Para analista, ação deve ter pouco efeito prático na redução de gastos e se trata mais de um gesto simbólico. No entanto, redução gera temor de empresários e críticas de ativistas dos Direitos Humanos.
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Logo após assumir a Presidência interina, Michel Temer anunciou a extinção de nove ministérios, reduzindo o número total de 32 para 23. Em outubro passado, a presidente Dilma Rousseff havia cortado oito pastas para enxugar a máquina pública e poupar até 200 milhões de reais.
Desta vez, a economia deverá ser menor. "É um gesto simbólico para mostrar serviço à iniciativa privada. Não foi um corte de fato, mas uma reorganização", analisa o cientista político David Fleischer, da Universidade de Brasília. O Ministério do Planejamento não revelou o tamanho da redução de gasto esperada.
O novo gabinete gerou desconfiança entre empresários e críticas de ativistas, artistas e pesquisadores. As pastas de Cultura; Comunicações; Desenvolvimento Agrário; e das Mulheres, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos deixaram de existir. Além disso, foram extintas a Controladoria-Geral da União, a Casa Militar e as secretarias de Portos, Aviação Civil e Comunicação Social da Presidência.
Pelo Twitter, Temer justificou o corte de pastas pela necessidade de "restaurar o equilíbrio das contas públicas, trazendo a evolução do endividamento do setor público ao patamar de sustentabilidade".
Ele ainda afirmou que encomendou "estudos para eliminar cargos comissionados desnecessários, sabidamente na casa dos milhares".
"Temer também prometeu reduzir os cargos de confiança, que são 25 mil no Brasil. Mas isso é complicado porque essas posições são cobiçadas por aliados nos estados, e ele vai precisar de uma coalizão forte no Congresso para aprovar as medidas de austeridade dolorosas que propõe", avalia Fleischer.
O analista compara o simbolismo da iniciativa do presidente interino às ações do ex-presidente Fernando Collor à frente da Presidência em 1990.
Collor reduziu os ministérios para 12, extinguiu burocracias, mandou recolher carros oficiais e demitiu funcionários públicos. "Foram todos gestos simbólicos, mas muitos não se mantiveram. Reduzir de fato os cargos comissionados seria, sim, uma mudança radical", acredita Fleischer.
Setores temem desprestígio
Sete meses atrás, a pressão de diferentes parcelas da sociedade impediu o fechamento de ministérios, como a Secretaria de Portos. Desta vez, interlocutores do governo foram pegos de surpresa. A percepção de empresários é que a alocação em outra pasta – no caso, o Ministério de Transportes, Portos e Aviação Civil – tira poder e visibilidade do setor portuário, estratégico para o comércio exterior e a infraestrutura do país.
"Nosso temor é que o setor fique em segundo plano, e isso vai depender de o responsável ter autonomia e vontade política para promover o desenvolvimento", pondera Wilen Manteli, presidente da Associação Brasileira de Terminais Portuários (ABTP). A Secretaria de Aviação Civil, que tinha status de ministério, também foi incorporada pela pasta de Transportes.
Principais momentos do discurso de Temer
04:06
A área de Relações Exteriores passará a cuidar de temas de comércio exterior, antes a cargo do ministério do Desenvolvimento que, por sua vez, mudou de nome para ministério da Indústria, Comércio e Serviços.
Direitos Humanos em segundo plano
As pastas setoriais de Igualdade Racial, Direitos Humanos e Políticas para Mulheres, que já haviam sido fundidas em uma só em 2015, foram relegadas a secretarias. Elas foram acomodadas dentro do renomeado Ministério da Justiça e Cidadania, que será comandado por Alexandre de Moraes. Ele ocupava a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo e é fortemente criticado por movimentos sociais e ativistas dos Direitos Humanos.
"É revoltante a extinção dos ministérios e secretarias que são resultado das reivindicações dos movimentos sociais. Somado a um ministério sem mulheres e negros, já demonstra a quem esse governo vai beneficiar", lamenta Maíra Kubik, professora do departamento de Gênero e Feminismo da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Ela destaca ainda a falta de representatividade e pluralidade no novo gabinete.
Também foi recebida com espanto a incorporação da pasta de Comunicações no intitulado ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações. Para o Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação, que acompanha o debate no setor, a fusão indica que o tema será tratado sob ótica comercial e mercadológica. "Os debates serão ainda mais técnicos e estarão ainda mais à mercê dos grandes grupos econômicos", denunciam em nota.
A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência e mais treze entidades que representam pesquisadores de todo o país também se manifestaram contrárias ao reordenamento de pastas. "É uma medida artificial que prejudicaria o desenvolvimento científico, tecnológico e de inovação do país", avaliam.
Já a Cultura foi engolida pelo ministério da Educação. Enquanto a Controladoria-Geral da União foi rebatizada como ministério da Fiscalização, Transparência e Controle, o que gerou reação entre os membros do órgão.
Os ministros do governo Temer
Gabinete do presidente interino tem nomes conhecidos da política, vários alvos da Justiça e nenhuma mulher. Confira uma minibiografia de cada um deles.
Foto: Geraldo Magela/Agencia Senado
Gilberto Kassab
Ministro das Cidades até abril de 2016 e prefeito de São Paulo por dois períodos, Gilberto Kassab foi escolhido para comandar o Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações. O fundador do Partido Social Democrático (PSD) é réu em processo de improbidade administrativa e foi condenado em 2014 por não pagar precatórios judiciais previstos em leis, mas recorre da decisão.
Foto: Marcelo Camargo/Agencia Brasil
Raul Jungmann
O deputado federal Raul Jungmann (PPS-PE) é o novo ministro da Defesa. Durante o governo Fernando Henrique Cardoso, foi o principal responsável por questões fundiárias, presidindo o Incra e comandando o Ministério de Desenvolvimento Agrário. Jungmann é alvo de ações movidas pelo Ministério Público por improbidade administrativa e por dano ao erário na época que chefiava o Incra.
Foto: Edilson Rodrigues/Agencia Senado
Geddel Vieira Lima
Figura próxima de Temer, Geddel Vieira é o novo ministro-chefe da Secretaria de Governo. Em sua carreira política, foi deputado federal por cinco mandatos consecutivos, além de ministro da Integração Nacional no segundo mandato de Lula. O peemedebista é investigado na Operação Lava Jato e, em 2014, foi condenado por realizar propaganda eleitoral irregular.
Foto: Valter Campanato/Agencia Brasil
Bruno Araújo
Sem experiência ministerial, o deputado federal Bruno Araújo (PSDB-PE) foi escolhido para comandar o Ministério das Cidades. Responsável por proferir o voto que selou a votação do impeachment na Câmara, o parlamentar teve seu nome citado na lista da Odebrecht, apreendida pela Polícia Federal, que mostra centenas de políticos que receberam doações da empreiteira.
Foto: Gustavo Lima/Camara dos Deputados
Blairo Maggi
Ex-governador do Mato Grosso, o senador Blairo Maggi (PR-MT) assume o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Dono do grupo que é um dos principais exportadores de soja do país, é considerado por ambientalistas um dos grandes promotores do desmatamento. Maggi é alvo de inquérito que apura lavagem de dinheiro e também de ações do Ministério Público por improbidade administrativa.
Foto: Geraldo Magela/Agencia Senado
Henrique Meirelles
O novo ministro da Fazenda foi eleito deputado federal pelo PSDB em 2002, mas abriu mão de assumir a cadeira quando foi chamado pelo então presidente Lula para presidir o Banco Central – ele permaneceu no cargo entre 2003 e 2011. Atualmente, Meirelles vinha presidindo o Conselho de Administração da holding J&F, que controla a empresa de alimentos JBS.
Foto: Antonio Cruz/ABr
Mendonça Filho
O deputado federal assume o Ministério da Educação e Cultura. Ex-governador de Pernambuco – depois da renúncia do titular Jarbas Vasconcelos –, Mendonça Filho (DEM-PE) é parte em processos relacionados a contas eleitorais de seu partido e está entre as centenas de políticos citados na lista da Odebrecht, apreendida pela Lava Jato.
Foto: Gustavo Lima/Camara dos Deputados
Eliseu Padilha
Novo ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha comandou o Ministério dos Transportes no governo FHC e a Aviação Civil durante a gestão Dilma. Pediu demissão um dia antes de o deputado Eduardo Cunha aceitar o pedido de impeachment da presidente petista. Indiciado por formação de quadrilha em 2011, Padilha foi recentemente citado na delação de Delcídio do Amaral.
Foto: Wilson Dias/Agencia Brasil
Osmar Terra
Sem experiência ministerial, Osmar Terra é deputado federal (PMDB-RS) e agora assume o Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário, responsável pelo Bolsa Família. Também citado na lista da Odebrecht, o político teve suas contas contestadas pelo TCE quando chefiava a Secretaria Estadual da Saúde do Rio Grande do Sul.
Foto: Viola Jr/Camara dos Deputados
Leonardo Picciani
Também sem experiência ministerial, o deputado federal Leonardo Picciani (PMDB-RJ) foi escolhido para comandar o Ministério do Esporte. Aos 36 anos, ele está em seu quarto mandato na Câmara e ocupa o posto de líder da bancada do PMDB da Casa. Picciani é alvo de representação (sob segredo de Justiça) por captação e gastos ilícitos na campanha de 2014, com pedido de cassação de diploma.
Foto: Agência Brasil/J. Cruz
Ricardo Barros
Novo ministro da Saúde, o deputado federal Ricardo Barros (PP-PR) não tem experiência comandando ministérios, mas foi secretário de Indústria e Comércio e Assuntos do Mercosul no Paraná. Também citado na lista da Odebrecht, Barros foi condenado por fraude em venda de equipamentos e por danos causados aos cofres públicos referentes ao período em que foi prefeito de Maringá.
Foto: Antonio Cruz/Agencia Brasil
José Sarney Filho
Filho do ex-presidente José Sarney, o deputado federal (PV-MA) assume o Ministério do Meio Ambiente. No governo tucano, foi ministro da mesma pasta entre 1999 e 2002. No passado, Sarney Filho chegou a ser condenado ao pagamento de uma multa em representação movida pelo Ministério Público Eleitoral por prática de conduta vedada.
Foto: Agência Brasil/M. Camargo
Henrique Alves
Figura muito próxima a Temer, Henrique Alves foi escolhido para o Ministério do Turismo. Foi ministro da pasta durante o governo Dilma, mas renunciou ao cargo duas semanas antes da aprovação do processo de impeachment pelo Senado. Alves foi deputado federal pelo Rio Grande do Norte por 11 mandatos consecutivos, chegando à presidência da Câmara. Ele é investigado pela Operação Lava Jato.
Foto: Tomaz Silva/Agencia Brasil
José Serra
Novo ministro da Relações Exteriores, o senador José Serra (PSDB-SP) comandou o Ministério da Saúde no governo FHC e foi prefeito e governador de São Paulo, sendo derrotado nas eleições presidenciais de 2002 e 2010. É alvo de ação civil pública por improbidade administrativa de quando era ministro tucano, e teve seu nome associado ao escândalo das licitações no transporte público paulista.
Foto: Moreira Mariz/Agencia Senado
Ronaldo Nogueira
Com breve carreira política, o deputado federal Ronaldo Nogueira (PTB-RS) foi escolhido por Temer para chefiar o Ministério do Trabalho. Administrador por formação, ele exercia seu primeiro mandato na Câmara quando foi convidado pelo vice-presidente. Nogueira teve reprovadas as contas referentes à campanha eleitoral de 2014.
Foto: Lucio Bernardo Junior/Câmara dos Deputados
Alexandre de Moraes
O advogado e consultor jurídico Alexandre de Moraes, ligado ao PSDB, ocupava a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo quando foi escolhido para assumir o Ministério da Justiça e Cidadania. Teve carreira de destaque no Ministério Público paulista, tendo chegado ao posto de procurador-geral da Justiça. Moraes atuou como advogado do deputado Eduardo Cunha.
Foto: Elza Fiuza/Agencia Brasil
Maurício Quintella Lessa
Quem assume o Ministério dos Transportes, Portos e Aviação Civil é o deputado federal Mauricio Quintella (PR-AL), ex-líder do partido na Câmara. O político foi condenado em 2014 por ter participado, enquanto secretário de Educação de Alagoas, de um esquema que desviou dinheiro destinado ao pagamento de merenda escolar. Quintella foi multado pela Justiça em 4,2 milhões de reais.
Foto: Agência Brasil/J. Cruz
Fabiano Augusto Martins Silveira
O advogado foi escolhido para comandar o Ministério da Fiscalização, Transparência e Controle, recém-criado por Temer para substituir a Controladoria-Geral da União. Fabiano Augusto Martins Silveira é doutor em Direito e conselheiro no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) pelo segundo mandato, além de consultor legislativo do Senado Federal desde 2002.
Foto: Geraldo Magela/Agencia Senado
Fábio Osório Medina
O substituto de José Eduardo Cardozo no comando da Advocacia-Geral da União é Fábio Osório Medina. Advogado e professor, ele é ex-promotor de Justiça do Rio Grande do Sul e especializado em leis sobre combate à corrupção. No início de maio, Medina foi um dos convidados pela oposição para falar em sessão da comissão especial do impeachment no Senado.
Foto: Marcelo Camargo/Agencia Brasil
Sérgio Etchegoyen
O novo ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional de Temer é chefe do Estado-Maior do Exército (EME) desde março de 2015. Assinou, junto a outros familiares, uma carta em que critica a Comissão Nacional da Verdade – o pai de Etchegoyen foi denunciado por graves violações aos direitos humanos durante o regime militar brasileiro.
Foto: cc-by-Neal Snyder/US Army
Marcos Pereira
Bispo da Igreja Universal do Reino de Deus e ex-executivo da rede Record de Televisão, Marcos Pereira é o novo ministro da Indústria, Comércio e Serviços. Cotado para a Ciência e Tecnologia, o evangélico enfrentou forte resistência entre acadêmicos. O presidente do Partido Republicano Brasileiro (PRB) é advogado e foi sócio de escritórios de contabilidade e advocacia.
Foto: Imago
Fernando Coelho Filho
Deputado federal há três mandatos com apenas 32 anos, o novo ministro de Minas e Energia Fernando Coelho Filho (PSB-PE) é herdeiro político do senador Fernando Bezerra Coelho, seu pai, que ocupou a pasta de Integração Nacional no governo Dilma e está sob investigação na operação Lava Jato. Foi o mais jovem parlamentar eleito no Brasil, com apenas 22 anos.
Foto: Agencia Brasil/M. Camargo
Helder Barbalho
À frente da cobiçada pasta de vasto orçamento e impacto na região Nordeste está outro herdeiro político, filho de Jader e Elcione Barbalho. O novo ministro da Integração Nacional Helder Barbalho (PMDB-PA) comandou a Secretaria de Portos do governo Dilma até abril. Também foi secretário da Pesca e Aquicultura. Na saída, afirmou acreditar na inocência da presidente.
Foto: picture-alliance/dpa/A. Lacerda
Dyogo Oliveira
O economista ocupou vários cargos no Ministério da Fazenda, desde 2006, até chegar a secretário-executivo. Mais tarde, assumiu a posição equivalente no Planejamento. Ele se manteve no cargo durante o governo interino. É citado em investigações da Operação Zelotes e teve seus sigilos bancário e fiscal entre 2008 e 2015 quebrados a pedido do Ministério Público Federal.
Foto: Agência Brasil/J. Cruz
Marcelo Calero
O posto foi recriado seis dias após ser extinto no primeiro dia do governo interino. Marcelo Calero é formado em direito, trabalhou na Petrobras, em empresas privadas e no setor de energia do Itamaraty. Candidatou-se a deputado federal pelo PSDB-RJ em 2010, mas não foi eleito. Foi secretário municipal de Cultura do Rio de Janeiro de 2013 até assumir o ministério.
Foto: Agência Brasil/ V. Campanato
Romero Jucá
Foi ministro do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão por 11 dias no governo interino. Senador do PMDB, ele teve uma conversa gravada, em que defendia uma mudança de governo para "estancar a sangria" de políticos citados na Lava Jato. Foi líder dos governos FHC, Lula e Dilma no Congresso e é investigado por formação de quadrilha, além de ter seu nome envolvido na Operação Zelotes.