo é uma celebração. O povo, terão o prazer de dizer, foi capturado com êxito por eles. Já não será mais cantado um cântico dos cânticos à educação, mas a charamela será sacada, e estrofes de louvor serão oferecidas ao homem forte. Ridicularizada será a modéstia com que o conhecimento normalmente aparece e, em vez disso, o boato jactancioso será glorificado. No final, a estupidez e a superstição vão se tornar os pregos do caixão da nossa democracia. Este declínio não tem nada a ver com o coronavírus, mas sim com o veneno que os populistas nos incutem há anos.

Alexander Görlach vive em Nova York e é membro sênio do Carnegie Council para Ética e Assuntos Internacionais e pesquisador sênior associado da Universidade de Cambridge, junto ao Instituto para Religião e Estudos Internacionais. Com doutorado em linguística e teologia, foi também bolsista e acadêmico visitante na Universidade de Harvard de 2014 a 2017 e acadêmico visitante na Universidade Nacional de Taiwan e na Universidade da Cidade de Hong Kong de 2017 a 2018.

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