Os últimos anos mostraram do que a AfD é capaz. E, mesmo assim, os outros partidos parecem não perceber o perigo. Em vez de temer perda de votos, eles deveriam buscar o confronto, opina Hans Pfeifer.
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O partido A Alternativa para a Alemanha (AfD) foi estabelecido há oito anos, em 2013. Desde o início, com foco em mudar o país através do populismo de direita. Lançada como uma campanha contra a União Europeia e o euro, a legenda sempre esteve associada a agitadores racistas e nacionalistas.
No entanto - ou talvez exatamente por isso - o partido continua a ter sucesso. Hoje, ele tem bancada no Parlamento alemão, em todos os legislativos estaduais e em vários a nível municipal. Nos estados do leste, se tornou uma força política cosiderável.
Seu sucesso lhe rendeu milhões em subsídios públicos concedidos aos partidos políticos, mas, mais importante ainda, trouxe influência política. Na última semana, a legenda teve a chance de concorrer à presidência da Comissão de Assuntos Internos do Parlamento, um comitê-chave. É o órgão responsável por políticas de refúgio e asilo, combate ao extremismo de direita e que supervisiona o trabalho dos serviços de inteligência.
O presidente da comissão funciona como o interlocutor do Parlamento com os órgãos de segurança. Custa-se a acreditar que este posto realmente tenha sido oferecido a um legislador de um partido que é descrito como anticonstitucional pelas mesmas agências que supervisionaria. Um partido que ainda tem membros que aderem às ideias de Adolf Hitler. Um partido que abriga vários funcionários eleitos que não podem mais usar uniforme policial ou militar, porque sua lealdade ao Estado está em questão. Grotesco – e tudo, menos a expressão de uma democracia robusta.
Os partidos eleitos têm direitos, independentemente de sua ideologia: essa é uma das regras do jogo da democracia. Ela se estende até à AfD. Mas são os políticos que decidem quem deve ocupar certos cargos. Os partidos maiores no Parlamento poderiam ter escolhido presidir eles mesmos o comitê.
Eles aparentemente nem sequer tentaram fazer isso. No final, 40 legisladores rejeitaram o candidato da AfD para o cargo. Isso também é um direito deles, mas oferecerá ao partido mais munições para se posicionar como vítima.
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O sucesso da AfD é o fracasso dos partidos democráticos
Os partidos da coalizão governista - os social-democratas, os verdes e os liberais - assim como os partidos conservadores na oposição aparentemente preferiram se concentrar em outras chefias de comissão. Isso é chocante. O ódio e o incitamento à violência não são novidade na Alemanha.
Nancy Faeser, a nova ministra do Interior, disse com razão que o extremismo de direita é a maior ameaça que o país enfrenta. Assassinatos de extrema direita, centenas de ataques a refugiados, incidentes diários de antissemitismo: as estatísticas são alarmantes. Os protestos cada vez mais radicais da covid-19 mostram como o extremismo político é explosivo. Mas os partidos democráticos da Alemanha estão vacilando e não estão à altura do desafio.
No debate sobre a AfD, frequentemente se acusa quem usa argumentos contra o partido de banalizarem o nazismo. Eles dizem que ser de direita não necessariamente faz de alguém nazista. Mas o partido flerta com a ideologia nacional-socialista, com o nacionalismo de direita e a hostilidade à democracia. Este é um fato, confirmado repetidas vezes por pesquisadores e jornalistas. E pelo próprio partido, surpreendentemente.
É por isso que é tão importante que outros partidos políticos não priorizem suas próprias perspectivas quando lidam com a AfD. Eles não devem ceder ao partido por medo de perder votos. Pelo contrário, eles devem buscar o confronto. Trata-se da sobrevivência da democracia.
Se um de seus membros acabasse por ser eleito, a AfD sem dúvida se divertiria em mostrar sua posição como presidente da Comissão de Assuntos Internos. Faz parte de sua estratégia mais grandiosa minimizar a extensão de sua radicalidade sob o pretexto de responsabilidade política.
Os sucessos eleitorais do partido já mudaram a Alemanha, particularmente nas regiões orientais, onde muitos pequenos clubes e associações lamentam o fato de que o ódio e o incitamento à violência estão aumentando na vida cotidiana. É difícil ainda avaliar a extensão real dos prejuízos dos últimos oito anos, mas já é claro: esse tempo foi suficiente para lançar as bases para danos enormes.
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O texto reflete a opinião pessoal do autor, e não necessariamente da DW.
Todos os presidentes alemães
O presidente da Alemanha tem apenas funções representativas. Após falar com representantes dos partidos, ele sugere ao Bundestag um nome para a chefia do governo. Ele também ratifica decisões do Parlamento e dá indultos.
Foto: picture-alliance/dpa/B. von Jutrczenka
Frank-Walter Steinmeier
Frank-Walter Steinmeier foi eleito presidente da Alemanha em 12 de fevereiro de 2017 com 931 dos 1.239 votos. Ele nasceu em 05/01/1956 em Detmold e entrou para o SPD em 1975. Ele queria ser arquiteto, mas acabou estudando Direito e Ciências Políticas. Considerado eficiente, discreto e confiável, foi o braço direito do ex-chanceler federal Gerhard Schröder e ministro do Exterior de Angela Merkel.
Foto: Reuters/F. Bensch
Joachim Gauck (de 2012-2017)
O candidato sem filiação partidária recebeu 991 dos 1228 votos logo na primeira votação, em 18 de março de 2012. Tomou posse em 23 de março de 2012. Natural de Rostock, no leste alemão, é conhecido por dizer o que pensa.Gauck estudou Teologia, foi pastor luterano e antes da queda do Muro foi o porta-voz da Aliança 90, união de movimentos sociais que exigia democracia na então Alemanha Oriental.
Foto: picture-alliance/dpa
Christian Wulff (2010-2012)
O democrata-cristão ex-governador da Baixa Saxônia foi eleito presidente apenas na terceira votação da Assembleia Federal em 30 de junho de 2010, o que foi interpretado como derrota ao governo de Angela Merkel. Pressionado por acusações de ter se favorecido no cargo, ele renunciou em 17 de fevereiro de 2012.
Foto: picture-alliance/dpa
Horst Köhler (2004-2010)
Horst Köhler, ex-diretor-geral do FMI, foi candidato dos partidos cristão-democrata e social-cristão, e dos liberais. Eleito a 23 de maio de 2004 e tomou posse em 1º de julho. Foi reeleito em 23 de maio de 2009, mas renunciou em 31 de maio de 2010 em consequência das críticas aos seus comentários sobre as ações militares e os interesses comerciais da Alemanha no Afeganistão.
Foto: AP
Johannes Rau (1999-2004)
Johannes Rau assumiu o cargo no dia 1º de julho de 1999. Ele fora eleito a 23 de maio daquele ano, com 51,8% dos votos do colegial eleitoral. Político de grande destaque no Partido Social Democrata (SPD), Johannes Rau foi governador de um dos mais importantes estados da Alemanha, a Renânia do Norte-Vestfália.
Foto: AP
Roman Herzog (1994-1999)
Roman Herzog ocupou o cargo durante um mandato, depois de ser eleito com 52,7% dos votos do colégio eleitoral. Anteriormente, Herzog ocupara um dos cargos mais importantes do país: foi presidente do Tribunal Constitucional Federal, a Corte Suprema da Alemanha.
Foto: AP
Richard von Weizsäcker (1984-1994)
O sexto presidente da República Federal da Alemanha teve dois mandatos. Já na sua primeira eleição, ele obteve 80,9% dos votos. Sua reeleição em 1989, com 86,2% dos votos, foi quase uma consagração: somente Theodor Heuss, o primeiro presidente alemão, obteve maior votação em 1954. Richard von Weizsäcker, político destacado da União Democrata Cristã (CDU), foi prefeito de Berlim Ocidental.
Foto: picture-alliance/dpa
Karl Carstens (1979-1984)
Ex-presidente do Parlamento federal, Karl Carstens foi candidato do seu partido, a União Democrata Cristã (CDU), sendo eleito com 51,2% dos votos a 23 de maio de 1979. Ele foi o primeiro dos chefes de Estado da República Federal da Alemanha a ser eleito no dia 23 de maio – o Dia da Constituição. Desde então, tornou-se uma tradição que os presidentes alemães sejam eleitos nessa data.
Foto: AP
Walter Scheel (1974-1979)
Walter Scheel destacou-se como ministro do Exterior, antes de ser eleito presidente, com 51,3% dos votos, a 15 de maio de 1974. O político do Partido Liberal Democrata (FDP) desempenhara papel importante nas negociações para a formação da coalizão de governo entre seu partido e o Partido Social Democrata (SPD).
Foto: picture alliance/Keystone
Gustav W. Heinemann (1969-1974)
Conservador e religioso, Gustav W. Heinemann abandonou a União Democrata Cristã (CDU) por discordar da sua política de rearmamento da Alemanha, transferindo-se para o Partido Social Democrata (SPD). Em 5 de março de 1969, Heinemann foi eleito presidente alemão com 50% dos votos. A mais baixa votação já recebida por um chefe de Estado alemão do pós-guerra.
Foto: picture-alliance/dpa
Heinrich Lübke (1959-1969)
Para o seu primeiro mandato, o político conservador da União Democrata Cristã (CDU) foi eleito a 1º de julho de 1959, com 50,9% dos votos. Sua reeleição se deu a 1º de julho de 1964. Ele recebeu então 69,3% dos votos do colégio eleitoral.
Foto: AP
Theodor Heuss (1949-1959)
O primeiro presidente da República Federal da Alemanha teve dois mandatos seguidos, de 1949 até 1959. Sua primeira eleição foi em 12 de setembro de 1949, com 52% dos votos. A reeleição foi em 17 de julho de 1954 e Heuss obteve 88,2% dos votos! Theodor Heuss é o mentor do liberalismo alemão no pós-guerra. Ele ajudou a fundar o Partido Liberal Democrático (FDP).<br> Edição: Roselaine Wandscheer