Para o EI, reféns significam dinheiro e propaganda
Matthias von Hein (ca)5 de fevereiro de 2015
Com execuções e sequestros encenados midiaticamente, prisioneiros são importantes para o "Estado Islâmico" como instrumento de terror e extorsão, como mostra o destino de alguns deles.
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O piloto jordaniano Muath al-Kaseasbeh foi executado da forma mais brutal – queimado vivo dentro de uma jaula. Dias antes, o refém japonês Kenji Goto havia sido decapitado publicamente, da mesma forma que seu compatriota Haruna Yukawa.
Nos três casos, o "Estado Islâmico" (EI) falhou em dois de seus objetivos: não recebeu do Japão o resgate exigido de 200 milhões de dólares; nem conseguiu da Jordânia a libertação da jihadista iraquiana Sajida Al-Rishawi, que acabou sendo executada num ato de vingança.
Mas em outro de seus objetivos a organização terrorista conseguiu ter êxito: atraiu a atenção mundial.
Ocidentais como alvo
Por meio dos reféns, o "Estado Islâmico" pretende conseguir tanto o dinheiro do resgate quanto fazer propaganda. Principalmente quando se trata de estrangeiros.
Mas também o sequestro e deportação de moradores cristãos ou yazidis das regiões conquistadas no norte do Iraque, em meados do ano passado, encheram os cofres do EI. Eles foram vendidos como escravos ou libertados por meio de resgate.
Muçulmanos xiitas e combatentes sunitas inimigos também foram sequestrados, torturados, abusados e comercializados.
No entanto, foi o sequestro de cerca de 20 reféns ocidentais que ganhou mais atenção internacional. Desses, 15 foram libertados – provavelmente depois do pagamento de resgate. Os últimos a serem soltos, em agosto de 2014, foram o alemão Toni N. e o fotógrafo dinamarquês Rye Ottosen.
Sabe-se que dois reféns ainda se encontram em mãos do EI: uma americana de 26 anos, cujo nome é desconhecido e que queria prestar ajuda humanitária; e o jornalista britânico James Catlie. Ele foi sequestrado em 22 de novembro de 2012 ao lado do fotógrafo americano James Foley.
Eles foram os primeiros reféns do grupo terrorista. E Foley foi o primeiro refém ocidental a ser executado publicamente, em agosto do ano passado. Na época do sequestro de Catlie e Foley, o "Estado Islâmico" ainda não existia em sua forma atual. Eles foram sequestrados por outra milícia, que mais tarde se aliou ao EI. Atualmente, Catlie é o prisioneiro há mais tempo em mãos dos jihadistas.
Entre o resgate financeiro e militar
Catlie está sendo usado pelo EI para fins de propaganda. Em vídeos de internet, ele faz passeios pelas cidades conquistadas pela milícia, como, por exemplo, Mossul.
Os dois reféns japoneses só caíram nas mãos dos terroristas mais tarde: Yukawa desapareceu em agosto de 2014, enquanto Goto foi capturado ao viajar para a Síria, em outubro do ano passado, à procura do compatriota.
Contando o piloto jordaniano, foram mortos nove prisioneiros. Cinco deles vinham do Reino Unido ou dos EUA. Ambos os países rejeitaram o pagamento de resgate.
Acredita-se, no entanto, que França, Espanha, Alemanha e Dinamarca pagaram milhões pela liberdade de seus cidadãos – mesmo que o Ministério do Exterior em Berlim tenha declarado explicitamente, após a libertação de Toni N., que não foi pago "nenhum dinheiro público."
Atualmente, já se discute na mídia americana a possibilidade de uma operação militar para a libertação dos dois reféns restantes, principalmente do prisioneiro americano. Em meados do ano passado, no entanto, fracassou uma missão para a libertação dos reféns James Foley e Steven Sotloff, que acabaram sendo executados. Quando as forças especiais chegaram ao local, os prisioneiros já haviam sido transferidos.
"Estado Islâmico": de militância sunita a califado
Origens do grupo jihadista remontam à invasão do Iraque, em 2003. Nascido como oposição ao domínio xiita e inicialmente um braço da Al Qaeda, EI passou por mudanças e virou uma ameaça internacional.
Foto: picture-alliance/AP Photo
A origem do "Estado Islâmico"
A trajetória do "Estado Islâmico" (EI) começou em 2003, com a derrubada do ditador iraquiano Saddam Hussein pelos EUA. O grupo sunita surgiu a partir da união de diversas organizações extremistas, leais ao antigo regime, que lutavam contra a ocupação americana e contra a ascensão dos xiitas ao governo iraquiano.
Foto: picture-alliance/AP Photo
Braço da Al Qaeda
A insurreição se tornou cada vez mais radical, à medida que fundamentalistas islâmicos liderados pelo jordaniano Abu Musab al Zarqawi, fundador da Al Qaeda no Iraque (AQI), infiltraram suas alas. Os militantes liderados por Zarqawi eram tão cruéis que tribos sunitas no Iraque ocidental se voltaram contra eles e se aliaram às forças americanas, no que ficou conhecido como "Despertar Sunita".
Foto: AP
Aparente contenção
Em junho de 2006, as Forças Armadas dos EUA mataram Zarqawi numa ofensiva aérea e ele foi sucedido por Abu Ayyub al-Masri e Abu Omar al-Bagdadi. A AQI mudou de nome para Estado Islâmico do Iraque (EII). No ano seguinte, Washington intensificou sua presença militar no país. Masri e Bagdadi foram mortos em 2010.
Foto: AP
Volta dos jihadistas
Após a retirada das tropas dos EUA do Iraque, efetuada entre junho de 2009 e dezembro de 2011, os jihadistas começaram a se reagrupar, tendo como novo líder Abu Bakr al-Bagdadi, que teria convivido e atuado com Zarqawi no Afeganistão. Ele rebatizou o grupo militante sunita como Estado Islâmico do Iraque e do Levante (EIIL).
Foto: picture alliance/dpa
Ruptura com Al Qaeda
Em 2011, quando a Síria mergulhou na guerra civil, o EIIL atravessou a fronteira para participar da luta contra o presidente Bashar al-Assad. Os jihadistas tentaram se fundir com a Frente Al Nusrah, outro grupo da Síria associado à Al Qaeda. Isso provocou uma ruptura entre o EIIL e a central da Al Qaeda no Paquistão, pois o líder desta, Ayman al-Zawahiri, rejeitou a manobra.
Foto: dapd
Ascensão do "Estado Islâmico"
Apesar do racha com a Al Qaeda, o EIIL fez conquistas significativas na Síria, combatendo tanto as forças de Assad quanto rebeldes moderados. Após estabelecer uma base militar no nordeste do país, lançou uma ofensiva contra o Iraque, tomando sua segunda maior cidade, Mossul, em 10 de junho de 2014. Nesse momento o grupo já havia sido novamente rebatizado, desta vez como "Estado Islâmico".
Foto: picture alliance / AP Photo
Importância de Mossul
A tomada da metrópole iraquiana Mossul foi significativa, tanto do ponto de vista econômico quanto estratégico. Ela é uma importante rota de exportação de petróleo e ponto de convergência dos caminhos para a Síria. Mas a conquista da cidade é vista como apenas uma etapa para os extremistas, que pretenderiam avançar a partir dela.
Foto: Getty Images
Atual abrangência do EI
Além das áreas atingidas pela guerra civil na Síria, o EI avançou continuamente pelo norte e oeste iraquianos, enquanto as forças federais de segurança entravam em colapso. No fim de junho, a organização declarou um "Estado Islâmico" que atravessa a fronteira sírio-iraquiana e tem Abu Bakr al-Bagdadi como "califa".
Foto: Reuters
As leis do "califado"
Abu Bakr al-Bagdadi impôs uma forma implacável da charia, a lei tradicional islâmica, com penas que incluem mutilações e execuções públicas. Membros de minorias religiosas, como cristãos e yazidis, deixaram a região do "califado" após serem colocados diante da opção: converter-se ao islã sunita, pagar um imposto ou serem executados. Os xiitas também eram alvo de perseguição.
Foto: Reuters
Guerra contra o patrimônio histórico
O EI destruiu tesouros arqueológicos milenares em cidades como Palmira (foto), na Síria, ou Mossul, Hatra e Nínive, no Iraque. Eles diziam que esculturas antigas entram em contradição com sua interpretação radical dos princípios do Islã. Especialistas afirmam, porém, que o grupo faturou alto no mercado internacional com a venda ilegal de estátuas menores, enquanto as maiores eram destruídas.
Foto: Fotolia/bbbar
Ameaça terrorista
Durante suas ofensivas armadas, o "Estado Islâmico" saqueou centenas de milhões de dólares em dinheiro e ocupou diversos campos petrolíferos no Iraque e na Síria. Seus militantes também se apossaram do armamento militar de fabricação americana das forças governamentais iraquianas, obtendo, assim, poder de fogo adicional.