Instalação no Lago de Iseo, no norte da Itália, é sonho de longa data do renomado artista. Durante duas semanas, visitantes da pequena Sulzano podem caminhar sobre as águas por três quilômetros.
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A pequena Sulzano, no norte da Itália, espera receber por volta de 800 mil visitantes entre este sábado (18/06) e 3 de julho, graças aos chamados "Píeres flutuantes" ("Floating Piers", em inglês), novo projeto de Christo, estrela da pop art.
Fixados sobre pontões flutuantes, três quilômetros de píeres com 16 metros de largura interligam Sulzano a duas ilhas próximas no Lago de Iseo, Monte Isola e San Paolo. Trata-se de um substituto natural para a balsa que transporta, normalmente, os 2 mil residentes das ilhas até o continente. O prefeito de Sulzano, Fiorella Turla, chama a instalação de "o milagre de Christo".
O artista e a esposa Jeanne-Claude, que morreu em 2009, desenvolveram o conceito dos "Píeres flutuantes" já na década de 1970. Inicialmente, a ideia era que a instalação ficasse no Rio da Prata, na Argentina, e na Baía de Tóquio, no Japão. No entanto, eles nunca obtiveram permissão para realizar seu projeto nesses locais.
Finalmente, o sonho se tornou realidade no Lago de Iseo, localizado entre Milão e Veneza. "É um pouco como andar sobre um colchão d'água", descreveu Wolfgang Volz, fotógrafo exclusivo de Christo e gestor do projeto.
Trabalho intenso
Apesar das difíceis condições meteorológicas, a instalação foi concluída dentro do cronograma. "No mês passado, tivemos três tempestades, mas elas não afetaram a obra", disse Volz.
No total, 220 mil cubos plásticos foram agrupados e cobertos por 75 mil metros quadrados de tecido amarelo dourado. "Esta cor é dália amarelo. Este amarelo profundo não é uma cor só: o tecido muda de coloração pela manhã, parecendo quase vermelho; ao meio-dia, quando o Sol está a pino, ele fica dourado", afirmou Christo à DW.
A empresa alemã Geo – Die Luftwerker, baseada em Lübeck, foi contratada para preparar o tecido: cortá-lo, costurá-lo e instalá-lo sobre os píeres. "No final, tivemos que trabalhar em turnos das 7h às 23h", conta o diretor da companhia, Robert Meyknecht.
Ele também teve de adquirir equipamentos especiais para a obra, como máquinas de costura potentes para o tecido grosso e um projetor a laser para obter os moldes específicos. "Cada parte tinha uma forma diferente", explica o diretor.
O trabalho nos pontões não foi fácil para a equipe de Lübeck. "O movimento criado pelas ondas foi mais forte do que eu esperava", comentou Meyknecht. Ele disse ter ficado particularmente impressionado com altura das ondas durante a tempestade. "Christo estava lá e parecia tão animado quanto um menino", conta.
A realidade é efêmera
Christo ama a natureza. Suas obras de arte ambientais são, da mesma forma que as pessoas que as observam, expostas ao vento, ao sol a à chuva, dando vida aos trabalhos artísticos.
"Isto não é uma imagem, um filme ou televisão, isto é a realidade", disse Christo à DW.
O tecido que ele estende sobre ou em torno de objetos simboliza a natureza temporária da arte efêmera. Nesse contexto, a instalação "Píeres flutuantes", que custou 13 milhões de euros (por volta de 50 milhões de reais), não é exceção, ficando em exibição durante apenas 16 dias.
Liberdade total
Nascido na Bulgária, Christo financia seus trabalhos sem patrocinadores ou subvenções públicas. Em vez disso, ele vende seus esboços e fotos das instalações.
O artista afirma ser cético quanto a todos os tipos de propaganda, seja política, ecológica ou religiosa. "Ninguém pode usar este trabalho para fazer propaganda, porque ele é baseado na liberdade total", diz.
Ele chegou até a admitir que sua obra é completamente inútil. "Ninguém precisa deste projeto. Somente eu, Jeanne-Claude e alguns amigos queríamos tê-lo. Isso é arte pura."
Na verdade, Christo, a esposa e os amigos não foram os únicos a querer o projeto. O prefeito de Sulzano também saúda a atenção internacional que a cidade deve receber nos próximos dias.
Para as centenas de milhares de visitantes aguardados, a liberdade será mais do que um conceito quando andarem sobre a instalação flutuante – assim como para Christo.
Há 20 anos: Parlamento alemão era "embrulhado"
Passadas duas décadas, "embrulho" do Reichstag continua sendo uma das ações mais espectaculares do casal de artistas Christo e Jeanne-Claude. Christo precisou lutar 23 anos pela sua aprovação.
Foto: picture alliance/dpa/W. Kumm
O triunfo
"Nós vencemos!", gritou Christo no dia 25 de Fevereiro de 1994. Após 23 anos de luta tenaz, o parlamento alemão finalmente aprovou seu projeto "Reichstag embrulhado". No dia 17 de Junho de 1995 chegavam os caminhões com a enorme quantidade de tecido. A ação, considerada até hoje espetacular, completa 20 anos e é homenageada em uma exposição.
Foto: picture-alliance/AP Photo
Mãos à obra
Christo veste suas luvas de trabalho antes de dar início ao empacotamento. Desde 1971 ele e a esposa, Jeanne-Claude, tentavam convencer o parlamento alemão a autorizar a ação artística. Christo sempre foi um entusiasta da localização e simbologia do Reichstag. Mas foi justamente por se tratar de um símbolo histórico que o projeto suscitou debates acirrados no parlamento.
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Um símbolo de liberdade
Em 1978, Christo apresentou seu modelo no Museu de Design de Zurique. Para ele, o prédio construído no final do século 19 pelo imperador alemão Guilherme 2º era, apesar de sua história turbulenta, um símbolo de liberdade. A República de Weimar foi proclamada ali em 1918. O tema da liberdade acompanha Christo e sua arte desde que ele fugiu da Bulgária comunista, em 1951.
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A coleção "Reichstag embrulhado"
O que foi visto em 1995, na abertura da exposição com Christo e Jeanne-Claude, retorna agora a Berlim. A coleção "Reichstag embrulhado" deve ser exposta após o recesso de verão do Parlamento. O artista búlgaro vai expor os 320 desenhos, modelos, colagens e fotografias, bem como os restos de panos, cordas e ganchos daquele tempo.
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Embrulho temporário
As obras de Christos são efêmeras. Como representante da chamada "Land Art", ele se voltou contra a propriedade de obras artísticas. Ele defendia que a arte nos espaços públicos pode ser apreciada por todos, ela não deve ser propriedade de ninguém. Christo considera durabilidade da obra como sinônimo de posse. Mesmo o Parlamento alemão só pôde ser visto embrulhado durante 14 dias.
Foto: picture alliance/dpa/W. Kumm
Um acontecimento
A última das 70 tiras de tecido prateado foi fixada no Parlamento dia 23 de junho de 1995. Mais de 100 mil metros quadrados de tecido, amarrados por vários quilômetros de cordas azuis, fascinaram os espectadores. Cinco milhões de visitantes passaram pela obra ao longo de 14 dias: um recorde mundial de público num intervalo tão curto de tempo.
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Empacotando o nada
Christo começou com seus empacotamentos espetaculares na década de 1960. Seu embrulho de 5,6 mil metros cúbicos na "documenta 4" de Kassel, em 1968, ficou famoso no mundo inteiro. Desde cedo, Christo embalou cadeiras, jornais e barris de petróleo, mas aquela era a primeira vez que o artista empacotava o ar.
Foto: cc-by-3.0/Dr. Ronald Kunze
A cortina no Vale Rifle
Na década de 1970, as ações de Christo e Jeanne-Claude foram ficando mais trabalhosas e coloridas. A fim de preservar sua liberdade artística, o casal financiava os próprios projetos com a venda de desenhos, fotografias e modelos. Um espetáculo: a cortina laranja esvoaçante de 400 metros de comprimento que Christo pendurou no Vale Rifle, no Colorado, em 1972.
Foto: picture alliance/Everett Collection
Um olhar diferente
Christo e Jeanne-Claude nunca tornaram objetos e edifícios irreconhecíveis. A estética era importante para ambos. Sob a cobertura, o objeto continuava à vista, para estimular a imaginação. Em 1985, os dois cobriram a Pont Neuf, em Paris. Com a variação do clima, o tecido cintilava em cores diferentes – a ponte se mostrava, literalmente, sob uma nova luz.
Foto: picture-alliance/dpa
Arte como espetáculo
Na década de 1990, as ações do casal de artistas foram ficando cada vez mais arriscadas. Em "The Umbrellas", no Japão e na Califórnia, um dos assistentes morreu durante a montagem dos 3 mil guarda-sóis. Depois disso, Christo só trabalhou com escaladores profissionais e engenheiros. A "família" de ajudantes está em constante expansão.
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Longa espera para "The Gates"
Christo envolve não apenas coisas, mas também paisagens e parques, como fez em 2005 com "The Gates", no Central Park de Nova York. Christo e Jeanne-Claude já tinham planejado os tecidos esvoaçantes para os portões na década de 1980, mas a aprovação levou ainda mais tempo do que a do Reichstag. Hoje, em geral, são preocupações ambientais que dificultam a liberação.
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Work in progress
Christo já se acostumou a esperar. O artista, prestes a completar 80 anos, está trabalhando em três projetos simultaneamente. Alguns deles foram projetados com Jeanne-Claude, que morreu em 2009. Como a obra "The Mastaba", em Abu Dhabi, uma pirâmide gigantesca de 410 mil barris de petróleo. Por este primeiro grande projeto permanente, Christo poderia ganhar um monumento.