Parlamento alemão tem ano mais barulhento em décadas
3 de janeiro de 2021
Deputados foram advertidos mais vezes em 2020 do que nos 18 anos anteriores combinados. Calma das últimas décadas foi interrompida com a chegada de parlamentares de extrema direita, que adotam postura provocativa.
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Deputados federais alemães foram advertidos por perturbação ou desobediência em 20 ocasiões em 2020. O número registrado em apenas 12 meses é superior ao de incidentes combinados das quatro legislaturas anteriores, entre 2002 e 2017.
Segundo levantamento do jornal Augsburger Allgemeine divulgado neste domingo (03/11), a atual legislatura, iniciada em 2017, também é a mais turbulenta desde a reunificação, acumulando 38 ocasiões em que foi necessário aplicar reprimendas ou medidas disciplinares contra deputados. É o maior número de todas as legislaturas das últimas três décadas. Em contraste, a legislatura 2012-2017 teve apenas dois episódios do tipo.
Extrema direita lidera reprimendas
Desda a reunificação, o Parlamento Alemão (Bundestag) passou a contar com uma reputação de palco de discussões enfadonhas, sem muitas emoções. O cenário contrastava com o ambiente ácido do Parlamento Britânico ou com as brigas - muitas delas físicas - dos legislativos de países como a Ucrânia, Taiwan e Coreia do Sul.
No entanto, o cenário de calma no Bundestag mudou a partir de 2017, com a eleição de deputados de extrema direita do partido Alternativa para a Alemanha (AfD), que muitas vezes adotam uma postura provocativa nos debates ou se recusam a cumprir o regimento. O partido também é um promotor de teorias conspiratórias sobre a pandemia de coronavírus, e não foi raro ver em 2019 deputados da sigla se recusando a usar máscara no Parlamento.
Em novembro, deputados da AfD violaram as regras da casa para permitir que um grupo de youtubers de direita tivesse acesso ao prédio do Parlamento, em Berlim. O grupo aproveitou para importunar e ofender deputados que defendiam a imposição de mais medidas para conter a pandemia.
De acordo com o levantamento do Augsburger Allgemeine, dois terços das medidas disciplinares no Bundestag foram dirigidas a membros do partido de extrema direita. Casos envolvendo parlamentares de outros partidos também tiveram relação com o AfD, com deputados reagindo a provocações dos membros da legenda de direita. Na maior parte das vezes, os dois lados usaram a palavra "agitador" contra o adversário. A deputada da AfD Beatrix von Storch foi repreendida seis vezes por chamar o deputado liberal Marco Buschmann de "terrorista".
Em outra ocasião, o líder parlamentar da AfD, Alexander Gauland, foi repreendido por não usar máscara. Durante o episódio, um dos vice-presidentes do Bundestag disse: "Presumo que você estava mentalmente em outro lugar nesse momento, e é por isso que você esqueceu [de colocar uma máscara]." Um deputado do partido A Esquerda aproveitou a ocasião para zombar do político de extrema direita. "Ele sempre é [esquecido]!"
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Anos 80 foram mais agitados
Embora a atual legislatura, que começou em 2017, seja a mais turbulenta desde a reunificação, ela fica bem atrás dos tumultos do antigo parlamento da Alemanha Ocidental, que tinha sede na cidade de Bonn. Na legislatura de 1983-1987, que marcou a chegada do Partido Verde ao Parlamento, a Casa registrou 132 episódios em que a intervenção da mesa diretora foi necessária para acalmar a situação.
Um exemplo memorável desse período ocorreu em 1984, quando o então deputado verde Joschka Fischer disse ao vice-presidente do Parlamento, o conservador Richard Stücklen: "Senhor presidente, com todo o respeito, você é um imbecil."
O atual vice-presidente do Bundestag e membro do partido liberal FDP, Wolfgang Kubicki, disse ao Augsburger Allgemeine que, embora existam deputados "que provocam conscientemente reações de ordem", o problema não deve ser superdimensionado. "A mesa diretora do Bundestag sempre foi capaz de responder a essas insubordinações com o tato necessário", disse ele.
JPS/ots
Os principais partidos alemães
São eles: Partido Social-Democrata (SPD), União Democrata Cristã (CDU), União Social Cristã (CSU), Partido Liberal Democrático (FDP), Alternativa para a Alemanha (AfD), Verdes, Esquerda e Aliança Sahra Wagenknecht (BSW)
Foto: picture-alliance/dpa
União Democrata Cristã (CDU)
Fundada em 1945, a CDU se considera "popular de centro". Seus governos predominaram na política alemã do pós-guerra. O partido soma em sua história cinco chanceleres federais, entre eles Helmut Kohl, que governou por 16 anos e conduziu o país à reunificação em 1990, e Angela Merkel, a primeira mulher a assumir o cargo, em 2005.
Foto: picture-alliance/dpa/A. Dedert
Partido Social-Democrata da Alemanha (SPD)
Integrante da Internacional Socialista, o SPD é uma reconstituição da legenda homônima fundada em 1869 e identificada com as classes trabalhadoras. Na Primeira Guerra, ele se dividiu em dois partidos, ambos proibidos em 1933 pelo regime nazista. Recriado após a Segunda Guerra, o SPD já elegeu quatro chanceleres federais: Willy Brandt, Helmut Schmidt, Gerhard Schröder e Olaf Scholz.
Foto: Thomas Banneyer/dpa/picture alliance
União Social Cristã (CSU)
Igualmente fundada em 1945, a CSU só existe na Baviera, onde a CDU não conta com diretório local. Os dois partidos são considerados irmãos. A CSU tem como objetivo um Estado democrático e com responsabilidade social, fundamentado na visão cristã do mundo e da humanidade. Desde 1949, forma no Bundestag uma bancada única com a CDU.
Foto: Peter Kneffel/dpa/picture alliance
Aliança 90 / Os Verdes (Partido Verde)
O partido Os Verdes surgiu em 1980, após três anos participando de eleições como chapa avulsa, defendendo questões ambientais e a paz. Em 1983, conseguiu formar uma bancada no Bundestag. Oito anos depois, o movimento Aliança 90 se fundiu com ele. Em 1998 participou com o SPD pela primeira vez do governo federal.
Foto: Christophe Gateau/dpa/picture alliance
Partido Liberal Democrático (FDP)
O Partido Liberal Democrático (FDP, na sigla em alemão) foi criado em 1948, inspirado na tradição do liberalismo e valorizando a "filosofia da liberdade e o movimento pelos direitos individuais". O partido é tradicionalmente um membro minoritário de coalizões de governo federais
Foto: Hannes P Albert/dpa/picture alliance
A Esquerda (Die Linke)
Die Linke (A Esquerda, em alemão) surgiu da fusão, em 2007, de duas agremiações esquerdistas: o Partido do Socialismo Democrático (PDS), sucessor do Partido Socialista Unitário (SED) da extinta Alemanha Oriental, e o Alternativa Eleitoral por Trabalho e Justiça Social (WASG, criado em 2005, aglutinando dissidentes do SPD e sindicalistas).
Foto: DW/I. Sheiko
Alternativa para a Alemanha (AfD)
Fundada em 2013, inicialmente como uma sigla eurocética de tendência liberal, a AfD rapidamente passou a pender para a ultradireita, especialmente após a crise dos refugiados de 2015-2016. Com posições radicalmente anti-imigração, membros que se destacam por falas incendiárias, a legenda tem vários diretórios classificados oficialmente como "extremistas" pelas autoridades
Foto: Martin Schutt/dpa/picture alliance
Aliança Sahra Wagenknecht (BSW)
A Aliança Sahra Wagenknecht (BSW) é um partido fundado em janeiro de 2024 pela mulher que lhe dá o nome, uma ex-parlamentar do partido Die Linke (A Esquerda) que defende uma mistura de política econômica de esquerda e retórica social de direita. Nas suas primeiras eleições, o partido tomou boa parte do espaço que era ocupada pela Esquerda.
Foto: Anja Koch/DW
Os pequenos
Há numerosos partidos menores na Alemanha, como Os Republicanos (REP) e o Heimat (Pátria), ambos de extrema direita, ou o Partido Marxista-Leninista (MLPD), de extrema esquerda. Outros defendem causas específicas, como o Partido dos Aposentados, o das mulheres, dos não eleitores, ou de proteção dos animais. E mesmo o Violetas, que reivindica uma política espiritualista.