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Pete Buttigieg, surpresa que pode virar esperança democrata

7 de fevereiro de 2020

Até pouco tempo um desconhecido dentro do próprio partido, jovem concorrente sai fortalecido da primária de Iowa. Ele é cristão, abertamente gay, fala várias línguas e tem um nome que poucos sabem pronunciar.

Pete Buttigieg
Pete Buttigieg tem pouca experiência, mas forte apelo entre eleitores liberais e conservadoresFoto: picture-alliance/Xinhua/J. Lerner

A confusa primária democrata em Iowa lançou os holofotes sobre um nome novo – e quase impronunciável – na política dos Estados Unidos: Pete Buttigieg, que oficialmente venceu a primária por uma pequena margem sobre o concorrente Bernie Sanders: 26,2% dos votos contra 26,1%, segundo o resultado divulgado na noite desta quinta-feira (06/02).

"Boot edge edge" está escrito em camisetas da campanha do jovem candidato, de apenas 38 anos. É uma pronúncia aproximada do sobrenome, que em português seria algo como But-tidj-idj e que tem origem maltesa, assim como o pai dele, e significa comerciante de aves.

Esse nome incomum talvez ainda não provoque desconforto ao presidente Donald Trump, mas isso pode mudar logo se Buttigieg continuar sua ascensão – em vários aspectos, ele é um perfeito contraponto ao atual ocupante da Casa Branca.

Para começar, pela sua postura moderada e contida, que ele fez questão de ressaltar depois do triunfalista e por várias vezes vulgar discurso da vitória de Trump, nesta quinta-feira, após a absolvição no processo de impeachment.

"Estar no comando não tem nada que ver com se exaltar", comentou o democrata perante apoiadores, sem se referir diretamente ao presidente.

Buttigieg acrescentou que aprendeu isso quando estava servindo no Afeganistão – outro forte contraponto a Trump. O jovem democrata atuou na inteligência da Marinha americana e serviu no país durante sete meses, em 2014. Para isso deixou de lado suas atividades políticas.

Trump, por sua vez, não tem qualquer experiência militar e escapou de ir para a Guerra do Vietnã com um atestado médico que muitas pessoas nos Estados Unidos põem em dúvida.

Camisetas e material de campanha de Pete Buttigieg em Des MoinesFoto: picture-alliance/dpa/C. Merey

"A bandeira dos Estados Unidos e o amor pelo nosso país não pertencem a nenhum partido político", declarou o democrata recentemente, em outra declaração aparentemente dirigida a Trump, perante veteranos em Merrimack, New Hampshire, estado onde será a próxima primária (caucus).

Se ele for mesmo escolhido candidato pelo Partido Democrata, será a primeira vez desde 2008, quando os republicanos concorreram com o falecido John McCain, que uma pessoa com respeitável experiência militar concorrerá à Presidência por um dos dois grandes partidos.

O ponto fraco de Buttigieg está na sua parca experiência política. Ele foi prefeito de South Bend, uma cidade de médio porte no estado de Indiana, de 2012 até o fim de 2019, o que lhe rendeu o apelido de "Mayor Pete" (prefeito Pete). Mesmos seus oponentes dentro do partido já exploraram sua inexperiência em nível nacional.

O ex-vice-presidente Joe Biden declarou que há um risco em escolher como candidato alguém que "nunca ocupou um posto maior do que prefeito de uma cidade de 100 mil habitantes em Indiana".

Uma explicação para o sucesso de Buttigieg pode estar na sua capacidade de atrair tanto liberais como conservadores – em franco contraste com Bernie Sanders e Elizabeth Warren, que agradam à ala esquerdista dos democratas. Além de ser militar e dar declarações de amor à pátria, o jovem pré-candidato fala abertamente sobre sua fé cristã – de formação católica, ele é hoje membro da Igreja Episcopal, que faz parte da Comunhão Anglicana.

Ele estudou na escola católica secundária Saint Joseph High School, em South Bend. Como Buttigieg escreveu em sua biografia, "lá não apenas aprendemos a doutrina da Igreja sobre temas como sexualidade e aborto, mas também a compreender a história da igreja como a voz dos oprimidos".

No mesmo livro, ele conta que teve um despertar religioso quando viu, em sala de aula, um filme sobre o arcebispo salvadorenho Óscar Arnulfo Romero, que foi assassinado em 1980, quando rezava uma missa para criticar a repressão do regime militar de direita em El Salvador.

Depois, Buttigieg continuou seus estudos sobre religião na Universidade de Harvard, onde foi pupilo do acadêmico puritano Sacvan Bercovitch.

Marido Chasten é presença constante na campanha de Buttigieg Foto: picture-alliance/dpa/AP/C. Neibergall

Sua conversão à fé anglicana pode ajudar a explicar a combinação de fervor religioso com valores progressistas, pois a Igreja Episcopal dos EUA adota uma teologia mais liberal – por exemplo a favor dos casamentos entre pessoas do mesmo sexo e de direitos iguais para pessoas LGBT – e, em 2003, elegeu seu primeiro bispo assumidamente gay. É também vista como a "igreja do establishment", pois 11 presidentes dos EUA eram anglicanos.

Buttigieg é assumidamente gay. Ele tornou sua preferência sexual pública em 2015 e, em 2018, casou com seu namorado, o professor secundarista Chasten Glezman, que ele conhecera num site de namoros e que hoje é presença constante na campanha eleitoral.

O jovem democrata também cultiva um lado intelectual. Além de ter estudado em Harvard, passou por Oxford e se formou nas duas universidades. Antes de ingressar na política, trabalhou como consultor na McKinsey. Fala ao menos cinco línguas estrangeiras: francês, espanhol, italiano, maltês e árabe, além de "arranhar" no dari e no norueguês. Toca piano e violão.

Buttigieg festejou o resultado de Iowa, que chamou de fenomenal. Ele lembrou que, quando começou sua campanha, há um ano, ninguém o conhecia, ele tinha "apenas quatro funcionários e nenhum dinheiro".

Se chegar mesmo à Casa Branca, Buttigieg não apenas será o primeiro presidente assumidamente gay dos EUA, mas também o mais jovem – mais um contraste com Trump, que, aos 70 anos, foi o mandatário mais velho a assumir a Presidência.

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