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UE se rende à direita, Merkel tenta se salvar

29 de junho de 2018

Líderes europeus concordam em Bruxelas em fechar as portas do continente. Os populistas venceram, mas a desunião permanece. Merkel segue a onda, na tentativa desesperada de salvar a própria pele, opina Bernd Riegert.

Angela Merkel: adesão a fechamento de fronteiras externas para obter perspectiva de "solução europeia".Foto: picture-alliance/dpa/M. Erd

Após virar noite negociando, os exaustos líderes da União Europeia chegaram a um acordo para controle da migração que é sobretudo uma guinada à direita, a caminho de tornar a Europa uma fortaleza. Os populistas venceram: portões fechados, o problema deve ser transferido para o exterior. Campos de refugiados na Líbia e em outros países do norte da África devem parecer tão assustadores, que os migrantes africanos nem ousarão tentar chegar à Europa pelo Mediterrâneo.

Essa estratégia segue o modelo do acordo com a Turquia. No mar Egeu, a perspectiva de não se conseguir mais escapar das Ilhas Gregas fez com que só um pequeno número de refugiados, requerentes de asilo e migrantes pagassem contrabandistas e embarcassem em balsas precárias para chegar à UE.

Portanto dissuasão é a ordem do dia. Isso não é novidade. O que é novo é que a dissuasão deve agora ser implementada no norte da África, com as eufemisticamente intituladas "plataformas de desembarque". Ironicamente, é na Líbia que a UE quer confiar mais fortemente como parceira, país onde os migrantes têm sido explorados e torturados.

A Guarda Costeira da Líbia, equipada pela UE, será no futuro responsável por interceptar os migrantes numa área marítima muito maior. O objetivo é claro: quem for resgatado de um perigo causado por si mesmo vai ser empurrado de volta para o lugar de onde vem. Uma clara tática de dissuasão.

Esta estratégia é, além disso, disfarçada com muito dinheiro e boas palavras sobre a cooperação com os países africanos de origem. Essa cooperação – citada pela chanceler federal alemã, que já parece à beira do desespero – deve trazer resultados nas próximas décadas.

É claro que isso é complicado demais para o atual problema político. Mas é lamentável que o novo governo populista de direita na Itália tenha vencido, usando de sua brutal rejeição de náufragos. A chantagem funcionou: Roma recebeu, pelo menos no papel, o aval para os campos fechados obrigatórios na UE, dos quais aqueles que ainda chegam à Europa devem ser repelidos ou distribuídos a países que os recebam voluntariamente.

A estratégia de dissuasão da UE pode parecer dura, mas ela ainda é, no que toca a rota de fuga da Líbia à Itália, um produto de fantasia. Ainda é um mistério como e por quem as "plataformas de desembarque" serão estabelecidas, operadas e vigiadoas. De forma lapidar, a declaração da cúpula postula que elas não devem oferecer "nenhum incentivo adicional de fuga".

Os linhas-duras da EU, que cedem à pressão populista, podem triunfar. O primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán, pode agora afirmar, com razão, que sua estratégia – erguer cerca, afugentar, deportar – finalmente prevaleceu. A "orbanização" da política de migração da UE é uma concepção chocantemente simples. Não se fala mais, na declaração final da cúpula, da imigração legal, nem numa migração ordenada para a Europa.

E, mesmo assim, o acordo de Bruxelas é apenas preliminar e superficial: o problema central da UE, a saber, a solidariedade dos países-membros entre si, não foi resolvido, apenas adiado. Um grupo crescente de Estados rejeita radicalmente a distribuição de refugiados, requerentes de asilo e migrantes que conseguem chegar à Europa. Nesse ponto, a "orbanização" também avança. Não há novas regras sobre quem é responsável pelo requerente de asilo. A Convenção de Dublin continua em vigor.

E a chefe de governo alemã? Angela Merkel conseguiu pouco em curto prazo, para a disputa com seu próprio ministro do Interior. Se a Alemanha, como quer Horst Seehofer, rejeitar os requerentes de asilo na fronteira, a Áustria vai empurrá-los para a Itália e fechar suas fronteiras.

Até onde se sabe, Merkel não conseguiu concluir acordos bilaterais sobre o assunto. Ela aderiu plenamente ao roteiro de fechamento de fronteiras externas defendido pelos demais participantes da cúpula, a fim de poder, pelo menos, falar de uma "solução europeia". Pela primeira vez em muito tempo, ela não tinha mais nas mãos a liderança da cúpula da UE. Não é certo que isso bastará para obter uma trégua com a CSU.

Essa "cúpula sobre o destino da chanceler federal alemã" trouxe poucas soluções práticas para o assunto. No entanto, a UE se deu conta mais uma vez que o problema da "invasão", da "pressão nas fronteiras", sobre o qual se discutiu toda a noite, realmente só existe nas mentes dos governos populistas e de seus simpatizantes cada vez mais xenófobos. O número das novas chegadas à UE já caiu 95% em relação a 2015, de acordo com o documento da cúpula. Agora, então, só se trata de manter também os últimos 5% fora da UE.

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Bernd Riegert Correspondente em Bruxelas, com foco em questões sociais, história e política na União Europeia.
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