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EconomiaCoreia do Norte

Pacto secreto com Rússia faz economia norte-coreana decolar

Nik Martin
1 de fevereiro de 2024

País mais isolado do mundo deve retomar o crescimento pela primeira vez em cinco anos, à medida que envios de armas para sustentar a invasão russa da Ucrânia seguem a pleno vapor.

Kim Jong-un em meio a caminhôes blindados em ambiente fechado, acompanhado de assessores
Kim Jong-un inspeciona fábrica de munições: ao menos dez envios de armas à Rússia desde agostoFoto: Yonhap/AP Photo/picture alliance

A Coreia do Norte, o país mais isolado do mundo, deve retomar este ano o crescimento econômico pela primeira vez desde os últimos cinco anos, enquanto os envios de armas para sustentar a invasão da Ucrânia pela Rússia abastecem os cofres estatais.

Desde agosto, a Coreia do Norte fez dez remessas de armas, enviando cerca de um milhão de cartuchos para a Rússia, de acordo com o Serviço Nacional de Inteligência da Coreia do Sul. Outros relatos, baseados em imagens de satélite dos EUA, sugerem que Pyongyang também entregou mísseis balísticos aos militares russos.

Tanto Pyongyang quanto Moscou negaram que as remessas tenham ocorrido.

O acordo secreto entre o líder norte-coreano, Kim Jong-un, e o presidente russo, Vladimir Putin, provavelmente impulsionará ainda mais a pequena economia de planejamento central do país asiático que, segundo o banco central da Coreia do Sul, chegou a apenas 24,5 bilhões de dólares (R$ 121,3 bilhões) em 2022.

Pacto lucrativo

Não só os bloqueios por causa da covid-19 impactaram a já fraca economia norte-coreana, gerando queda de 4,5% em 2020, como as sanções internacionais impostas em 2016 devido ao programa nuclear de Pyongyang já haviam prejudicado as exportações vitais de carvão para a China. As duas crises exacerbaram ainda mais as dificuldades em um país onde 60% da população vive abaixo da linha da pobreza.

"A economia está em queda nos últimos cinco anos. Portanto, o acordo de armamentos com a Rússia ajudará a retornar a um crescimento positivo de cerca de 1% em 2024", disse à DW Anwita Basu, diretora de risco-país para a Europa da Fitch Solutions, braço de pesquisa da agência de classificação de risco Fitch.

Basu afirma que sua previsão é uma suposição, pois Pyongyang não divulga dados econômicos. A maioria das estatísticas sobre o país é obtida do banco central da Coreia do Sul e dos parceiros comerciais da Coreia do Norte.

Indústria de defesa e poderio militar são considerados vitais pelo regime da Coreia do NorteFoto: Ed Jones/AFP/AFP/Getty Images

No ano passado, o comércio da Coreia do Norte com a China – de longe seu maior parceiro – voltou aos níveis pré-pandemia de 2,3 bilhões de dólares (R$ 11,4 bilhões), de acordo com Pequim, tendo caído drasticamente entre 2016 e 2018 após a imposição de sanções.

Descrevendo a transferência de munição como um "mega negócio" para Pyongyang, Basu disse que esse foi claramente um "ato de desespero" por parte da Rússia, que está cada vez mais isolada globalmente devido à decisão de invadir seu vizinho.

Um relatório publicado em outubro pelo britânico Royal United Services Institute (Rusi), o mais antigo think tank de defesa e segurança do mundo, disse que a decisão de Pyongyang de entregar munições à Rússia "ressalta a grave ameaça que a Coreia do Norte representa para a segurança internacional", alertando que o acordo teria "profundas consequências para a guerra na Ucrânia e para a dinâmica de segurança no Leste Asiático".

Indústria bélica como motor de crescimento

A indústria bélica da Coreia do Norte é um dos maiores empregadores do país, ocupando cerca de 2 milhões de trabalhadores dos 26 milhões de habitantes do país. O setor contribuiu significativamente para a economia, juntamente com a agricultura.

Originalmente, o setor servia de fornecedor apenas para suas próprias Forças Armadas, mas a Coreia do Norte encontrou alguns clientes importantes no exterior para suas armas e munições – em sua maioria, antigos países soviéticos ou da África Subsaariana. A maioria das peças é importada de outros países altamente sancionados, incluindo a China e o Irã.

"A Coreia do Norte quer duas coisas há algum tempo: uma é a legitimidade como nação, que ela não tem porque a Guerra da Coreia ainda não terminou. A segunda é um setor de defesa e militar sustentável, capaz de defender sua soberania", disse Basu.

Apesar da importância do setor de defesa, Basu é cética sobre se os norte-coreanos comuns se beneficiarão com o acordo de armas russo. Há muitos anos, o país depende muito da ajuda externa para alimentar sua população, e muitas pessoas sofrem de desnutrição e outros problemas de saúde.

"É provável que eles [cidadãos comuns] não ganhem muito, porque a Coreia do Norte continua sendo um Estado autocrático com muita corrupção", disse ela. "Ao mesmo tempo, a renda adicional para o setor de defesa melhorará a capacidade de financiamento externo, de modo que o acesso a importações de alimentos e tecnologia poderá se tornar mais fácil."

A expectativa é que o Estado lucre pelo menos 1 bilhão de dólares com a venda de projéteis de artilharia para a Rússia, informou a agência de notícias Bloomberg News esta semana, considerando que os mísseis balísticos encomendados por Moscou geralmente custam vários milhões de dólares.

Cerca de 60% da população norte-coreana vive abaixo da linha da pobrezaFoto: Ed Jones/AFP/Getty Images

Basu tem dúvidas sobre quanto do acordo foi em dinheiro ou parte de um acordo de troca por capacidades militares russas avançadas e ajuda econômica.

Acordo de munições pode estreitar aliança

A economista da Fitch Solutions também observou que a Coreia do Norte, juntamente com a Rússia, é conhecida por suas capacidades avançadas de ataque cibernético, com milhares de hackers sendo treinados pelo Estado. "Portanto, esse poderia ser outro tipo de área para os dois lados trabalharem juntos no futuro", disse Basu.

Em um sinal de que os dois países estão buscando aumentar ainda mais os laços, Putin "expressou sua vontade de visitar [a Coreia do Norte] em um futuro próximo, informou na semana passada a agência de notícias estatal do norte-coreana KCNA. Essa seria sua primeira visita a Pyongyang em mais de duas décadas. Putin e Kim mantiveram conversações bilaterais no extremo oriente da Rússia em setembro.

Os benefícios econômicos, no entanto, podem ter vida curta se uma solução diplomática for encontrada este ano para a guerra da Ucrânia, ou se a China, que é um importante aliado de Pyongyang, enfraquecer seu apoio à Coreia do Norte e à Rússia.