Parceria com multinacionais promove pequenos agricultores no mercado
2 de dezembro de 2012Cacau de alta qualidade é uma mercadoria rara: foi o que teve de constatar a maior fabricante de chocolate do mundo, a Kraft Foods Inc.. Assim como acontece com o café ou o chá, a maior parte da produção se concentra nas mãos de pequenos lavradores nos países em desenvolvimento. No entanto, o cultivo, que tanto tempo e trabalho exige, praticamente não vale a pena, em face das enormes oscilações de preços a que estão sujeitos os produtos agrícolas.
Para garantir seu abastecimento de cacau, a Kraft Foods estabeleceu contato direto com os plantadores na Costa do Marfim, garantindo-lhes a compra de toda a safra – que respondia plenamente a padrões internacionais de qualidade e durabilidade – por um preço justo.
Desse modo, além da segurança de planejamento, os agricultores ganharam incentivo para novos investimentos e aprimoramento da qualidade. A fim de garantir a presença de um interlocutor central e acelerar a chegada do produto às unidades de processamento, a multinacional igualmente fortaleceu as cooperativas locais e criou sistemas de transportes.
"Dentro de poucos anos, o sucesso foi tão grande que o faturamento cresceu mais de 50% e os plantadores passaram a receber gratificações extras pelo seu cacau", conta Christina Gradl, do instituto de pesquisa Endeva (Enterprise Solutions for Development).
Ganho para ambos os lados
A cooperação entre a Kraft Foods Inc. e os lavradores marfinenses é um exemplo de inclusive business, a inclusão direta dos mais pobres de países em desenvolvimento nos mercados.
"O que é novo é a tentativa de cooperar bem de perto com os agricultores, até porque cada vez mais os consumidores querem saber de onde vêm os seus produtos", explica Gradl. Em seu manual Growing business with smallholders, publicado em novembro, ela descreve as estratégias de negócios bem sucedidos com pequenos lavradores.
A ideia central é que ambos os lados devem lucrar – como é o caso de qualquer transação comercial. "Os plantadores vendem seus produtos às empresas, mas também precisam de sementes, sistemas de irrigação, fertilizantes – o que os coloca no papel de consumidores."
Assim, além de fortalecer sua cadeia de abastecimento, as empresas têm a oportunidade de explorar novos mercados nos países em desenvolvimento e emergentes, que trazem fortes promessas de crescimento futuro.
Basf na Índia
O conglomerado químico alemão Basf também tentou durante muito tempo vender pesticidas para os pequenos lavradores na Índia, através de intermediários. Sem sucesso, pois os compradores não sabiam lidar com os produtos, nem se o investimento sequer valeria a pena, relata Gradl.
Em 2006, a Basf iniciou o projeto Samruddhi Farmer Training Project, pelo qual os produtores de soja não só eram treinados na forma de lidar com pesticidas e fertilizantes, como também adquiriam conhecimentos nas áreas de marketing e contabilidade.
"Com o emprego das substâncias e dos novos conhecimentos, os lavradores alcançaram colheitas 50% maiores, e para a Basf inaugurou-se um novo mercado, contando atualmente com 120 mil agricultores", resume Gradl.
Incentivos extras para cooperação para o desenvolvimento
No entanto, tanto as empresas quanto os agricultores continuam ocasionalmente encontrando problemas. Além da falta de know how por parte dos produtores e da infraestrutura deficiente nas zonas rurais, um deles é a ausência de parâmetros legais confiáveis para os parceiros de negócios. Nesse ponto, é importante a contribuição dos programas de cooperação para o desenvolvimento, por exemplo, na elaboração de contratos.
A Agência Alemã de Cooperação Internacional (GIZ) apoia soluções empresariais no combate à pobreza. "Como se trata de um programa de caráter sustentável, do ponto de vista da política de desenvolvimento, há interesse de que ele se financie com seus próprios meios, como qualquer outro negócio, sem estar permanentemente dependente de doações", explica Christina Gradl.
Além disso, ao contrário de formas convencionais de cooperação para o desenvolvimento, há certos estímulos claros em jogo, pois os doadores são também receptores de serviços.
Forças desiguais
Friedel Hütz-Adams, da ONG Südwind, tem uma visão mais cética. Em princípio, ele saúda as novas possibilidades que, no caso ideal, a noção de inclusive business poderia apresentar para os agricultores. Uma delas seria o acesso a créditos orientados para os negócios.
O especialista ressalva, porém, que ainda é cedo demais para expressar julgamentos definitivos. No fundo, as empresas estão interessadas em comprar o mais barato possível, a médio e longo prazo, e a vender o mais caro possível para os plantadores.
"Trata-se de conglomerados poderosíssimos, com que os agricultores de bem pequeno porte se confrontam. E aí se coloca a questão, se é possível encontrar um equilíbrio, permitindo que o faturamento dos produtores cresça e a pobreza diminua, e que as empresas lucrem com isso."
Parceiros insubstituíveis
Hütz-Adams afirma à Deutsche Welle também ver o risco de que o acréscimo de produção alcançado por meio dos projetos de cooperação levem a uma super oferta a médio prazo, fazendo com que os preços dos produtos agrícolas voltem a cair.
"Entretanto as multinacionais estão submetidas a uma pressão adicional: no tocante a muitas matérias primas, a concorrência é cada vez mais acirrada, pois as superfícies aráveis escasseiam em todo o mundo, enquanto a população cresce. E com ela, também a demanda."
Até 2050, calcula-se que haverá no planeta cerca de 2 bilhões de seres humanos a mais. Especialistas estimam que, para dar conta de toda essa demanda, a produção de alimentos precisará crescer 50%.
Neste quadro, cabe registrar que os pequenos agricultores cultivam a maior parte das terras aráveis, em 500 milhões de propriedades espalhadas pelo mundo. E, ao contrário dos grandes conglomerados nos países industrializados, ainda possuem bom potencial de aumento de produtividade. Por isso, no futuro eles serão insubstituíveis como parceiros de negócios.
Autora: Christina Ruta (av)
Revisão: Mariana Santos