Entrevista
10 de abril de 2008DW-WORLD.DE: Professor Lackner, o senhor espera com alegria o 8 de agosto, quando começam os Jogos Olímpicos de Pequim?
Michael Lackner: Eu já havia me alegrado mais. Por um lado, a China quer brilhar com o evento, por outro, pretende atingir certa homogeneização e certo progresso. A primeira expectativa, a abertura para fora e o encontro da juventude mundial em clima de paz e alegria, provavelmente não vai mais acontecer. No aspecto interno, temos de ver se o governo chinês conseguirá evitar protestos.
Foi errado conceder os Jogos à China?
Possivelmente foi uma escolha sem muita reflexão, pois se subestimou os protestos dos tibetanos, as atividades dos monges tibetanos, e também a força do controle, a intensidade da opressão que não atinge só os tibetanos, mas também o acesso dos chineses à mídia, à liberdade de opinião.
Os Jogos Olímpicos fomentariam os direitos humanos e a liberalização na China, jornalistas poderiam trabalhar livremente. Isto foi prometido pelo vice-prefeito de Pequim, Liu Jingmin, quando ainda era porta-voz do comitê de candidatura da cidade, antes de o Comitê Olímpico Internacional, em 2001, decidir que a capital chinesa seria sede dos Jogos. O que agora impede o governo chinês de cumprir a promessa?
Eu acredito plenamente que as promessas serão cumpridas! Segundo as últimas informações, durante as três semanas dos Jogos todos os hotéis internacionais e alguns cybercafés terão acesso irrestrito à internet. Por um lado, para que os jornalistas possam trabalhar e, por outro, talvez também para que informem que não tiveram problemas no acesso à internet. Este tipo de promessa tal governo naturalmente pode cumprir a qualquer tempo. Só que isso não acontecerá amplamente!
Se os Jogos não fossem na China, o ativista Hu Jia também teria sido condenado a três anos de prisão?
Pessoalmente, acho que ele teria sido condenado, pois nos últimos anos vivenciamos várias destas condenações. O único aspecto relevante é que Pequim não se deixa intimidar pelos Jogos Olímpicos e mantém a política de linha dura.
Com sua candidatura aos Jogos, a China apresentou-se como nação autoconfiante. Os Jogos estavam planejados para ser uma encenação perfeita: a entrada definitiva de um país bem-sucedido na comunidade internacional. Como os atuais danos à imagem da China irão se refletir nas relações entre a China e o Ocidente?
Assim como muitas outras pessoas, eu teria desejado que esta encenação perfeita também deixasse claro seu status no mundo. Pense em 1989, quando a indisposição durou alguns anos e levou praticamente à ruptura das relações. O tempo que vai durar agora também depende um pouco da memória do Ocidente.
A corrida com a tocha olímpica, planejada por Pequim para ser a "corrida da harmonia", foi marcada por tumultos e protestos. O governo chinês reagiu indignado à perturbação de sua encenação. Os protestos são contraproducentes?
Naturalmente que agora se agravam a situação e os ânimos. Não apenas no governo chinês, mas também entre a população da China, que simplesmente não fica sabendo o que se noticia aqui.
Com respeito à compreensão dos direitos humanos e ao significado da liberdade de opinião, parece que a China e o Ocidente têm sistemas de comunicação completamente diferentes. O que a China interpreta como uma conspiração antichinesa é visto pelo Ocidente como revolta legítima de uma minoria reprimida. É um fracasso da comunicação?
Com certeza. Realmente temos de fazer o possível para manter o diálogo. A pergunta é: com quem? No momento parece difícil manter um diálogo com o governo chinês sobre estas questões, especialmente sobre a questão do Tibete. Parece-me importante que prossiga o diálogo em áreas da cultura e das ciências. Pois me parece que o diálogo na economia, de qualquer maneira, continua.
De onde vem esta enorme solidariedade patriótica da população chinesa com seu governo?
O acesso dos chineses não é restrito apenas em relação à imprensa. Também a chamada "educação patriótica", que há pelo menos duas décadas atinge todos os chineses. Veja como é apresentada a história chinesa nos livros escolares! A questão da integridade territorial é bem central.
O que, em sua opinião, aconteceu realmente no Tibete em 11 de março e nos dias seguintes? Uma manifestação antichinesa de monges lamaístas pacíficos? Uma rebelião de jovens tibetanos frustrados e sem perspectivas, que se sentem cada vez mais estranhos no próprio país e atearam fogo em Lhasa – nos moldes da periferia de Paris?
As duas coisas aconteceram ao mesmo tempo. Há monges que seguem estritamente os princípios do Dalai Lama – e de Mahatma Gandhi –, de protestar sem violência. E há jovens frustrados. Esta sim é uma revolta! Sua estilização em manifestação pacífica só pode ter saído dos cérebros de jornalistas muito, muito pró-Tibete.
Como a China legitima seus direitos de dominar o Tibete?
Vejamos primeiro pelo lado contrário. Até 1911, os tibetanos, e também os mongóis, foram leais à Dinastia Manchu. Os lamas eram os orientadores espirituais dos soberanos manchus e, portanto, tinham uma influência civilizadora sobre a China. Em contrapartida, em relação ao Estado nacional chinês, que começou a se formar em 1911, não havia nenhuma sensação de lealdade. Por isso a situação hoje é tão difícil. Trata-se de um império, talvez o último império da Terra, que argumenta com critérios e conceitos de Estados nacionais – como a homogeneização e a integridade territorial. Se pudéssemos sugerir algo aos chineses, seria a retransformação em império, que permitisse mais tolerância. Esta é a questão fundamental. Mas não veremos isto acontecer nem com este governo, nem com este partido.
O senhor vê uma mínima chance para uma solução pacífica da questão do Tibete? Algum dia haverá conversas diretas com o Dalai Lama?
Atualmente, certamente não, o ambiente está muito envenenado.
Michael Lackner é professor de Sinologia (ciência que trata da história, da língua, da escrita, das instituições e dos costumes chineses).