Crise em Atenas
5 de novembro de 2011Pela primeira vez na história constitucional da Grécia o Parlamento expressou sua confiança em um primeiro-ministro, abrindo caminho para que ele, em breve, deixe o cargo.
Essa foi a decisão na madrugada deste sábado (05/11) em Atenas. Apesar das previsões desfavoráveis, o premiê George Papandreou conquistou, com uma vitória apertada, o voto de confiança dos parlamentares do país. Dos 298 parlamentares presentes, 153 votaram favoravelmente ao político – dois a mais que necessário – e 145 foram contra.
Potenciais dissidentes condicionaram sua aprovação ao fato de Papandreou iniciar o processo de sucessão na chefia do governo do país. O ideal seria ainda que ele aceitasse a formação um governo de unidade nacional.
Papandreou parece ter concordado com as condições. Em seu discurso antes da votação no Parlamento, ele se declarou pronto para aceitar e promover a ideia de um governo amplo e suprapartidário, a ser debatido neste sábado com o presidente da Grécia.
O primeiro-ministro também mencionou que estaria disposto a conversar sobre uma possível substituição, sem explicitar, no entanto, se deixaria o cargo imediatamente.
Socialistas e conservadores
Apesar de quase nada parecer impossivel na recente política grega, poucos acreditam que Papandreou ainda tenha chances de permanecer no poder. Na última segunda-feira, o premiê provocou uma tensão internacional ao anunciar um referendo para submeter à aprovação popular o pacote europeu de resgate da economia grega – no valor de 130 bilhões de euros.
Sob forte pressão, no entanto, o governo desistiu da consulta na sexta-feira. Com o fiasco da ideia do referendo, Papandreou ficou em uma situação complicada até mesmo dentro de seu partido, o Movimento Socialista Pan-helênico (Pasok).
Opiniões sobre quem deve substituí-lo e como isso será feito ainda são divergentes. Os socialistas são a favor de um governo de unidade, envolvendo todos os partidos políticos – preferencialmente, claro, sob sua regência. O atual ministro grego de Finanças, Evangelos Venizelos, tem demonstrado interesse em assumir o cargo de primeiro-ministro.
Já o partido conservador, de oposição, que vem desempenhando um crescente e importante papel no cenário político atual, quer formar um governo de transição composto por especialistas, a fim de que possam preparar novas eleições em até seis semanas.
Como de costume, Papandreou propôs um meio-termo: um governo de transição, composto por políticos de alta qualificação, capaz de levar ao Parlamento as decisões acordadas na última reunião de cúpula da União Europeia, assim como dar prosseguimento às medidas de austeridade e, por fim, conduzir o país a novas eleições em março do ano que vem.
"As máscaras caíram. Papandreou rejeitou todas as nossas propostas e, portanto, queremos eleições imediatas", afirmou o líder da oposição, Antonis Samaras, após a votação.
Dura escolha
Se a oposição conservadora continuar se recusando a compor qualquer novo governo de unidade nacional, os socialistas ficarão sem escolha e terão que construir uma encolhida coalizão com a direita populista e com os liberais da Aliança Democrática, da antiga ministra do Exterior Dora Bakoyannis – algo visto como uma medida sem sentido.
A oposição de esquerda sinalizou que está particularmente irritada com a votação deste sábado. "Eles querem que declaremos nosso apoio a um governo que nem existe mais", declarou o líder da aliança moderada de esquerda, Alexis Tsipras.
Muitos observadores concordam que Tsipras tem certa razão em seu comentário. Outros ainda se perguntam por que Papandreou teria se submetido a um voto de confiança no Parlamento se aparentemente ele não tem intenção de deixar a chefia do governo.
História se repete
Este tipo de tumulto político vem se tornando uma constante entre os socialistas. Tempos atrás, um acordo semelhante salvou os esquerdistas de uma divisão e deu um impulso a Papandreou em direção ao poder. Em 2004, o então primeiro-ministro Costas Simitis, renunciou ao cargo de presidente do partido e o passou a seu então ministro do Exterior, George Papandreou.
Após um intervalo político conservador, o Pasok venceu as eleições parlamentares de 2009 – o que envolveu uma surpreendente ação de Papandreou, que se afastou de seu antigo mentor Simitis e chegou ao cargo de primeiro-ministro.
Naquela época, o pedido em prol de um referendo também motivou um conflito dentro do partido. Pouco antes das eleições europeias em 2009, Papandreou prometeu fazer um referendo pela aprovação do Tratado de Lisboa – contra a vontade de um inflexível Simitis em sua posição pró-Europa.
Caso Simitis venha a assumir novamente o governo grego, ainda que temporariamente, em um governo de transição, por exemplo, seria uma curiosa ironia do destino se Papandreou tiver que dar lugar a seu antecessor.
Autor: Jannis Papadimitriou (msb)
Revisão: Carlos Albuquerque