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Os mercenários do futebol globalizado

Geraldo Hoffmann20 de junho de 2005

México e Alemanha têm as seleções mais nacionais da Copa das Confederações. Ações dos "estrangeiros" em seleções como a do Brasil são cotadas em Madri, Londres, Milão ou Munique.

México tem o time mais 'nacional' do torneio intercontinentalFoto: AP

Houve um tempo em que a equipe que um país mandava para torneios internacionais de futebol era realmente uma seleção dos melhores jogadores do respectivo campeonato nacional. Mas os tempos mudaram. Prova disso foram as últimas Copas do Mundo e é também a Copa das Confederações, que está sendo disputada de 15 a 29 de junho na Alemanha.

Quase dois terços (117) dos 184 jogadores convocados para as oito seleções que disputam o torneio são "estrangeiros" para seus próprios treinadores, isto é, não atuam em times do país de origem. E três técnicos, os do Japão, México e Tunísia, também são "estrangeiros". México e a Alemanha são exceções: têm as seleções mais "nacionais" da competição.

O índice de globalização das equipes não necessariamente tem relação direta com o desempenho em campo, mas é no mínimo um aspecto curioso para análises. Jogam nos campeonatos nacionais, no México, 21 dos 23 jogadores da seleção; na Alemanha (20), Grécia (9), Brasil (5), Japão (5), Tunísia (5), Argentina (1), Austrália (1).

Microcosmo

Sobretudo o México forma um microcosmo no mundo do futebol globalizado. Apenas dois jogadores da "tricolor" atuam no exterior: o zagueiro Márquez (Barcelona) e o meia Gerardo (Racing Santander), ambos na Espanha. Em compensação, o técnico é importado: o argentino Ricardo Antonio La Volpe.

A explicação parece simples: o campeonato mexicano é financeiramente sólido, sustentado por grandes grupos empresariais. Paga salários tão bons que já atraiu cerca de 100 "estrangeiros", entre eles, 30 argentinos, prestes a ameaçar o fomento de novos talentos nacionais para a seleção.

No caso da Alemanha, a Bundesliga é igualmente um mercado atraente, razão porque os alemães não saem do país – apenas o goleiro Lehmann (Arsenal), o zagueiro Huth (Chelsea) e o meia Hitzlsperger (Aston Villa) ganham seus salários no futebol inglês.

No outro extremo, na seleção da Argentina, apenas o goleiro Lux ainda joga no River Plate; outros 21 jogadores do elenco nacional atuam na Europa, o atacante Tevez está no Corinthians.

Já os jogadores da seleção australiana estão espalhados por três continentes – apenas o atacante Zdrillic atua na recém criada liga nacional. A maior concentração de "cangurus" fora da Austrália é registrada no futebol inglês, mas tem australiano jogando também na Turquia, Romênia, Suíça e até na Coréia do Sul.

A Grécia tem por assim dizer um time misto: nove "nacionais" contra 14 estrangeiros. O resultado não é lá muito animador: a campeã da Eurocopa 2004 já foi eliminada da Copa das Confederações. Nas equipes do Brasil, Japão e da Tunísia, os "nacionais" são minoria.

Homogeneidade

A globalização gera uma certa homogeneidade tática e técnica do futebol e tende a roubar um pouco da sua imprevisibilidade. O jogo dá lugar a um enorme esquema de marketing, onde tudo é calculado, previsível. Como é que Ballack ou Schweinsteiger (da seleção alemã) ainda poderiam surpreender Lúcio e Zé Roberto na zaga brasileira, depois de treinarem durante anos juntos no Bayern de Munique?

A presença de mercenários do futebol na Copa das Confederações gera ainda outras situações curiosas. Assim o paulista Zinha ajudou o México a derrotar a seleção canarinho no domingo (19/06) em Hannover. Na quarta-feira (22/06), o técnico Zico e o zagueiro brasileiro Alex, do Japão, enfrentam o Brasil em Colônia.

Os brasileiros Francileudo dos Santos e Clayton fazem parte da base da seleção tunisiana, comandada pelo francês Roger Lemerre. O ataque alemão também é quase todo naturalizado: Podolski e Klose (nascidos na Polônia), Asamoah (de Gana) e Kuranyi (do Rio de Janeiro).

Dor de cotovelo

Patriotismo à parte, às vezes tem-se a impressão de que os "estrangeiros" (sobretudo os milionários) entram em campo encarangados pelo peso do dinheiro no bolso. Suar a camisa pela seleção do país de origem parece ser apenas um fardo inevitável para manter as ações em alta nas direções dos grandes clubes em Madri, Londres, Milão ou Munique.

Só assim se explica também o fato de que Ronaldo pode se dar o luxo de ficar curando uma dor de cotovelo em casa, durante a Copa das Confederações, sem precisar temer a perda de sua vaga na seleção para a Copa 2006. Quem ousaria arrancar a número 9 do peito de quem tem a Nike nas costas?

11 minutos valem 10 anos

Mas há uma história de "mercenário do futebol" que dá o que pensar. Tim Cahill, o número 10 da Austrália, só pôde se tornar campeão da Oceania e vir para a Copa das Confederações por clemência da Fifa. É que em 1994, de férias nas Ilhas Samoa (179ª no ranking da Fifa), ele atuou 11 minutos pela seleção Sub-17 local. Isso foi suficiente para que a entidade máxima do futebol o proibisse por dez anos de atuar pela seleção australiana.

Se essa regra fosse aplicada a todos jogadores que atuam em clubes fora de seus países de origem, alguns jogos no torneio intercontinental na Alemanha seriam reduzidos a "peladas" entre gandulas.

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