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Os números sobre a pandemia de coronavírus

Anna Carthaus as/av
20 de março de 2020

Quem acompanha as notícias sobre a disseminação da covid-19 já deve ter esbarrado em conceitos e números nem sempre claros ou conhecidos. A DW apresenta um resumo dos principais e mais úteis.

Ilustração representa o novo coronavírus, batizado de Sars-Cov-2
Ilustração representa o novo coronavírus, batizado de Sars-Cov-2Foto: picture-alliance/dpa/ZUMA Wire/Cdc

O número básico de reprodução indica o potencial de disseminação de um vírus. Se ela for maior do que 1, uma pessoa infectada passa a doença a pelo menos mais uma pessoa – ou seja, o vírus se propaga. Se for menor do que 1, isso significa que cada vez menos pessoas são infectadas, e o número total de contaminados diminui.

Ou seja, para restringir a propagação de um vírus, seu número básico de reprodução deve ser menor do que 1.

O Instituto Robert Koch, que monitora doenças infecciosas na Alemanha, calcula que o número básico de reprodução do Sars-Cov-2 esteja entre 2,4 e 3,3. Ou seja, cada doente infecta de dois a três outros indivíduos.

Dito de outra maneira: para ter a epidemia sob controle, é necessário impedir cerca de dois terços das infecções. Como ainda não há vacina nem proteção eficazes disponíveis, é provável que de 60% a 70% da população de um país seja infectada. Aí o número de infectados será maior do que o de não infectados, e o vírus não conseguirá mais avançar.

O tempo de incubação é o tempo que leva da infecção até os primeiros sintomas aparecerem. No caso do novo coronavírus, o tempo de incubação vai de 5 a 6 dias, em média, mas pode abarcar de 1 a 14 dias.

O período de contágio o tempo durante o qual alguém contaminado pode transmitir a doença. No caso do coronavírus, isso ainda não está claro. No momento, parte-se do princípio que um infectado pode começar a infectar outras de 24 a 48 horas antes de manifestar os primeiros sintomas. Cientistas chineses supõem que em um quarto de todas as infecções os que contagiam ainda não apresentaram qualquer sintoma.

Depois que os sintomas aparecem, o paciente é contagiosa de 7 a 12 dias, em caso de sintomas leves, e até mais de duas semanas, nos casos mais graves. O vírus é transmitido através de gotículas de saliva ou muco, expelidos pela boca ou narinas quando o portador tosse ou espirra.

Se o vírus vem de regiões mais profundas do pulmão, ele permanece mais tempo ativo, ou seja: muco é pior do que saliva. A transmissão também pode ocorrer através de partículas virais transferidas ao apertar as mãos ou compartilhar um objeto, como por exemplo beber do mesmo copo que um portador do vírus. Atualmente considera-se improvável a transmissão por matéria fecal.

A razão caso-fatalidade (CFR, na sigla em inglês) indica o risco que alguém infectado por Sars-Cov-2 tem de morrer da doença. Mas não é fácil calculá-la para a atual pandemia de coronavírus, por vários motivos.

Em primeiro lugar, a CFR depende sempre do contexto, da época e do local onde o vírus se propaga. Em casos como a China, Itália ou Estados Unidos, o Sars-Cov-2 se dissemina em países onde o sistema de saúde está preparado e equipado de formas diferentes, afetando diferentes faixas etárias, pacientes com diferentes históricos de doenças e onde a convivência social é diferente.

Todos esses fatores (e muitos outros) acabam determinando o grau de suscetibilidade de uma população ao vírus. Por isso não é possível simplesmente transpor e comparar números.

Além disso, a CFR é fortemente influenciada pelo "recorte" no tempo considerado no seu cálculo. Se o número de todos os mortos for dividido pelo número de todos os doentes no primeiro dia da epidemia, quando o número de doentes será alto, e o de mortos proporcionalmente baixo, haverá uma taxa de mortos por infectados baixa e enganosa. Isso pôde ser observado no início da pandemia na China.

Por outro lado, parte-se do princípio que muitos contágios não são conhecidos ou não foram registrados. Nesse o número de mortos é desproporcionalmente elevado em relação ao número de doentes, como aconteceu no Irã.

Idealmente, a CFR de um grupo populacional deve ser calculada considerando o período que vai do aparecimento dos sintomas até a cura ou morte dos indivíduos afetados. Para ser precisa, todas as infecções devem ter sido registradas, e o período total de desenvolvimento da doença ser considerado em todos os casos de infecção. Na prática, isso é muito difícil.

Um dos maiores especialistas no assunto, o matemático e epidemiologista Adam Kucharski, da London School of Hygiene and Tropical Medicine, calcula que a CFR real do novo coronavírus é de 0,5% a 2% – de 100 doentes, 1 ou até 2 morrem.

O número real das infecções não é conhecido. A Organização Mundial da Saúde (OMS), a Universidade John Hopkins e o Instituto Robert Koch, entre outras instituições, divulgam diariamente os casos confirmados de infecções pelo novo coronavírus, mas somente os confirmados. Estes dão apenas uma noção das dimensões reais da epidemia e da rapidez com que o vírus se propaga, e obviamente dependem do número dos que se submetem a um teste ou de quantos exames estão disponíveis num país.

O número de mortos ajuda a dar uma ideia de quantos estão de fato infectados. O matemático Tomas Götz, da Universidade Koblenz-Landau, projetou, com base no número de mortos, que haveria 40 mil casos do novo coronavírus na Itália no fim de fevereiro – 50 vezes mais do que o total confirmado na época, de 800 casos.

Mas não é possível simplesmente transpor o cálculo para a Alemanha, por exemplo, pois, segundo Götz, o "atual número de mortos é extremamente baixo na comparação internacional". Além disso, faltam na Alemanha dados sobre o número de casos que estão sendo tratados nos hospitais.

Para um cidadão comum, é difícil entender ou visualizar um crescimento não linear. O crescimento linear é simples de entender: hoje o valor é 1, amanhã é 2, em uma semana são 7. Ou 1, 4, 14. Mas um vírus não se propaga dessa forma, pois um doente infecta duas pessoas, que também infectam duas cada uma, e estas quatro por sua vez também infectam duas cada uma, no total de oito.

O conhecido truque matemático dos grãos de trigo num tabuleiro de xadrez dá uma boa ideia do que é crescimento linear e crescimento exponencial. Num crescimento linear com diferença 1, haveria 1 grão na primeira casa no primeiro dia, 2 grãos na segunda casa no segundo dia e assim por diante, até se chegar a 64 grãos no 64º dia, na última casa.

Se o crescimento for exponencial, e dobrar a cada casa, haveria 1 grão na primeira casa no primeiro dia, 2 grãos na segunda casa no segundo, e em seguida 4, 8, 16, 32 e 64 já no sétimo dia, na sétima casa. No 64º dia seriam inacreditáveis 9.223.372.036.854.775.808 grãos de trigo na última casa.

Para acompanhar a propagação de um vírus, é útil observar sua velocidade de duplicação. No caso do coronavírus, ele precisa de cada vez menos tempo para duplicar o número de infectadas. Quando essa velocidade diminui, o número de infectados cai.

Kucharski desenvolve modelos para doenças infecciosas, com o objetivo de entender melhor sua propagação. Esse conhecimento pode auxiliar especialistas em saúde e governantes a tomarem decisões para impedir o avanço de um vírus. Ele já criou modelos para o ebola, a Sars e a gripe, e agora trabalha em um para a covid-19.

Em seu livro As regras do contágio: Por que as coisas se disseminam – e por que elas param, ele lista quatro parâmetros que descrevem o potencial contagioso de uma doença: Duração, Oportunidade, probabilidade de Transmissão e Suscetibilidade. Em inglês, elas formam a sigla DOTS (em português: pontos).

D é o tempo que uma portador pode infectar outros. O é o número de indivíduos com que um infectado entra em contato, durante todos os dias em que está doente. T é a chance de uma transmissão ocorrer durante uma interação entre duas pessoas. Suscetibilidade é a chance de alguém saudável adoecer em consequência do contágio.

Multiplicados, esses quatro parâmetros resultam no número básico de reprodução, denominado R. Todos os quatro podem ser influenciados para impedir o avanço de um vírus. Geralmente o melhor meio são vacinas, que zeram o parâmetro S. Como ainda não há uma para o Sars-Cov-2, resta mexer nos três parâmetros D, O e T, com medidas como isolar os doentes, evitar contatos sociais, e lavar as mãos e espirrar na dobra do braço ou num lenço de papel, que deve ser imediatamente descartado.

O objetivo, no momento, é "aplanar a curva", para que o número de doentes não sobrecarregue o sistema de saúde, forçando os médicos a ter que decidir quem receberia tratamento e quem não.

Mas por que o percentual de mortos é tão diferente de um país para o outro? Por que a Itália já chegou ao seu limite, enquanto a Alemanha, com um número semelhante de casos confirmados, tem bem menos mortos?

Os economistas Moritz Kuhn e Christian Bayer tentaram encontrar uma resposta a essas perguntas. Dados mostram que a mortalidade aumenta com a idade dos infectados. Os economistas partem da premissa de que as chances de se contaminar são maiores no ambiente de trabalho.

Há diversos modelos de como as sociedades são estruturadas. Cidadãos de diferentes gerações podem viver separados (como no país A) ou juntos (como no país B). Os economistas concluíram que a CFR aumenta à medida que aumenta o número dos que trabalham e moram juntos com os pais, ou seja, quanto maior o contato entre as gerações. Se essa teoria for verdadeira, Índia, Taiwan e Tailândia são países particularmente ameaçados, e, na Europa, Sérbia e Polônia.

Mas essa tendência não pôde ser verificada nos países asiáticos. Bayer supõe que haja a influência de outros fatores, como padrões de limpeza e formas de convívio social.

A conclusão: é preciso repensar os contatos sociais em tempos de propagação de um vírus, em especial o contato entre gerações mais jovens e mais idosas.

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