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Os argumentos da acusação e da defesa de Temer

2 de agosto de 2017

Documento entregue por advogados à Câmara contesta ponto a ponto as acusações da PGR pelo crime de corrupção passiva. Saiba o que afirmam os dois lados sobre a denúncia, em temas que vão de provas a propina.

Michel Temer
Após vencer primeira batalha contra queda na CJJ, Temer depende agora de votação no plenário da CâmaraFoto: Reuters/U. Marcelino

A denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) contra o presidente Michel Temer está nas mãos  da Câmara dos Deputados, que se reúne nesta quarta-feira (02/08) para decidir pela primeira vez se um presidente da República deve ser processado criminalmente.

A votação ocorre após o presidente ter conseguido, em julho, uma vitória tática na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), cujo colegiado enterrou o relatório que defendia o prosseguimento da denúncia criminal contra Temer. Independentemente das conclusões da CCJ, a ação passa agora por análise do plenário da Câmara.

Leia mais: O passo a passo da votação da denúncia contra Temer

São necessários os votos de dois terços dos parlamentares, ou 342 de 513 deputados, para que o processo avance. Se a ação for admitida na Câmara, ela vai ao Supremo Tribunal Federal (STF) para ser julgada por seus ministros. Em caso de rejeição pela Câmara, a denúncia é arquivada.

Sobre a denúncia, confira ponto a ponto o que dizem acusação e defesa:

Delação da JBS

A denúncia apresentada pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, em 26 de junho passado, tem como base a delação premiada dos executivos da JBS, que negociaram imunidade com a Justiça em troca de relatar o que sabiam. Em entrevista à emissora GloboNews, Janot afirmou que precisou fazer uma "escolha de Sofia" ao firmar o acordo com os empresários.

"Eu tinha tomado conhecimento que altíssimas autoridades da República estavam praticando crimes, os crimes estavam em curso e crimes graves. Se eu não aceitasse esse acordo, não teria como apurar esses crimes. Eu teria que fingir que nada tinha ouvido, que nada tinha acontecido, e essas pessoas continuariam a cometer crimes", declarou o procurador em entrevista à emissora.

No documento apresentado à Câmara, a defesa contesta a maneira como os acordos têm sido firmados e afirma que as delações têm sido "um instrumento de impunidade que transforma delatores em paladinos da verdade e auxiliares da Justiça".

Com tais acordos, os irmãos Joesley e Wesley Batista, executivos da JBS, teriam sido "regiamente premiados com regalias", segundo acusam os advogados, acrescentando que os benefícios concedidos aos "irmãos-metralha" têm sido chamados de "acinte, escárnio, tapa na cara, vergonha nacional e outros tantos".

Corrupção passiva

A denúncia acusa o presidente de ter cometido o crime de corrupção passiva – Temer teria usado sua influência como presidente para favorecer a empresa JBS em negócios do governo em troca de propina.

"Entre os meses de março e abril de 2017, com vontade livre e consciente, o presidente da República Michel Miguel Temer Lulia, valendo-se de sua condição de chefe do Poder Executivo e liderança política nacional, recebeu para si, em unidade de desígnios e por intermédio de Rodrigo Santos da Rocha Loures, vantagem indevida de R$ 500.000,00", diz Janot no documento.

A defesa, por sua vez, rechaça a acusação e fala em "inépcia da denúncia". Segundo argumentam os advogados, a ação da PGR deve descrever de forma minuciosa o suposto crime cometido, o que não teria sido visto na acusação apresentada pela PGR.

"O Ministério Público Federal, apesar de haver citado o nome de Michel Temer, não expôs qual teria sido o seu agir no evento criminoso denunciado", afirma a defesa.

"Estaria Michel Temer sendo acusado tão somente por Rodrigo Loures ser 'homem de sua total confiança'? Estaria ele sendo denunciado apenas porque conversou com Joesley Batista em 'encontro noturno e secreto' no Palácio do Jaburu?", questionam os advogados.

Janot ainda não apresentou uma esperada segunda denúncia contra o presidente, pelos crimes de obstrução de Justiça e organização criminosa. A especulada delação do ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) também ainda não veio.

Provas

Além dos depoimentos de diretores da JBS, as acusações contra Temer se apoiam sobretudo em gravações ambientais em áudio feitas por um dos proprietários da empresa, Joesley Batista. São ao todo quatro gravações, todas de conversas registradas em março deste ano.

Além de um diálogo entre Joesley e o próprio presidente no Palácio do Jaburu, os áudios também revelam uma conversa entre o empresário e o ex-assessor pessoal de Temer e ex-deputado Rodrigo Rocha Loures, em 6 de março, na qual os dois teriam arranjado o encontro com o mandatário.

Os demais áudios foram gravados em outros encontros entre Joesley e Loures, em 13 de março e 16 de março, sendo o primeiro na residência do empresário em São Paulo e o segundo, na casa do ex-deputado em Brasília. Nas ocasiões, teriam sido discutidos interesses da JBS junto ao governo.

A defesa, no entanto, contesta a legitimidade das gravações e afirma que a denúncia é baseada em "ilações sem provas" e que se trata de um documento "inconsistente, frágil e desprovido de força probatória" para que a Câmara conceda autorização para um processo penal.

"A acusação, em face da carência de elementos probatórios, recorreu aos recursos intelectuais da suposição, da hipótese e das ilações que permitem afirmações de qualquer natureza no afã de emprestar falsa aparência de uma realidade que, na verdade, é uma mera ficção. A defesa está absolutamente consciente de que a acusação não se funda em prova e sequer se funda em indício."

Áudio envolvendo Temer

Entre os áudios apresentados pela PGR como provas da acusação, está uma conversa entre o presidente e Joesley durante uma visita do executivo ao Palácio do Jaburu, residência oficial de Temer. No diálogo, teriam sido mencionados supostos crimes praticados por políticos.

A acusação da PGR garantia que o áudio das gravações não sofreu edição, como vem alegando Temer desde o vazamento das conversas. A Polícia Federal divulgou o laudo de uma perícia realizada pelo Instituto Nacional de Criminalística, que garantiu a plenitude das gravações.

Na ocasião, os peritos identificaram mais de 180 interrupções "naturais" no áudio. Essas pausas teriam sido causadas pelo aparelho utilizado para gravar a conversa, que possui um mecanismo de economia de bateria que interrompe automaticamente a gravação em momentos de silêncio.

A defesa, por outro lado, diz que o áudio é "ilícito", foi adulterado e "não prova nada". "A gravação, em verdade, não possui solidez para dar embasamento às acusações, e isto por tríplice razão. A primeira trata de prova ilícita, visto ter ela sido feita sem um escopo que lhe desse legitimidade."

"Por outro lado, sofreu adulterações, cortes e interrupções que lhe retiram a autenticidade e, por fim, mesmo que superadas as deficiências anteriores, não possui conteúdo incriminador, pois nenhum só de seus trechos revela prática delituosa", acrescentam os advogados de Temer.

A defesa insistiu que "não há sequer indícios de que, pelo conteúdo do áudio, o presidente tenha incorrido em delito de corrupção passiva", acusação feita pela PGR.

Nesta terça-feira (01/08), a PGR se manifestou, por meio de parecer enviado ao STF, contra o pedido da defesa de Temer para ter acesso aos áudios do gravador de Joesley.

Visita de Joesley ao Jaburu

A PGR contestou a visita de Joesley ao Palácio do Jaburu tarde da noite, tendo ainda passado pela portaria da residência sem se identificar. Ele teria dado apenas o nome de Loures. Janot deduziu que isso mostra a intenção do presidente de manter o encontro em sigilo.

Já a defesa afirma que se tratou de um "fato corriqueiro, normal" e "insignificante", destacando que Joesley é "um dos maiores empresários brasileiros e de todo o mundo" e que Temer "jamais suporia tratar-se também de um criminoso do colarinho branco confesso". Segundo eles, se o presidente tivesse "poderes adivinhatórios" para saber o motivo da visita, "determinaria a sua imediata prisão".

Indicação de Loures por Temer

Conforme mostram as gravações, Loures teria sido indicado por Temer para ser o interlocutor entre Joesley e o Planalto. O nome do presidente é citado diversas vezes nas conversas entre Loures e o executivo da JBS.

A PGR destaca que, levando em conta a magnitude do montante de propina prometido por Joesley, que seria de 38 milhões de reais segundo a acusação de Janot, Loures não teria poder nem autonomia para atuar sem o respaldo do presidente.

A defesa afirma, por sua vez, que Temer nunca autorizou Loures a realizar "tratativas espúrias com quem quer que seja em seu nome". Os advogados argumentam que é fato conhecido que o presidente tinha relação com o ex-assessor e ex-deputado, mas que a PGR deixa entender que se tratava de um "relacionamento marcado por interesses e objetivos escusos".

Valores recebidos

Segundo Janot, o presidente foi o beneficiário de uma mala contendo 500 mil reais em propina entregue em abril por um diretor da JBS, Ricardo Saud, a Loures. O encontro foi filmado pela Polícia Federal. O ex-assessor, que está em liberdade condicional, admitiu ter recebido o dinheiro, mas não disse por que o recebeu nem se ele era para o presidente, como afirmou Joesley.

A defesa de Temer assegura que a acusação se apoia em "meras ilações" para "tentar construir" um "nexo que não existe" entre o mandatário e o dinheiro.

"A infamante acusação vem desprovida de provas. Não se aponta quem entregou para quem; onde ocorreu o encontro para a entrega; qual o dia desse encontro, horário. Enfim, dados fundamentais para que não pairasse a pecha de leviandade e de irresponsabilidade sobre esta malévola atribuição. E esses dados não foram colocados na denúncia simplesmente porque inexistem", afirma a defesa.

EK/abr/dw/ots