Nenhum negro havia sido indicado para as principais categorias do Oscar em 2016. Neste ano, após uma série de mudanças na Academia de Cinema, há 18 candidatos.
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Várias instituições culturais dos Estados Unidos estão enfrentando questionamentos sérios: quem são os membros desses comitês que decidem os prêmios? Essas pessoas realmente representam os artistas e a sociedade?
Apelos por mais diversidade não são novidade, mas eles se tornaram mais urgentes na sequência da última premiação do Oscar. Depois de mais um ano de indicações dominadas por brancos, de protestos sob a hashtag #OscarsSoWhite (Oscars tão brancos) e de boicotes, tornaram-se ainda mais veementes as reivindicações para que a diversidade observada na sociedade se reflita nos filmes.
"Somos poderosos"
Tudo começou em 2016 com o apelo emocional num vídeo publicado no Facebook em 18 de janeiro, o dia em que se celebra Martin Luther King Jr. A atriz Jada Pinkett Smith declarou: "Implorar por reconhecimento, ou mesmo pedir, diminui a dignidade e diminui o poder. E somos pessoas dignas e somos poderosos, e não podemos esquecer isso."
Ao falar em "nós", ela se referia aos artistas negros de Hollywood, lançando um desafio à Academia de Artes e Ciências Cinematográficas (Ampas).
#OscarsSoWhite viralizou, chamando a atenção para o problema gritante da falta de diversidade em Hollywood. Cheryl Boone Isaacs, negra e presidente da academia desde 2013, logo anunciou mudanças radicais na política de filiação da organização.
À época, a Ampas tinha cerca de 6 mil membros de diferentes setores da indústria cinematográfica, incluindo produtores, diretores, maquiadores, engenheiros de som, figurinistas e atores. Três quartos eram homens, nove em cada dez eram brancos.
Outras minorias em compasso de espera
Isaacs fez o que pôde para promover a inclusão desde que assumiu a presidência da Academia. No entanto a celeuma de 2016 precipitou uma reforma imediata e radical: a filiação à Academia não é mais vitalícia e sim limitada a dez anos. Membros que não se envolverem em projetos cinematográficos nesse período perdem o direito a voto. Além disso, o quadro de eleitores foi acrescido de 638 novos membros, tendo a diversidade como critério.
As mudanças se refletiram nas indicações para o Oscar, que este ano estão mais diversas. O veterano Denzel Washington (Um limite entre nós) e Ruth Negga (Loving), de 35 anos, concorrem aos prêmios de melhor ator e atriz, respectivamente.
Das indicações de ator/atriz coadjuvantes constam cinco profissionais "de minorias": Dev Patel (Lion: Uma jornada para casa), Mahershala Ali e Naomie Harris (Moonlight: Sob a luz do luar), Octavia Spencer (Estrelas além do tempo) e Viola Davis (Um limite entre nós).
Davis é a primeira atriz negra a ser indicada ao Oscar pela terceira vez. Já o diretor de Moonlight, Barry Jenkins, é o primeiro negro a ser indicado tanto para melhor diretor quanto pelo melhor roteiro adaptado. Além disso, cineastas negros foram indicados pela primeira vez em áreas como fotografia e edição.
Então está tudo bem? Calma lá: os artistas de origem latina e asiática continuam de fora, quando se trata do Oscar. Ainda há muito a ser feito, sobretudo quando se trata de representar outras minorias.
Presença negra no Oscar 2017
Após o fiasco e os protestos no Oscar do ano anterior, a Academia de Cinema se esforça por representar melhor a diversidade nas novas indicações.
Foto: LYDIE/SIPA
História real
O ano é 1962, a segregação racial impera nos EUA. Com vigor e dignidade, o filme "Estrelas além do tempo" conta a história real de três matemáticas negras que desempenharam um papel fundamental nos programas Apollo e Mercury da NASA – apesar de terem que caminhar 45 minutos até os banheiros "para negros". Octavia Spencer (dir.) foi indicada entre as melhores atrizes coadjuvantes.
Foto: picture-alliance/AP Photo/Twentieth Century Fox/H. Stone
Capítulos de uma vida
"Moonlight: Sob a luz do luar" foi baseado na peça "In moonlight black boys look blue", a história de um negro gay que cresce em Miami ao lado da mãe viciada em drogas. O filme é intenso, autêntico e poético. Três atores representam o protagonista em diferentes fases da vida. "Moonlight" foi nomeado para oito Oscars, incluindo o de melhor filme.
Foto: A24/DCM
Primeiro negro como melhor diretor?
Assim como o protagonista de "Moonlight", o cineasta Barry Jenkins, de 37 anos, cresceu em Miami. Ele é o primeiro afro-americano a ser indicado tanto melhor diretor quanto pelo melhor roteiro adaptado. Em janeiro de 2017 "Moonlight" venceu na categoria melhor drama do Globo de Ouro, enquanto o também concorrente ao Oscar "La La Land" levou para casa o prêmio de melhor musical ou comédia.
Foto: A24/DCM
Racismo nos anos 50
A vida como lixeiro e pai de três filhos é difícil, e os sonhos de Troy Maxson (Denzel Washington) nunca se tornam realidade. O papel do trabalhador desencantado em "Um limite entre nós" pode render ao ator de 62 anos seu terceiro Oscar. Washington é igualmente produtor, concorrendo, portanto, também na categoria de melhor filme.
Foto: picture-alliance/AP Photo/Paramount Pictures/D. Lee
Talvez este ano
Viola Davis, de 51 anos, foi indicada pela terceira vez para o Oscar. Este ano são boas as suas chances de levar a estatueta de melhor atriz coadjuvante por "Um limite entre nós". Os críticos têm elogiado sua atuação como Rose Maxson, esposa de Troy, e alguns consideram o desempenho dela até mesmo superior ao de Washington. Davis já conquistou um BAFTA de melhor atriz coadjuvante pelo papel.
Foto: Reuters/T. Melville
"Loving", história de um casal interracial
Mildred e Richard Loving se apaixonaram nos anos 50 no Estado da Virgínia. Porém sua história de amor tinha um empecilho: sob a lei local, um branco e uma negra não podiam se casar. O caso foi parar na Suprema Corte, que tomou em 1967 a decisão histórica de anular as leis que proibiam o casamento interracial.
Foto: picture-alliance/ZUMAPRESS.com/Focus Features
Estrela etíope-irlandesa
Por seu papel como Mildred em "Loving", Ruth Negga foi nomeada para o Oscar de melhor atriz. Um feito admirável para a etíope de 35 anos que passou a maior parte da infância na Irlanda. Ela acredita na importância dessa história biográfica: "Nosso filme não é sobre a América negra, é sobre a América, a América branca e negra. Você sabe, estamos todos juntos nisso."
Buscando suas raízes em "Lion: Uma Jornada para Casa"
Outra história real: aos cinco anos de idade, o pobre indiano Saroo Brierley subiu num trem, adormeceu e acabou indo parar longe de casa. Uma família australiana o adotou. Passaram-se 25 anos até ele retornar à Índia, à busca de sua família biológica, com a ajuda do Google Maps. "Lion: Uma jornada para casa" recebeu seis indicações, incluindo melhor filme.
O documentário "I am not your Negro" se baseia num manuscrito inacabado do autor americano James Baldwin, dedicado aos membros-chave do movimento pelos direitos civis Martin Luther King Jr., Malcolm X e Medgar Evers. "Os brancos têm é que tentar descobrir em seus corações por que era necessário ter um neguinho, para início de conversa", escreveu Baldwin. "Eu não sou um neguinho, eu sou um homem."
Foto: Magnolia Pictures
Do Haiti ao Congo
"Eu não sou seu negro" foi indicado para o Oscar de melhor documentário de longa-metragem. Seu diretor, Raoul Peck nasceu no Haiti, cresceu na República Democrática do Congo e tem lidado com temas explosivos como o genocídio em Ruanda e o assassinato de Patrice Lumumba, além de um drama sobre o jovem Karl Marx.