Petrobras e outras petrolíferas não cumprem metas climáticas
20 de março de 2024Quase uma década após o histórico Acordo de Paris de 2015, as empresas de petróleo e gás não estão nem perto de cumprir as metas para limitar o aquecimento global a 1,5 grau Celsius – meta que, por si só, está se tornando cada vez mais improvável.
Essa é a avaliação do último relatório da Carbon Tracker, think tank sediado em Londres que monitora como os mercados financeiros e os investimentos podem afetar as mudanças climáticas. A avaliação comparou 25 das maiores empresas de petróleo e gás do mundo, incluindo a BP, a TotalEnergies, a PetroChina e a Saudi Aramco. A brasileira Petrobras ficou entre as cinco empresas com pior avaliação no levantamento.
"Empresas de todo o mundo estão declarando publicamente que apoiam as metas do Acordo de Paris e afirmam ser parte da solução para acelerar a transição energética", disse Maeve O'Connor, analista de petróleo e gás da Carbon Tracker e autora do relatório. "Infelizmente, porém, vemos que nenhuma delas está atualmente alinhada com os objetivos do Acordo de Paris", acrescentou.
O relatório visa responsabilizar as empresas e influenciar a ação climática, conscientizando os investidores sobre os riscos da dependência contínua de combustíveis fósseis, cuja queima é a maior contribuição para o aquecimento do planeta.
BP teve melhor classificação
Depois de analisar dados públicos, o Carbon Tracker avaliou cada empresa de petróleo e gás em cinco áreas principais: planos de investimento, projetos aprovados recentemente, planos de produção, metas de emissões e políticas de remuneração de executivos, que podem ser usadas para recompensar os CEOs para aumentar a produção.
A empresa que se saiu melhor foi a gigante petrolífera britânica BP, embora sua nota tenha sido um fraco D (de uma classificação que vai de A até H). E uma análise mais detalhada feita pela Carbon Tracker apontou que a BP "ainda está explorando novas reservas em seis continentes e planejando um aumento significativo em seu portfólio [de gás natural liquefeito]".
Entre as principais empresas de petróleo e gás analisadas pela Carbon Tracker, a BP ainda é a única que pretende reduzir sua produção até 2030. Três outras empresas europeias – a espanhola Repsol, a norueguesa Equinor e a britânica Shell – se comprometeram a manter os volumes de produção inalterados. A Chesapeake Energy, sediada nos Estados Unidos, deveria reduzir sua produção em 2024, mas sua estratégia de longo prazo ainda não está clara.
A maioria das empresas avaliadas pelo Carbon Tracker, no entanto, ainda planeja expandir sua produção de combustíveis fósseis na próxima década. Num extremo, a multinacional americana ConocoPhillips pretende aumentar a produção em 47% nos próximos cinco a oito anos, em comparação com sua produção de 2022.
Esses planos de expansão parecem estar em desacordo com as tendências energéticas predominantes. Em sua Perspectiva Energética Mundial publicada no ano passado, a Agência Internacional de Energia (AIE) projetou que a demanda por combustíveis fósseis começará a diminuir em um futuro próximo.
"O impulso por trás das transições de energia limpa é agora suficiente para que a demanda global por carvão, petróleo e gás natural atinja um ponto alto antes de 2030", disse o relatório da AIE. Isso abre o risco de excesso de oferta e de que essas grandes empresas tenham que abandonar alguns de seus planos de expansão.
"As empresas devem estar cientes de como a mudança de combustíveis fósseis para tecnologias limpas pode afetar seus resultados", disse em setembro Mike Coffin, principal especialista em petróleo, gás e mineração da Carbon Tracker. "Elas continuam a colocar os investidores em risco ao não planejarem cortes de produção à medida que a transição energética ganha ritmo."
Petrobras entre as piores do ranking
Quatro das cinco empresas com maior pontuação são sediadas na Europa. A parte inferior da tabela é dominada por empresas da Arábia Saudita, do Brasil e, predominantemente, dos Estados Unidos.
A brasileira Petrobras figura entre as companhias com pior desempenho, segundo o relatório, aparecendo entre as cinco pior colocadas, no bloco com nota G, a segunda pior avaliação, juntamente com a americana ExxonMobil, a saudita Saudi Aramco e a americana Pioneer. A ConocoPhillips é a única a ter recebido a nota H, a mais baixa.
Essas empresas obtiveram uma pontuação muito baixa quando classificadas em relação às metas de emissões estabelecidas no Acordo de Paris. Apenas uma empresa – a italiana ENI – tem metas que, segundo o Carbon Tracker, estavam "potencialmente" alinhadas com os objetivos de Paris. Isso quer dizer que ela pretende atingir emissões líquidas zero até 2050 em todo o ciclo de vida de seu combustível, desde a operação de usinas de petróleo e gás até a fumaça liberada quando o combustível é queimado em carros e processos industriais.
Em sua análise de 2023, a AIE disse que a maioria das empresas ainda está concentrada apenas na redução das emissões da produção, transporte e processamento de petróleo e gás, que representam cerca de 15% do total de emissões de gases de efeito estufa relacionadas à energia na fonte.
"Apenas uma fração desses compromissos corresponde ao ritmo de declínio observado no cenário [de emissões líquidas zero em 2050], e a maioria planeja usar compensações para atingir suas metas", disse o relatório – na prática, elas planejam financiar projetos de redução de emissões em outros lugares, em vez de se concentrarem na redução de suas próprias emissões.
Faye Holder, que investiga as reivindicações das empresas petrolíferas para a ONG Influence Map, disse ao programa Planet A da DW que as empresas de combustíveis fósseis não estão mudando no ritmo necessário para acompanhar as demandas de energia em transformação no mundo.
"Elas também estão fazendo lobby contra políticas que acelerariam essa mudança", disse ela. "Ao mesmo tempo, promovem essa narrativa muito pública de que estão fazendo tudo o que podem."
A Carbon Tracker disse que as empresas de combustíveis fósseis precisam se preparar para o inevitável rumo de afastamento do petróleo e do gás. Isso reduzirá sua exposição ao risco de investimento – e beneficiará o planeta.
"A transição energética já está em andamento, graças a um impulso inicial da ação política e um impulso da inovação tecnológica", disse o relatório. "Mas ela precisa ser ainda mais acelerada, para que possamos cumprir as metas do Acordo de Paris e minimizar o aumento das temperaturas."