Em três anos, operação foi marcada pela divulgação de provas e acusações que estavam sob sigilo. Muitas tiveram grande impacto político.
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O episódio da condução coercitiva do blogueiro de esquerda Eduardo Guimarães e a divulgação de nomes da segunda lista de Janot são novos capítulos da novela de vazamentos que contornam o sigilo de vários procedimentos da operação Lava Jato. Confira abaixo alguns dos vazamentos que marcaram a operação, que completou três anos neste mês:
Setembro de 2014 - Depoimento de Paulo Roberto Costa
A revista Veja publicou reportagem informando que Paulo Roberto Costa, ex-diretor de Refino e Abastecimento da Petrobras, revelou em depoimentos ao Ministério Público Federal (MPF) que três governadores, seis senadores, um ministro e, pelo menos, 25 deputados federais foram beneficiados com pagamentos de propinas. O caso irritou o então governo Dilma Rousseff, que classificou o episódio como uma tentativa de influenciar as eleições.
Outubro de 2015 - As contas de Eduardo Cunha
A imprensa publicou indícios de que o então presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB), recebeu propina por meio de contas na Suíça. A acusação contradisse um depoimento dado por Cunha à CPI da Petrobras em que ele negou ter contas no exterior. O peemedebista já vinha acusando o Ministério Público de orquestrar vazamentos seletivos contra ele. Não seria a última vez que Cunha faria a reclamação.
Novembro de 2015 - Delação de Cerveró
Uma gravação feita pelo filho de Nestor Cerveró apontou que trechos da delação premiada do ex-diretor da Petrobras estavam em poder do banqueiro André Esteves, dono do BTG Pactual, que temia que o envolvimento do seu banco com desvios na Petrobras fosse revelado. Na gravação, o filho de Cerveró, o ex-senador Delcídio do Amaral e um advogado discutem quem pode ter vazado o documento.
Fevereiro de 2016 - Mandados contra Lula
O blogueiro pró-PT Eduardo Guimarães, do Blog da Cidadania, publicou que o ex-presidente Lula teve o sigilo bancário quebrado pela Operação Lava Jato. O blog também afirmou que o petista ia ser alvo de um mandado de busca e apreensão, algo que efetivamente ocorreu uma semana depois. Procuradores reclamaram da publicação e falaram que o vazamento foi prejudicial. Também ameaçaram processar os responsáveis pelo vazamento. Em marco de 2017, Guimarães foi conduzido coercitiva mente para a PF para confirmar o nome de sua fonte.
Março de 2016 - A delação de Delcídio do Amaral
A revista Istoé publicou uma edição com a delação do ex-senador Delcídio Amaral (ex-PT). No documento, o ex-líder do governo Dilma Rousseff implicava o ex-presidente Lula em uma tramoia para comprar o silêncio de um ex-diretor da Petrobras que ameaçava colaborar com a Justiça. Delcídio também acusou Dilma de agir para proteger pessoas envolvidas nos desvios da Petrobras. A publicação da reportagem irritou o então relator da Lava Jato no Supremo Tribunal Federal, Teori Zavascki. O episódio acabou resultando em pressão para que o ministro homologasse logo a delação e ajudou a desmoralizar ainda mais o governo Dilma.
Março de 2016 - A superlista da Odebrecht
A imprensa publicou uma lista de 200 políticos de 18 partidos que teriam sido beneficiados com recursos da Odebrecht As planilhas foram apreendidas durante a 23.ª fase da investigação que teve como alvo o casal de marqueteiros João e Mônica Santana. Após a publicação, o juiz Sérgio Moro determinou que a lista fosse colocada em sigilo em função de nela constarem pessoas com foro privilegiado.
Agosto de 2016 - Citação de Dias Toffoli
A revista Veja publicou reportagem em que aponta que o nome do ministro Dias Toffoli, do STF, foi citado por delatores da empreiteira OAS. O vazamento levou a suspensão das negociações do acordo de delação. O caso levou outro ministro do STF, Gilmar Mendes, a defender uma investigação sobre os próprios investigadores da Lava Jato.
Setembro de 2016 - Ministro da Justiça fala demais.
O então ministro da Justiça Alexandre Moraes fez uma "insinuação" de que a Operação Lava Jato teria novos desdobramentos para uma plateia de ativistas antipetistas em Ribeirão Preto (SP). "Esta semana vai ter mais", disse. Um dia depois, o ex-ministro Antonio Palocci, um político petista de Ribeirão, foi preso pela operação. O caso levou a questionamentos sobre o monitoramento da operação por figuras do governo de Michel Temer.
Dezembro de 2016 - A primeira delação da Odebrecht
No início de dezembro, jornais publicaram a delação do ex-executivo da Odebrecht, Cláudio Melo Filho. No documento, Melo fez acusações contra o ministro Eliseu Padilha, um dos homens de confiança de Michel Temer, afirmando que ele era um arrecadador de recursos do PMDB. Melo também afirmou que o próprio Temer pediu recursos para a Odebrecht. O procurador-geral, Rdorigo Janot, afirmou que iria investigar o vazamento.
Março de 2017 - A segunda lista de Janot
Vários nomes da "segunda lista de Janot" foram publicados pelos principais veículos de imprensa brasileiros. A lista consiste em pedidos de inquérito feitos pela PGR com base nas delações da Odebrecht. Entre eles estão seis ministros do governo Temer, os ex-presidentes Lula e Dilma, e vários senadores do PSDB. Segundo a ombudsman do jornal Folha de S.Paulo, os nomes foram vazados por procuradores em uma espécie de "coletiva de imprensa em off" para jornalistas. Janot negou a acusação.
Entenda a Operação Lava Jato
A Polícia Federal apura, desde 2014, um esquema bilionário de lavagem e desvio de dinheiro envolvendo a Petrobras, grandes empreiteiras e políticos. Entenda a maior investigação sobre corrupção já conduzida no país.
Foto: AFP/Getty Images
O início
A Operação Lava Jato foi deflagrada pela Polícia Federal em 17 de março de 2014. Começou investigando um esquema de desvio de recursos públicos e lavagem de dinheiro e descobriu a existência de uma imensa rede de corrupção envolvendo a Petrobras, grandes empreiteiras do país e políticos. O nome vem de um posto de gasolina em Brasília, um dos alvos da PF no primeiro dia de operação.
Foto: picture-alliance/dpa/M. Brandt
O esquema
Executivos da Petrobras cobravam propina de empreiteiras para, em troca, facilitar as negociações dessas empresas com a estatal. Os contratos eram superfaturados, o que permitia o desvio de verbas dos cofres públicos a lobistas e doleiros, os chamados operadores do esquema. Eles, por sua vez, eram encarregados de lavar o dinheiro e repassá-lo a uma série de políticos e funcionários públicos.
Foto: Reuters/S. Moraes
As figuras-chave
O esquema na Petrobras se concentrava em três diretorias: de abastecimento, então comandada por Paulo Roberto Costa; de serviços, sob direção de Renato Duque; e internacional, cujo diretor era Nestor Cerveró. Cada área tinha seus operadores para distribuir o dinheiro. Um deles era o doleiro Alberto Youssef (foto), que se tornou uma das figuras centrais da trama. Todos os citados foram condenados.
Foto: imago/Fotoarena
As empreiteiras
As grandes construtoras do país formaram uma espécie de cartel: decidiam entre si quem participaria de determinadas licitações da Petrobras e combinavam os preços das obras. Os executivos da estatal, por sua vez, garantiam que apenas o cartel fosse convidado para as licitações. Entre as empresas investigadas estão Odebrecht, Andrade Gutierrez e Camargo Corrêa. Vários executivos foram condenados.
Foto: Reuters/P. Whitaker
Os políticos
O núcleo político era formado por parlamentares de diferentes partidos, responsáveis pela indicação dos diretores da Petrobras que sustentavam a rede de corrupção dentro da estatal. Os políticos envolvidos recebiam propina em porcentagens que variavam de 1% a 5% do valor dos contratos, segundo os investigadores. O dinheiro foi usado, por exemplo, para financiar campanhas eleitorais.
Foto: J. Sorges
De Cunha a Dirceu...
A investigação só entrou no mundo político em 2015, quando a Lava Jato foi autorizada a apurar mais de 50 nomes, entre deputados, senadores e governadores de vários partidos. Desde então, viraram alvo de investigação políticos como os ex-parlamentares Eduardo Cunha (foto) e Delcídio do Amaral, ambos cassados, os senadores Renan Calheiros, Fernando Collor e o ex-ministro José Dirceu.
Foto: Reuters/A. Machado
... e Lula
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva é réu em dez processos relacionados à Lava Jato, sendo acusado pelos crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e obstrução da Justiça. As denúncias indicam que Lula teria recebido benefícios das empreiteiras OAS e Odebrecht, envolvendo imóveis no Guarujá e São Bernardo do Campo. Em 2018, ele foi preso e teve uma nova candidatura à Presidência barrada.
Foto: picture-alliance/AP Photo/F. Dana
As prisões
A Lava Jato quebrou tabus no Brasil ao encarcerar altos executivos de empresas e importantes figuras políticas. Entre investigados e aqueles já condenados pela Justiça, estão o executivo Marcelo Odebrecht, ex-presidente da Odebrecht; Eduardo Cunha, ex-presidente da Câmara; Sérgio Cabral, ex-governador do Rio; os ex-ministros José Dirceu (foto) e Antonio Palocci, entre outros.
Foto: picture-alliance/dpa/EPA/H. Alves
As delações
Os acordos de delação premiada são considerados a força-motriz da operação. Depoimentos como o de Marcelo Odebrecht (foto) chegam com potencial para impactar fortemente a investigação. O acordo funciona assim: de um lado, os delatores se comprometem a fornecer provas e contar o que sabem sobre os crimes, além de devolver os bens adquiridos ilegalmente; de outro, a Justiça reduz suas penas.
Foto: Getty Images/AFP/H. Andrey
O juiz
Responsável pela Lava Jato na 1° instância, o ex-juiz federal Sergio Moro logo ganhou notoriedade. Em manifestações, foi ovacionado pelo povo e chegou a ser chamado de "herói nacional". Mas também foi acusado de agir com parcialidade política. Em 2018, deixou o cargo e aceitou ser ministro do presidente Jair Bolsonaro, cuja candidatura foi beneficiada pela prisão de Lula no ano anterior.
Foto: Getty Images/AFP/E. Sa
Expansão internacional
Se começou num posto de gasolina em Brasília, a Lava Jato ganhou proporções internacionais com o aprofundamento das investigações. Segundo dados do Ministério Público Federal levantados a pedido da DW Brasil, a investigação já conta com a cooperação de pelo menos outros 40 países (veja no gráfico acima). Além disso, 14 países, fora o Brasil, investigam práticas ilegais promovidas pela Odebrecht.
Um terremoto político
Ao longo de cinco anos, a Lava Jato influenciou o impeachment de Dilma Rousseff, enfraqueceu o governo Michel Temer e contribuiu para a derrocada de velhos caciques do PT, MDB e PSDB. Em 2018, Lula, então favorito para vencer as eleições presidenciais, foi preso e teve a candidatura barrada. As investigações também fortaleceram um discurso antissistema que beneficiou a campanha de Bolsonaro.
Foto: picture-alliance/dpa/ZUMAPRESS/C.Faga
Críticas e revelações
A Lava Jato também acumulou acusações de parcialidade e de abusos em seus métodos. Em 2019, os procuradores da força-tarefa foram duramente criticados por tentarem criar uma fundação para gerenciar uma multa bilionária da Petrobras. No mesmo ano, conversas reveladas pelo site "The Intercept" apontaram suspeita de conluio entre Moro e os procuradores na condução dos processos, o que é proibido.