Oposição inicia impeachment do presidente da Coreia do Sul
Publicado 4 de dezembro de 2024Última atualização 5 de dezembro de 2024Seis partidos da oposição na Coreia do Sul apresentaram nesta quarta-feira (04/12) uma moção para iniciar um processo de impeachment do presidente Yoon Suk Yeol, um dia depois de ele declarar lei marcial no país – para depois voltar atrás, pressionado pelo Parlamento e por protestos populares.
A principal sigla da oposição, o Partido Democrático (PD), e cinco outros partidos iniciaram assim o processo parlamentar que poderá levar à destituição do presidente sul-coreano, cujo partido governa em minoria.
"A declaração de lei marcial de Yoon é uma clara violação da Constituição", disse o PD em uma resolução na qual destacou que o presidente não cumpriu nenhum dos requisitos para acionar esse mecanismo.
A apresentação da moção de destituição foi anunciada na Assembleia Nacional pelos 192 deputados dos seis partidos. Eles afirmaram que querem votar a proposta nesta sexta-feira ou no sábado, dentro do prazo legal de 72 horas para a tramitação deste tipo de iniciativa.
Para que a proposta seja aprovada, é necessário o apoio de pelo menos 200 dos 300 legisladores que compõem o Parlamento da Coreia do Sul. O PD e outras forças tinham obtido 190 votos na véspera para revogar a lei marcial, dessa maneira ainda precisam dez votos para afastar Yoon.
O Partido do Poder Popular, do próprio Yoon, criticou a decisão de aplicar a lei marcial, com o líder do partido, Han Dong-hoon, prometendo trabalhar para "acabar com ela juntamente com o povo", tendo alguns dos seus deputados votado a favor da revogação.
Se a moção for aprovada, Yoon Suk Yeol será destituído das funções até que o Tribunal Constitucional delibere, durante um período máximo de 180 dias, sobre uma eventual violação da Constituição.
Greve até saída do presidente
A Confederação Coreana de Sindicatos (KCTU), maior entidade sindical da Coreia do Sul, prometeu nesta quarta-feira iniciar uma greve até que o presidente renuncie ao cargo.
"Estaremos unidos ao povo e lideraremos a luta pela renúncia imediata do presidente Yoon Suk Yeol", disse um funcionário da KCTU durante uma entrevista coletiva, informou a agência de notícias sul-coreana Yonhap.
"A greve geral da KCTU será o ponto de partida para resolver a era desigual e polarizada e dar início a uma nova era que respeite o trabalho", acrescentou.
Os sindicatos ligados a essa confederação decidirão individualmente quando iniciarão suas greves, e os da região metropolitana da capital, Seul, planejam se reunir na Praça Gwanghwamun pela manhã, para protestar contra o governo.
O que aconteceu
Na terça-feira à noite, Yoon anunciou a imposição da lei marcial em um pronunciamento televisionado para "limpar" o país de aliados da Coreia do Norte e proteger a "ordem constitucional" de atividades "antiestatais", pelas quais ele acusa o oposicionista PD. Ele justificou a medida acusando os oposicionistas de serem "forças pró-Coreia do Norte, sem vergonha, que estão saqueando a liberdade e a felicidade" dos sul-coreanos.
Poucas horas depois, o presidente suspendeu a lei marcial, depois de o Parlamento da Coreia do Sul, a Assembleia Nacional, ter revogado a decisão, numa sessão plenária extraordinária convocada quando milhares já protestavam nas ruas de Seul.
O anúncio sobre a lei marcial foi feito depois que o partido opositor, que tem maioria no Parlamento, aprovou, sem o apoio do Partido do Poder Popular (PPP) de Yoon, um orçamento geral para 2025 com vários cortes, além de moções para demitir o procurador-geral e o chefe do Conselho de Auditoria e Inspeção, que monitora as contas dos órgãos públicos.
A lei marcial proibia todas as atividades políticas, inclusive manifestações, e fechava a Assembleia Nacional (e forças especiais da polícia deslocadas para conter manifestantes). A imprensa também passaria a ser controlada pelo governo.
Mas apesar do fechamento da Assembleia, os deputados conseguiram entrar no prédio e fizeram uma sessão de emergência declarando a lei marcial inválida.
Impopularidade
A medida foi decretada em meio a um contexto de baixa aprovação do presidente e de troca de acusações entre o governo e a Assembleia Nacional, controlada pela oposição.
À frente de um governo tão impopular quanto enfraquecido, ao que ele chegou graças à estreita margem de menos de 1% numa eleição na qual derrotou o liberal Lee Jae-myung em 2022, Yoon (nascido em Seul em 1960) é o líder sul-coreano com a mais alta classificação negativa da história (74%, de acordo com a empresa de pesquisa Gallup Korea) e o primeiro na democracia do país a não ter o controle da Assembleia Nacional em nenhum momento durante seu mandato.
Entre as principais justificativas para desaprovação de Yoon estão o plano de expandir as cotas em faculdades de Medicina, questões econômicas e inflação, falta de comunicação, liderança arbitrária e unilateral e um desempenho diplomático ruim.
Além disso, a Coreia do Sul e a Coreia do Norte vivem uma escalada de tensões militares.
A oposição acusou o presidente de estar usando o conflito com a Coreia do Norte para controlar a Assembleia Nacional. Atualmente, a grande maioria dos parlamentares se opõe ao governo de Yoon.
Queda do ministro da Defesa
Nesta quarta-feira, o líder do partido de Yoon, Han Dong-hoon, pediu ao presidente que explicasse a decisão de convocar lei marcial e que demitisse o ministro da Defesa, Kim Yong-hyun, pelo que chamou de "situação desastrosa".
"Como partido no poder, gostaríamos de oferecer um profundo pedido de desculpas aos cidadãos pela atual situação desastrosa. O presidente Yoon deve explicar essa situação e procurar os responsáveis, e demitir imediatamente o ministro da Defesa, que propôs a lei marcial", disse Han, segundo a agência de notícias sul-coreana Yonhap.
Logo após a declaração, o ministro da Defesa apresentou a demissão. "Peço desculpa por ter causado confusão e preocupação ao público relativamente à lei marcial", afirmou Kim num comunicado, segundo a Yonhap.
"Assumo a responsabilidade por todos os assuntos relacionados com a lei marcial e apresentei a minha demissão ao presidente", anunciou. "Todos os soldados que cumpriram seus deveres relacionados à lei marcial seguiram as instruções do ministério, e toda a responsabilidade recai sobre mim", acrescentou Kim.
Segundo a imprensa local, Kim esteve entre aqueles que sugeriram a Yoon recorrer à lei marcial para fazer frente à situação política em que seu governo se encontrava.
Nesta quinta-feira (05/12), Yoyn anunciou que aceita a renúncia do ministro da Defesa. Kim, considerado um "falcão" e uma figura extremamente próxima a Yoon, era uma das figuras mais proeminentes do governo sul-coreano e está deixando seu cargo depois de ocupá-lo por apenas 89 dias.
Como é de praxe na Coreia do Sul, Yoon nomeou como seu substituto outro militar aposentado, Choi Byun-hyuk, um general de quatro estrelas que foi vice-comandante das Forças Combinadas Coreia do Sul-EUA entre 2019 e 2020 e que desde dezembro de 2023 era embaixador na Arábia Saudita, considerada um cliente estratégico para as vendas de armas sul-coreanas.
Derrota eleitoral e acusações de corrupção
A impopularidade de Yoon foi demonstrada nas eleições gerais realizadas em abril deste ano, quando o PD, a principal sigla da oposição, obteve novamente uma vitória esmagadora, ampliando seu controle da Assembleia Nacional, ao obter mais de 170 das 300 cadeiras da Casa e enfraquecendo significativamente a presidência de Yoon, que começou a ser considerado um "pato manco", ou seja, um presidente com poder em declínio.
O PD é liderado por Lee Jae-myung, rival de Yoon na eleição de 2022, que provavelmente concorrerá à Presidência novamente em março de 2027.
Após a derrota no pleito, Yoon prometeu mudanças no governo e políticas de estabilização da economia sul-coreana.
Os baixos índices de aprovação também se explicam pelas várias controvérsias e escândalos em que está envolvido, inclusive episódios que envolvem sua esposa, como acusações de manipulação de ações, plágio em artigos acadêmicos e até mesmo de recebimento irregular de uma bolsa de luxo da marca Dior por um pastor coreano-americano.
Além disso, na semana passada, o PD rejeitou o orçamento do governo e avançou com um plano de revisão de gastos, cortando o equivalente a mais de R$ 17 bilhões. A medida irritou o gabinete presidencial, sendo que a porta-voz do governo chamou a ação de "tirania parlamentar".
md/cn (EFE, AFP, Lusa)