Opinião: Um ano perdido para a Grécia
Após uma vitória eleitoral surpreendentemente clara, o "tribuno do povo" da Grécia Alexis Tsipras formou seu governo em tempo recorde, juntamente com o populista de direita Gregos Independentes (ANEL). Na época, o primeiro-ministro, do partido de esquerda radical Syriza, prometeu o fim da política de austeridade e uma decidida renegociação dos pacotes de resgate com os credores internacionais.
Um ano mais tarde, convertido num seguidor da realpolitik, é certo que Tsipras ainda governa uma Grécia falida, porém a "revolução" de esquerda está engavetada. Ele é agora o terceiro e mais rigoroso fiscal do pacote de austeridade imposto ao país pelos próximos cinco anos.
Em si, o processo de amadurecimento político do jovem premiê grego é digno de louvor. O escândalo é que ele prejudicou gravemente seu país.
A Grécia – que, ao contrário de todos os demais países economicamente debilitados da Europa Meridional, não quer sarar – se permitiu realizar em 2015 duas eleições antecipadas e um referendo. Todas essas votações foram pensadas como manifestação de resistência dos fracos, como tapa na cara dos supostamente tenebrosos poderes da União Europeia e do Fundo Monetário Internacional.
O resultado é contraditório: a Grécia permanece sob curatela internacional, os eleitores do Syriza estão decepcionados; mas Tsipras se mantém firme na sela.
A questão é: por quanto tempo o chefe de governo esclarecido ainda poderá continuar se fazendo de Dom Quixote. A economia está estagnada, o desemprego se alastra, vastas parcelas da população estão empobrecidas. A culpa não é da odiada política de austeridade, mas sim do fracasso de todos os governos dos últimos cinco anos na tentativa de reformar o país – mesmo que fosse apenas pro forma.
Tal se demonstra, novamente, no exemplo da mais do que atrasada reforma dos sistemas de seguridade social, um desiderato clássico da política grega há décadas. Nenhuma força política teve a coragem de reformar o velho sistema de aposentadoria – cujo financiamento há muito é impraticável.
Agora os credores colocaram o Syriza sob a obrigação de enfrentar o problema. Os protestos de diversos grupos nos últimos dias mostram quão renhida será a resistência contra a modernização.
Os grandes e difíceis projetos de reforma, porém, não são os únicos motivos porque o novo ano deverá ser delicado para Tsipras e o seu Syriza. A maioria governamental no Parlamento, apoiada em apenas três assentos, não está a salvo de todas as circunstâncias.
Por exemplo: só com os votos da oposição o governo conseguiu aprovar a lei do casamento homossexual – seu parceiro de coalizão ANEL era contra. Após uma série de derrotas eleitorais e uma longa fase de impotência, o conservador Nova Democracia acabou por se reorganizar sob seu novo presidente Kyriakos Mitsotakis, voltando a ser uma força política digna de se levar a sério. Segundo as consultas mais recentes entre o eleitorado, a legenda até já acusa uma ligeira vantagem sobre o Syriza.
Nesse volátil panorama político, há até pouco tempo pelo menos a base do Syriza podia evocar a superioridade "moral" dos esquerdistas, que nunca haviam constituído governo, diante dos partidos estabelecidos. Depois que, nas últimas semanas, uma série de casos de nepotismo foi revelada, eles não têm mais como alegar tal superioridade.
Ao ser acusado de ter fornecido cargos no serviço público para alguns parentes seus, o presidente da Juventude do Syriza deu uma explicação peculiar: seu avô e sua avó não haviam lutado em vão contra a ocupação alemã, sob a bandeira da organização comunista de resistência EAM; agora estava na hora de os netos serem recompensados!
Um ano atrás, o Syriza anunciou um recomeço na política e na sociedade. Um ano mais tarde, o recomeço parece não passar do outro lado da moeda dos velhos costumes. Só que mais grotesco.