Paris protesta e não realizará transmissão de jogos da Copa
5 de outubro de 2022
Capital francesa segue exemplo de outras cidades do país e não terá fanzones para torcedores assistirem ao Mundial, por considerar uma afronta aos direitos humanos e ao meio ambiente a realização do evento no Catar.
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A prefeitura de Paris anunciou que não haverá fanzones com telões para transmissões dos jogos da Copa do Mundo do Catar este ano na capital francesa.
A decisão é uma forma de protesto contra as violações de direitos trabalhistas de migrantes que atuaram nas obras de infraestrutura do evento e o impacto ambiental de realizar um torneio de futebol dessa magnitude no meio do deserto. O anúncio é ainda mais emblemático, pois a França é a atual campeã da Copa do Mundo.
Em entrevista à rádio France Blue Paris, o vice-prefeito da capital francesa, Pierre Rabadan, disse que "estádios com ar condicionado" e as "condições em que essas instalações foram construídas" devem ser questionados. Ele também ponderou que a realização do evento em novembro e dezembro, época de baixas temperaturas na França, também dificulta a montagem das estruturas para exibir os jogos.
Rabadan enfatizou que, com a atitude, Paris não está boicotando o torneio de futebol. No entanto, segundo ele, o modelo do Catar de sediar grandes eventos "vai contra" o que Paris, sede dos Jogos Olímpicos de 2024, quer organizar.
A decisão do governo parisiense ocorre apesar do famoso clube de futebol da cidade, o Paris Saint-Germain, ser de propriedade da Qatar Sports Investments.
"Temos relações muito construtivas com o clube e sua comitiva, mas isso não nos impede de dizer quando discordamos", disse Rabadan.
Tendência na França
Recentemente, outras cidades francesas já haviam feito anúncios semelhantes. Segundo o jornal francês Le Monde, Marselha, Bordéus e Nanci estão entre as mais recentes a aderir à iniciativa, depois de Estrasburgo, Lille e Reims.
De acordo com o Le Monde, a cidade de Marselha considera que o torneio se transformou em "uma catástrofe humana e ambiental incompatível com os valores que queremos ver transmitidos através do esporte e do futebol em particular".
A prefeita de Estrasburgo, sede do Parlamento Europeu e do Tribunal Europeu de Direitos Humanos, citou alegações de abusos e exploração de trabalhadores migrantes no Catar como o motivo do cancelamento das transmissões na cidade.
"É impossível para nós ignorar as muitas advertências de abuso e exploração de trabalhadores migrantes feitas por organizações não governamentais", disse Jeanne Barseghian. "Não podemos tolerar esses abusos, não podemos fechar os olhos quando os direitos humanos são violados", acrescentou.
A prefeita também criticou os impactos do evento para o meio ambiente. "Quando a mudança climática é uma realidade palpável, com incêndios, secas e outros desastres, organizar um torneio de futebol no deserto desafia o senso comum e equivale a um desastre ecológico", ressaltou Barseghian.
O vice-prefeito de Lille, Arnaud Deslandes, afirmou que, ao cancelar a exibição pública dos jogos, a cidade quer enviar uma mensagem à Fifa sobre os danos irreparáveis do torneio no Catar ao meio ambiente.
"Queremos mostrar à Fifa que dinheiro não é tudo", disse. "Ainda não encontrei uma pessoa em Lille que tenha ficado desapontada com nossa decisão", complementou.
Economia de energia
Dadas as temperaturas muitas vezes abrasadoras no Catar, será a primeira vez que a Copa do Mundo será realizada no inverno no Hemisfério Norte, quando as condições climáticas para a exibição comunitária ao ar livre podem estar longe das ideias na Europa.
Soma-se a isso o fato de, neste ano, o continente estar na iminência de uma crise energética, dada a diminuição do fornecimento de combustíveis pela Rússia desde o começo da guerra na Ucrânia.
Ativistas ambientais em toda a França apoiaram o cancelamento das transmissões, uma vez que elas usariam a energia que o país vem armazenando para aquecer as casas e estabelecimentos no inverno.
Na cidade de Bordeaux, as autoridades citaram preocupações com o custo de energia associado às transmissões em meio ao frio. O governo francês vem pedindo uma redução de 10% no uso de energia do país para evitar o risco de cortes e racionamento.
"Estamos nos esforçando para economizar energia", disse o prefeito de Bordeaux, Pierre Hurmic. "Não faz sentido estender o tapete vermelho para um evento tão caro em termos de energia e impacto ambiental", ponderou.
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Mais protestos
Os organizadores da Copa do Catar devem se preparar para muitos outros protestos e críticas a políticas da monarquia semiconstitucional.
A Dinamarca, por exemplo, lançou recentemente seus novos uniformes. Uma das camisas da seleção dinamarquesa é preta, em homenagem aos trabalhadores migrantes que morreram durante as obras.
Além disso, várias federações europeias de futebol querem que seus capitães usem uma braçadeira com um desenho de coração nas cores do arco-íris, em uma campanha contra a discriminação de pessoas LGBTQ.
O emirado, rico em gás, foi duramente criticado na última década por seu péssimo tratamento a trabalhadores migrantes, principalmente vindos do sul da Ásia. A mão de obra estrangeira é necessária para construir dezenas de bilhões de dólares em estádios, linhas de metrô, estradas e hotéis.
O Catar nega as acusações de abusos dos direitos humanos e também se diz atento às preocupações ambientais. O país se comprometeu a compensar algumas das emissões de carbono dos eventos da Copa do Mundo por meio da criação de novos espaços verdes irrigados com água reciclada e da construção de projetos de energia alternativa.
le (AP, ots)
Os principais pontos da Declaração Universal dos Direitos Humanos
Proclamada em 1948, carta é válida para todos os Estados-membros das Nações Unidas. Mas ainda há um longo caminho até que o documento seja implementado para todos, em todo o mundo.
Foto: picture alliance/Photoshot
Direitos iguais para todos (Artigo 1°)
"Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos." Em 10 de dezembro de 1948, a Assembleia Geral das Nações Unidas proclamou em Paris a Declaração Universal dos Direitos Humanos. O ideal é claro, mas continua muito distante de encontrar aplicação concreta.
Foto: Fotolia/deber73
Ter e viver seus direitos (Artigo 2°)
Todos os direitos e liberdades da Declaração se aplicam a todos, que podem invocá-los independente de "raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, fortuna, nascimento ou qualquer outra condição". No nível internacional, contudo, é quase impossível reivindicar esses direitos.
Foto: dapd
Direito à vida e à liberdade (Artigos 3°, 4°,5°)
"Todo indivíduo tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal." (3°) "Ninguém será mantido em escravidão ou servidão." (4°) "Ninguém será submetido à tortura, nem a tratamento cruel, desumano ou degradante" (5°).
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Igualdade perante a lei (Artigo 6° a 12)
Toda pessoa tem direito a um julgamento justo e à proteção da lei (6°, 8°, 10, 12). Todos são considerados inocentes até que a sua culpabilidade seja comprovada (11). "Todos são iguais perante a lei" (7°) e "Ninguém pode ser arbitrariamente preso, detido ou exilado" (9°).
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Ninguém é ilegal (Artigos 13, 14, 15)
"Todo indivíduo tem o direito de livremente circular e escolher o seu domicílio dentro de um Estado". "Todos têm o direito de deixar qualquer país" (13). "Toda pessoa sujeita a perseguição tem o direito de procurar asilo em outros países" (14). "Todo indivíduo tem o direito a ter uma nacionalidade" (15).
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Contra os casamentos forçados (Artigo 16)
Homens e mulheres têm direitos iguais antes, durante e depois do casamento. Um casamento "será válido somente com o livre e pleno consentimento dos futuros esposos". A família tem direito à proteção da sociedade e do Estado. Mais de 700 milhões de mulheres em todo o mundo vivem em um casamento forçado, afirma o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef).
Foto: picture-alliance/dpa
Direito à propriedade (Artigo 17)
"Toda pessoa tem direito, individual ou coletivamente, à propriedade. Ninguém pode ser privado arbitrariamente de sua propriedade." Ainda assim, seres humanos são expulsos de suas terras em todo o mundo, por não terem documentos válidos – a fim de abrir caminho para o desenvolvimento urbano, a extração de matérias primas, a agricultura, ou para uma barragem de hidrelétrica, como no Brasil.
Foto: AP
Liberdade de opinião (Artigos 18, 19, 20)
"Toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião" (18). "Todo indivíduo tem direito à liberdade de opinião e de expressão" (19). "Toda pessoa tem direito à liberdade de reunião e associação pacíficas" (20).
Foto: picture-alliance/dpa
Direito à participação (Artigos 21, 22)
"Todo indivíduo tem o direito de tomar parte no governo de seu país, diretamente ou por intermédio de representantes livremente escolhidos" (21). Há um "direito à segurança social" e garantia de direitos econômicos, sociais e culturais, "que são indispensáveis à dignidade" (22).
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Direito ao trabalho (Artigos 23 e 24)
"Toda pessoa tem direito ao trabalho". "Toda pessoa tem direito a igual remuneração por igual trabalho". "Toda pessoa que trabalha tem direito a uma remuneração justa e satisfatória" e pode participar de um sindicato (23). "Toda pessoa tem direito ao lazer" (24).
Foto: picture-alliance/dpa
Uma vida digna (Artigo 25)
"Toda pessoa tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e à sua família saúde e bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais necessários". "A maternidade e a infância têm direito a cuidados e assistência especiais." No mundo inteiro, mais de 2 bilhões estão subnutridos, mais de 800 milhões passam fome.
Foto: picture-alliance/dpa
Direito à educação (Artigo 26)
"Toda pessoa tem direito à educação". O ensino fundamental deve ser obrigatório e gratuito para todos. "A educação deve ser orientada no sentido do pleno desenvolvimento da personalidade humana e do respeito aos direitos humanos." Na prática, 750 milhões de pessoas no mundo são analfabetas, das quais 63% são mulheres e 14% são jovens entre 15 e 24 anos, afirma o relatório sobre educação da Unesco.
Foto: DW/H. Hashemi
Arte e ciência (Artigo 27)
"Toda pessoa tem direito de participar livremente da vida cultural da comunidade, de fruir as artes e de participar do progresso científico". Todos os "autores de obras de ciência, literatura ou arte" estão protegidos legalmente. Hoje, a distribuição digital de muitas obras é algo controverso. Muitos autores veem seus direitos autorais violados pela distribuição na internet.
Foto: AP
Direitos indivisíveis (Artigos 28, 29, 30)
"Toda pessoa tem direito a uma ordem social e internacional em que os direitos e liberdades possam ser plenamente realizados" (28). "Toda pessoa tem deveres para com a comunidade" (29). Nenhum Estado, grupo ou pessoa pode limitar os direitos humanos universais (30). Todos os Estados-membros da ONU assinaram a Declaração Universal dos Direitos Humanos.