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Paul Klee: um artista moderno e a construção do mistério

Gaby Reucher av
2 de março de 2018

Pintor suíço atravessou as correntes estilísticas do século 20, como expressionismo, surrealismo e construtivismo. Mostra em Munique explora seus anos na Bauhaus e a receita para conciliar racionalismo e transcendência.

Klee pintou "Sem título (Anjo da Morte)" por volta de 1940, ano em que morreria
Klee pintou "Sem título (Anjo da Morte)" por volta de 1940, ano em que morreriaFoto: Zentrum Paul Klee, Bern, Bildarchiv

As salas da Pinakothek der Moderne lembram pinturas abstratas, com paredes cinza-azulado, amarelo e preto, e elementos geométricos servindo como assentos. Nunca se viu o museu de arte moderna de Munique desse jeito, afirma Oliver Kase, curador da exposição Paul Klee – Construção do mistério.

"O espírito do construtivismo transformou totalmente os espaços", explica, entusiástico. "Com estas cores, trazemos o ateliê de Paul Klee para a Pinakothek": assim como as formas, essas cores são típicas da assim chamada Bauhaus, nos anos 1920.

A escola Bauhaus foi fundada em 1919 pelo arquiteto Walter Gropius, na cidade de Weimar. Ela proclamava a igualdade das artes: em conjunto, artistas e artesãos deveriam trabalhar, ensinar e desenvolver novas ideias.

A fase de Klee na Bauhaus é o foco principal da mostra em Munique. Das 150 obras exibidas, 130 são empréstimos, em parte raros, provenientes de coleções internacionais e privadas, também dos Estados Unidos e do Japão.

Exposição "Construção do mistério" transformou espaço da Pinakothek der Moderne de MuniqueFoto: Bayerische Staatsgemäldesammlungen, Foto: Haydar Koyupinar

Na linha de Da Vinci e Goethe

Nascido em 18 de dezembro de 1879 em Münchenbuchsee, Suíça, Paul Klee consta entre os mais importantes artistas do modernismo clássico. Sua vasta obra segue diversas correntes estilísticas, do expressionismo ao construtivismo, passando pelo surrealismo. Ele estava sempre experimentando novas formas e técnicas; conhecimentos da ciência e da tecnologia influenciavam sua obra, da mesma forma que as impressões de suas numerosas viagens ao sul da Europa e norte da África.

Ele se via como artista universal, que – assim como um Leonardo da Vinci ou Wolfgang von Goethe – busca a perfeição divina como pintor, poeta, músico, cientista natural e filósofo. Proveniente de uma família de músicos, passou a se dedicar à pintura em 1911, associando-se ao grupo artístico Der Blaue Reiter, liderado por Franz Marc e Wassily Kandinsky. Com este, travou amizade intensa, também no contexto da Bauhaus.

Gênio artístico universal Paul Klee aos 42 anos de idadeFoto: picture-alliance/akg-images

Já nessa época, Klee era fascinado pelo transcendental, o cosmos e seus planetas, os quais aparecem como símbolos em muitas de suas obras. "Klee estilizou a si mesmo, com grande sucesso, como artista da introspecção, distante do mundo, em diálogo apenas com os astros celestes e o cosmo", conta o curador Kase. Em seu diário, ele escreveria: "No aqui e agora, não sou de modo algum tangível."

Após a Primeira Guerra Mundial, Klee passou a atrair atenção também com seus textos sobre teoria da arte. "A arte não reproduz o visível, mas torna visível", afirmou em sua antologia Confissão criadora, de 1920.

"Essa noção programática combina com a jovem Bauhaus, com Johannes Itten, Lyonel Feiniger; e combina também com essa estação experimental de utopias", resume Kase. Um ano mais tarde, Gropius levou Klee para a Bauhaus Estatal, em Dessau, como "Formmeister" (mestre de formas).

 

Dentro e fora, forma e fundo se confundem; "Quarto das casas", 1921Foto: Galerie Kornfeld, Bern

"Construção do mistério"

A década de 1920 foi um período revolucionário na República de Weimar. Automóvel e telefone incrementaram a mobilidade, o fluxo de informação se acelerou; avanço tecnológico e industrialização transformaram a vida humana. Ao mesmo tempo, crescia um desejo de silêncio e romantismo, de um mundo distante da frenética realidade. Os artistas se ocupavam da metafísica, o ópio era a droga da época.

Também a Bauhaus se adaptou aos novos tempos, colocando-se a serviço da indústria, com seu design prático. "A Bauhaus se afasta fortemente de seu foco expressionista inicial, tornando-se uma escola de arquitetura e design que se ocupa da sociedade do futuro, da utopia do progresso", relata Kase. Em meados dos anos 20, a noção do artista universal deixara de ter relevância.

Artistas como o pintor Johannes Itten ou o dramaturgo Lothar Schreyer abandonaram a Bauhaus quando ela passou a se ocupar só de linhas, formas geométricas e construção rigorosa. Klee permaneceu por mais dez anos. Por que ele ficou e como "trabalhou", no sentido mais verdadeiro do termo, a época de transição, foi uma questão decisiva para o curador da Pinakothek der Moderne.

Em seus escritos, Klee praticamente não abordou o tema, mas "a tese da exposição é que ele trata disso em suas obras, que elas são os comentários e as reações ao construtivismo e à tecnologia". Fazendo figuras geométricas dançarem ludicamente num espaço sem princípio nem fim, conseguiu unir racionalidade e mistério em seus quadros.

"Ele aborda esse racionalismo, mas o acopla a sua própria imagem de mundo, e essa continua sendo a dominância do metafísico, a conexão com o transcendente", explica Kase. Klee chamava isso de "construção do mistério". Um paradoxo, pois não se pode construir um mistério, "mas Klee consegue integrar esse paradoxo em sua obra, e essa é, de certo modo, a receita secreta dele".

"Olhar do silêncio": formas geométricas dançam num espaço infinitoFoto: Hickey-Robertson, Houston

Depois da Bauhaus

Em 1931 Paul Klee deixou a Bauhaus, indo para a Academia de Arte de Düsseldorf. Dois anos mais tarde, com a ascensão do nazismo, foi difamado e demitido, e se retirou para as montanhas da Suíça. Em meados da década foi acometido de esclerodermia, uma doença autoimune rara, que levaria a sua morte, em 1940.

Ainda assim deixou uma abrangente obra de maturidade, que inclui os famosos quadros de anjos, em grande formato, e os com luas e astros celestes, presentes na mostra de Munique. Esses símbolos atravessam toda a sua criação, desde o início, como um fio de Ariadne.

A autoimagem artística de Klee, como gênio universal da arte que almeja ao divino, não mudou, mesmo depois dos tempos da Bauhaus. Justamente nos tempos atuais, Kase considera essa autoconcepção mais instigante do que nunca.

"Estamos confrontados com desafios comparáveis aos dos anos 20. Hoje se fala de sociedade informatizada, digitalização ou auto-otimização. Do outro lado, há sempre esse aspecto do romântico, do místico, do emocional. E nesse ponto acredito que Klee, com sua abordagem, também tem relevância para o nosso presente."

A mostra Paul Klee – Konstrukiton des Geheimnisses  pode ser visitada na Pinakothek der Moderne de Munique de 1º de março a 10 de junho de 2018.

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