Partido do presidente Erdogan perde prefeitura da maior cidade da Turquia após mais de 20 anos no poder. Social-democrata ganha pela segunda vez seguida, após primeiro pleito ter sido anulado, em decisão controversa.
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O prefeito eleito de Istambul, o social-democrata Ekrem Imamoglu, prometeu "abrir uma nova página" no país. A declaração foi feita após o anúncio do resultado da eleição neste domingo (23/06), que impôs uma dura derrota ao conservador Binali Yildirim, do Partido da Justiça e do Desenvolvimento (AKP) do presidente turco, Recep Tayyip Erdogan.
A vitória da centro-esquerda na maior metrópole turca encerrou um ciclo de mais de 20 anos de hegemonia do grupo político do mandatário na administração da cidade.
"Estas eleições são uma contribuição para a democracia na Turquia. Foram boas para a Turquia e para Istambul", afirmou o oposicionista, diante de dezenas de câmeras de televisão na sede de sua legenda, o Partido Republicano do Povo (CHP), situada no bairro de Sariyer.
Imamoglu obteve 54% dos votos, enquanto seu rival, o ex-primeiro-ministro Binali Yildirim, ficou com 45,1%, de acordo com os números divulgados após mais de 99% dos votos contados, segundo a agência de notícias estatal Anadolu.
Yildirim admitiu a derrota logo após o anúncio das primeiras parciais, comentando, em relação ao adversário: "Eu o parabenizo e lhe desejo sucesso." Imamoglu agradeceu especialmente o apoio das "centenas de milhares" que participaram como observadores nas seções eleitorais, classificando-os de "heróis da democracia".
As autoridades eleitorais turcas anularam o primeiro pleito, realizado em 31 de março e vencido por Imamoglu por uma diferença de 0,16% – menos de 14 mil votos. A controversa decisão atendeu a uma reivindicação da legenda de Erdogan, o AKP, apontando supostas irregularidades no pleito.
As eleições locais em março foram vistas como um referendo sobre as políticas de Erdogan e a popularidade de seu partido governista. Embora o AKP tenha vencido a maioria das eleições locais, ele perdeu a votação para a prefeitura da capital Ancara, assim como a disputa em Istambul.
Ao votar neste domingo, Erdogan dissera esperar que os eleitores "tomem a melhor decisão para Istambul", assim como uma grande participação nas urnas.
Apesar da crise de relacionamento, Europa e Turquia têm muito em comum. Istambul, por exemplo: a metrópole de 15 milhões de habitantes não é apenas geograficamente parte da Europa. Uma viagem pela cidade dos contrastes.
Foto: Rena Effendi
Para além das categorias convencionais
Istambul é a única cidade do mundo localizada em dois continentes: Europa e Ásia. Na metrópole do Bósforo, tradição e modernidade, religião e estilo de vida secular colidem como em nenhum outro lugar. Muitos dizem que exatamente isso faz a magia da cidade.
Foto: Rena Effendi
Quase 3 milênios de existência
Uma história de mais de 2.600 anos molda a paisagem urbana da Istambul de hoje. Diversos líderes se alternaram na luta pelo poder: persas, gregos, romanos, otomanos. "Constantinopla" era o centro do Império Bizantino e posteriormente do Império Otomano. Só em 1930 a cidade foi batizada "Istambul".
Foto: Rena Effendi
Entre mundos
O Bósforo é a alma azul de Istambul. O estreito separa a parte europeia da parte asiática da cidade. Todos os dias, balsas levam dezenas de milhares de um lado para o outro. Gaivotas gritam ao vento. A bordo, há chá e "simit" (anéis de gergelim). A travessia leva cerca de 20 minutos, de Karaköy, na Europa, para Kadiköy, na Ásia.
Foto: Rena Effendi
Pontes conectam
A partir da ponte Galata, é possível observar bem os navios – e outras coisas mais. Aqui, pescadores se apinham na esperança de uma boa pesca. Entre eles: comerciantes, turistas, engraxates, vendedores de milho. A primeira ponte foi construída aqui em 1845 – quando Istambul ainda se chamava Constantinopla.
Foto: Rena Effendi
"Europa é um sentimento"
"Meu nome é Vefki", diz um dos pescadores, acenando. "Eu me sinto europeu. Queremos mais liberdade, e por isso a Turquia e a UE devem se aproximar." Vefki é aposentado e a pesca é seu hobby, mas também uma renda extra. Por dois quilos de peixe, ele consegue no mercado o equivalente a cerca de oito euros.
Foto: Rena Effendi
Minaretes no coração da cidade
Na Praça Taksim, no coração da cidade, zunem máquinas de construção. Aqui, uma nova mesquita é erguida a alta velocidade, com uma cúpula de 30 metros de altura e dois minaretes. Tudo deve estar pronto até as eleições de 2019. Críticos acusam o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, de impor uma nova identidade à praça: islâmico-conservadora e neo-otomana, ao invés de secular e europeia.
Foto: Rena Effendi
Europeia e devota
O tom é mais conservador no bairro de Fatih, apesar de ele se situar na parte europeia de Istambul. Muitos que vivem aqui imigraram da Anatólia, procurando trabalho e uma vida melhor. Alguns também chamam Fatih de "bairro dos devotos": aqui são muitos os adeptos fiéis do presidente turco e de seu partido conservador-islâmico AKP.
Foto: Rena Effendi
Compras à sombra da mesquita
Quarta-feira é dia de mercado em torno da mesquita de Fatih. Tem empurra-empurra e regateio por eletrodomésticos, roupas, lençóis, frutas e legumes. Os preços são mais baixos do que em outros lugares, assim como os aluguéis. Atualmente muitas famílias sírias vivem em Fatih. Desde o início da guerra, em 2011, a Turquia recebeu mais de 3 milhões de refugiados – mais do que qualquer outro país.
Foto: Rena Effendi
"Pequena Síria" no coração de Istambul
Fatih é agora conhecida por seus restaurantes sírios: O kebab daqui vem com alho extra. "Misafir" (hóspedes) é como os refugiados são oficialmente chamados na Turquia. O status de asilo vigente na UE não existe aqui. Mas o governo prometeu cidadania turca para dezenas de milhares de sírios. Críticos veem nisso uma tentativa de angariar votos adicionais.
Foto: Rena Effendi
Vida noturna em "Hipstambul"
Quem quiser sair, fazer festa, beber álcool, tem que procurar outros bairros de Istambul. Por exemplo Kadiköy, do lado asiático. Ou vir aqui para Karaköy, um dos bairros mais antigos, mas hoje extremamente encarecido. Moradores e turistas se encontram em cafés, lojas conceituais e galerias. A política islâmica conservadora do governo não encontra muitos entusiastas por aqui.
Foto: Rena Effendi
Esperança no turismo
"Istambul mudou muito", diz Ayşegül Saraçoğlu. Ela trabalha numa loja de grife no bairro turístico de Galata. "Há alguns ano,s muitos europeus vinham para cá de férias", agora são principalmente turistas árabes. "Isso é ruim para o nosso negócio", reclama, "espero que mude em breve".