Os horrores de Sednaya, "matadouro" do ditador sírio Assad
Johannes Sadek | Weedah Hamzaah DPA
13 de dezembro de 2024
Funcionamento de prisão militar ao norte de Damasco é um dos capítulos mais sombrios da tortura e da matança do regime de Bashar al-Assad. Prisioneiros libertados parecem fantasmas de si mesmos.
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Em uma tentativa de explicar o horror indescritível, os ex-prisioneiros passaram a chamar a prisão militar de Sednaya, na Síria, de "matadouro". Como nenhum outro prédio no país, ela passou a simbolizar o horror absoluto dos tempos do governo do ex-ditador Bashar al-Assad, agora derrubado.
Os oficiais de Assad teriam torturado e matado pessoas nessa e em outras prisões em uma "escala industrial".
Após a ofensiva relâmpago dos insurgentes, liderados pela milícia jihadista Organização para a Libertação do Levante (Hayat Tahrir al-Sham ou HTS), milhares estão sendo libertados de Sednaya. As forças de defesa civil dos Capacetes Brancos estimam que entre 20 mil e 50 mil prisioneiros foram resgatados em um único dia do complexo ao norte da capital síria, Damasco.
Estima-se que até 150 mil pessoas podem ter sido aprisionadas no lugar, e muitas ainda estão desaparecidas.
Com a libertação dessas pessoas, novos detalhes sobre as condições de vida em Sednaya estão sendo revelados. Os Capacetes Brancos temem que entre 50 e 100 pessoas possam ter sido executadas diariamente e depois queimadas em fornos.
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Buscando um "lampejo de esperança"
Para os parentes, começou uma busca febril por pistas sobre parentes presos ou desaparecidos dos quais não têm notícias há anos ou décadas.
Mohammed Abel Asis, por exemplo, veio de Aleppo para Damasco em busca de seu pai. Quando as forças de segurança o prenderam em 2000, Mohammed tinha 7 anos de idade. "Procuramos em vão por um vislumbre de esperança", disse ele à agência de notícias alemã DPA.
Alguns parentes que voltam da prisão de mãos vazias realizam funerais simbólicos e cerimônias de luto para seus entes queridos, que provavelmente nunca mais verão, dizem as testemunhas.
Há também prisioneiros que caminham como fantasmas de si mesmos para uma liberdade inesperada, às vezes depois de décadas na prisão. O canal de notícias Al Jazeera mostrou um homem que não conseguia se lembrar de seu próprio nome, supostamente como resultado de tortura severa.
Outros que foram presos durante a presidência do pai de Bashar al-Assad, Hafez, mal sabem que ele morreu em 2000 e que seu filho assumiu o poder naquela época.
De acordo com o jornal britânico The Guardian, entre os ex-prisioneiros está um ex-piloto que se recusou a bombardear a cidade de Hama durante um levante contra Hafez al-Assad na década de 1980, e que agora foi libertado após 43 anos.
"Assassinatos em escala industrial"
Depois de ver imagens da tortura do desertor sírio "Caesar", o ex-procurador-chefe da ONU, David Crane, comparou os métodos brutais dos oficiais do Exército e das autoridades de segurança de Assad aos do regime nazista. Em 2014, ele falou de "assassinatos em escala industrial".
De acordo com a Anistia Internacional, em Sednaya havia uma sala com 30 forcas para enforcar prisioneiros. Além disso, o governo dos EUA informou que havia um crematório ao lado do prédio principal para queimar cadáveres. O líder dos Capacetes Brancos, Raid al Saleh, também afirma que sua equipe descobriu cadáveres em fornos.
Sobreviventes e ex-guardas contaram à Anistia Internacional sobre a existência de uma prensa humana conhecida como "tapete voador" e um método de tortura, em que as vítimas eram forçadas a se deitar em um pneu de carro com a cabeça entre os joelhos, onde eram espancadas.
Alguns prisioneiros foram estuprados e espancados, outros desenvolveram distúrbios psicóticos e morreram em suas celas. Desde a década de 1970, há prisões na Síria onde membros da oposição desapareciam como em buracos negros.
No passado, o governo de Assad chamou as acusações de infundadas e falsas. No entanto, ativistas de direitos humanos estimam que, somente entre 2011 e 2018, mais de 30 mil prisioneiros foram executados em Sednaya ou morreram como resultado de tortura, negação de cuidados médicos ou fome.
Enquanto isso, a busca continua por celas subterrâneas supostamente escondidas, o que poderia revelar um horror ainda maior.
O mês de dezembro em imagens
Reveja alguns dos principais acontecimentos do mês
Foto: Anas Alkharboutli/dpa/picture alliance
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Trump é a Pessoa do Ano de 2024 da revista "Time"
Publicação cita "volta por cima de proporções históricas" ao justificar escolha e diz que republicano é beneficiário e agente da perda de confiança nos valores liberais. (12/12)
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Por 158 votos favoráveis, órgão que reúne 193 países pediu o fim do conflito entre Israel e o Hamas no território palestino e a libertação imediata de todos os reféns sequestrados por islamistas. Mas diferentemente das votações no Conselho de Segurança, decisão não é juridicamente vinculativa. Conflito em Gaza já dura 14 meses, sem fim à vista. (11/12)
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O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, determinou a obrigatoriedade do uso de câmeras corporais pelos policiais militares do estado de São Paulo. A determinação é uma derrota para o governador Tarcísio de Freitas, que desde a campanha eleitoral se posicionou contra o uso dos equipamentos e vinha tentando propor modelos alternativos. (09/12)
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Bancada por doações, reconstrução de monumento arquitetônico parisiense custou cerca de 700 milhões de euros e demandou o trabalho de cerca de 2 mil especialistas. Construída entre os séculos 12 e 14, catedral quase foi destruída em incêndio de causas desconhecidas. Solenidade foi prestigiada por chefes de governo e de Estado do mundo inteiro. (07/12)
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Foto: EITAN ABRAMOVICH/AFP/Getty Images
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Presidente sul-coreano impõe e depois desiste de lei marcial
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