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Petróleo da Venezuela volta a se tornar interessante

Tobias Käufer
10 de março de 2022

Há anos potências ocidentais punem violações de direitos humanos na Venezuela com sanções, também contra setor petroleiro. Guerra na Ucrânia faz EUA considerarem recorrer ao país para compensar petróleo russo boicotado.

Tubulações de refinaria de petróleo
Refinaria alemã alimentada com petróleo russo: após boicote, Ocidente procura alternativasFoto: Patrick Pleul/dpa-Zentralbild/picture alliance

A sugestão dos Estados Unidos, de compensar com importações da Venezuela as lacunas de abastecimento geradas pelo boicote ao petróleo da Rússia, causa agitação em Caracas. Poucos dias após as conversações entre representantes governamentais e uma delegação americana de alto escalão, governo e oposição reagem com mensagens emocionais.

"Espero que eles entendam que fazer negócios com Maduro significa sujar as mãos de sangue", condenou a oposicionista Delsa Solórzano, decepcionada, dirigindo-se a Washington. Por sua vez, o polêmico presidente venezuelano, Nicolás Maduro, se deleita com os desdobramentos políticos: "A Venezuela se encontra na vanguarda das iniciativas para estabilização do mercado de petróleo, gás e energia", declarou na emissora estatal VTV, no começo da segunda semana de março.

Poucos dias após Moscou iniciar a invasão da Ucrânia, parece que o país sul-americano pode se tornar um vencedor da crise global de energia, pois possui o que os EUA e outros precisam como alternativa às fontes russas.

"Devido a suas reservas de petróleo, a Venezuela ocupa uma posição-chave na América do Sul. Por muito tempo colocada de escanteio pelos EUA, ela emergirá fortalecida deste conflito e poderá lucrar, tanto econômica quanto politicamente. São os paradoxos de certos conflitos", analisa para a DW o cientista político Jacques d'Adesky, da Universidade Federal Fluminense (UFF), no Rio de Janeiro.

Muito petróleo, indústria deficiente

A produção petrolífera atual venezuelana é de 700 mil barris por dia, e Maduro promete quase triplicá-la, para até 2 milhões de barris. Em 2020, a consultora IHS Markit estimava em apenas 200 mil barris diários a produção real do país.

Diante da recente explosão dos preços do combustível, um incremento significativo da extração representaria enorme aumento das divisas para o país em crise. Mais de 6 milhões de cidadãos já o abandonaram nos últimos anos, tanto devido à catastrófica situação de abastecimento e segurança, quando à repressão estatal.

No entanto o estado da indústria petrolífera venezuelana é considerado desolador, e numerosos técnicos do setor já deixaram o país. Além disso, devido a suas propriedades físicas, o petróleo nacional só pode ser processado em relativamente poucas refinarias, algumas das quais se situam nos EUA.

Assim, o especialista em assuntos venezuelanos Geoff Ramsey, do Washington Office on Latin America (Wola), afirmou ao jornal El Nacional, crítico a Maduro, que a Venezuela não tem como substituir as exportações russas, por não possuir as capacidades de produção requeridas. Por sua vez, o governo dos EUA frisou que não suspenderá as sanções contra Caracas se não houver progressos nos campos da democracia e dos direitos humanos.

Nicolás Maduro (esq.) e Vladimir Putin em 2018: Venezuela está seriamente endividada com a Rússia, afirmam observadoresFoto: Maxim Shemetov/AFP/Getty Images

Direitos humanos e declínio do setor petrolífero

Nos útlimos tempos, tanto organizações de direitos humanos como a Human Rights Watch e a Anistia Internacional, quanto a alta comissária da ONU para o setor, Michele Bachelet, têm registrado na Venezuela graves violações dos direitos fundamentais democráticos, execuções sem processo jurídico e repressão estatal pelas forças de segurança. O Tribunal Internacional de Justiça, em Haia, já abriu inquérito contra o governo do país.

Como essas imputações são a base das sanções dos EUA e da União Europeia, seria difícil justificar politicamente Washington renunciar ao petróleo da Rússia devido às violações dos direitos humanos na Ucrânia, mas substituí-lo com importações de outro país que está igualmente em descrédito.

Assim, a oposição venezuelana liderada pelo autoproclamado presidente interino Juan Guaidó exige avanços concretos nas negociações entre os americanos e o governo Maduro, no sentido de uma transição democrática.

Em 1960 a Venezuela contava entre os cinco membros fundadores do poderoso cartel Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep). Calculam-se as jazidas do país em mais de 300 bilhões de barris, o equivalente a cerca de um quarto do total mundial das reservas comprovadas.

Até 2007, a petroleira estatal PDVSA ainda compunha a espinha dorsal da economia venezuelana, com faturamento anual de 96,2 bilhões de dólares e lucro operacional de 25,9 bilhões de dólares. Má gestão e sanções crescentes por violações dos direitos humanos reduziram esse faturamento a apenas 12 bilhões de dólares, em 2015.

Segundo a mídia crítica a Caracas, atualmente as partidas de petróleo do país já estariam penhoradas para a China e a Rússia. A multinacional estatal russa Rosneft, em especial, tornou-se um parceiro extremamente influente. Cabe agora observar como esses dois Estados credores reagirão a uma guinada da Venezuela em direção ao mercado americano.

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