PF coloca fogo em balsas de garimpo ilegal no rio Madeira
29 de novembro de 2021
Dragas estavam abandonadas próximo à região onde ocorria há algumas semanas "corrida do ouro". Lentidão do governo em agir e anúncio com antecedência da operação deram tempo para garimpeiros fugirem.
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Uma operação policial localizou e queimou no sábado (27/11) pelo menos 69 balsas que estavam sendo usadas por garimpeiros no rio Madeira, no Amazonas, para explorar ouro de forma ilegal. Elas estavam abandonadas nas margens do rio, e apenas um homem foi preso.
A "corrida do ouro" no rio Madeira estava ativa pelo menos desde o início de novembro, segundo o Greenpeace. O frenesi de garimpeiros teria começado após um boato sobre uma embarcação ter encontrado ouro na região da cidade de Autazes, a pouco mais de 100 quilômetros de Manaus. Rapidamente, pelo menos 300 balsas rumaram para aquele trecho do rio. No estado do Amazonas, garimpar ouro no rio Madeira é ilegal.
As imagens das centenas de balsas de dragagem perfiladas foram divulgadas em diversos veículos de comunicação na última terça-feira. Na quinta, o vice-presidente Hamilton Mourão, que preside o Conselho Nacional da Amazônia, anunciou que a Polícia Federal e a Marinha preparavam uma operação contra as balsas ilegais na região, o que deu tempo para os garimpeiros se dispersarem. Na manhã de sexta, poucas embarcações ainda estavam no mesmo trecho do rio.
No sábado, a PF deflagrou a operação Uiara, com apoio da Marinha e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). Além da prisão de um homem, os policiais apreenderam mercúrio e ouro no local. A operação foi comemorada pelo ministro da Justiça, Anderson Torres, no Twitter.
O Greenpeace afirmou que boa parte das dragas destruídas já havia saído da cidade de Autazes e foram localizadas em cidades vizinhas, como Nova Olinda do Norte. "Esta ação prova que o Brasil tem capacidade para enfrentar a ilegalidade e garantir a proteção dos nossos rios, florestas e comunidades tradicionais. Basta vontade política!", afirmou a entidade no Twitter.
O Greenpeace pediu que o governo desenvolva ações semelhantes em outros territórios que atualmente sofrem com o garimpo ilegal, como as terras indígenas Munduruku, Yanomami e Kayapó.
O Ministério Público Federal acionou na sexta-feira o Tribunal de Contas da União para apurar se houve alguma omissão dos órgãos de fiscalização, como a PF e o Ibama, que teria permitido a atividade das dragas nas últimas semanas.
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Risco de contaminação
Movidas por motores a diesel, as dragas sugam um grande volume de sedimento acumulado no fundo do rio, que é despejado sobre um espécie de carpete. Os fragmentos de ouro sugados junto com a terra são recuperados com a ajuda do mercúrio, que tem a capacidade de se unir a outros metais e formar amálgamas.
Após essa etapa, o calor de um maçarico separa os dois metais, já que o mercúrio se liquidifica e evapora numa temperatura inferior do que o ouro. No fim do processo, normalmente, as partes que não interessam, como os restos contaminados, são jogados de volta ao rio.
Um dos maiores problemas do uso mercúrio é o impacto causado no ambiente e na saúde: ele contamina peixes que podem virar alimento e se acumula no corpo humano. Os sistemas nervoso e imunológico podem ser afetados, assim como pulmões e rins, com sintomas que vão de tremores a perda de memória - e, em casos extremos, morte.
Uma pesquisa realizada pela Universidade Federal de Minas Gerais com o Ministério Público Federal divulgada em julho apontou que apenas 34% das 174 toneladas de ouro exportadas pelo Brasil em 2019 e 2020 tinham origem legal comprovada.
bl (ots)
Ouro amazônico: do barro ao luxo
Um retrato da extração mineral e de seus impactos na região no município de Jacareacanga, no Pará.
Foto: Gustavo Basso/DW
Igarapés revirados
De acordo com o Ministério Público Federal (MPF), o solo revirado pelo maquinário pesado utilizado no garimpo acaba liberando mercúrio mineral no ambiente. Somado ao mercúrio lançado na atmosfera para extração do ouro, torna-se um contaminante perigoso na cadeia pesqueira da bacia do rio Tapajós. A imagem aérea mostra garimpos montados ao longo de um igarapé no município de Jacareacanga, no Pará.
Foto: Gustavo Basso/DW
Clareira e assoreamento
Defensores da atividade afirmam que a área desmatada para a exploração do ouro é menor do que em atividades como a criação de gado ou plantio de soja, sem levar em consideração o assoreamento de igarapés e rios, visto como problema ambiental crucial pela Polícia Federal. Na imagem, vê-se um garimpo montado às margens da Rodovia Transamazônica (BR-230) em Jacareacanga.
Foto: Gustavo Basso/DW
Oportunidade de negócio
Com o aumento intenso da mecanização dos garimpos na última década, o reparo e venda de peças para escavadeiras e tratores vêm se tornando um mercado cada vez maior e lucrativo em Jacareacanga. Alan Carneiro, um dos principais nomes na luta pela legalização do garimpo de ouro na região, veio de Rondônia há quatro anos para aproveitar este mercado.
Foto: Gustavo Basso/DW
A outra margem do rio
Diariamente partem do porto improvisado de Jacareacanga dezenas de lanchas e balsas transportando pessoas e produtos para os garimpos na região, na outra margem do rio Tapajós. Do outro lado do rio estão somente áreas federais protegidas: as TIs (Terra Indígenas) Sai-Cinza e Mundurucu, e a Floresta Nacional do Crepori. O garimpo de ouro é vetado atualmente em ambas áreas.
Foto: Gustavo Basso/DW
Vaidade dourada
Joias de ouro como anéis e relógios são utensílios obrigatórios utilizados por garimpeiros e aqueles que se relacionam com a atividade, como este minerador, morador da vila de São José do Pacu.
Foto: Gustavo Basso/DW
Trabalho feminino, universo masculino
Cozinheiras são as únicas presenças femininas em campo nos garimpos, responsáveis pelas cinco refeições diárias, bancadas pelos patrões. Ao contrário dos garimpeiros, que recebem uma porcentagem do ouro extraído, as cozinheiras recebem como salário 20 gramas de ouro por mês, avaliado em Jacareacanga em torno de R$ 5.000, mais de três vezes a média salarial do Norte e Nordeste do país
Foto: Gustavo Basso/DW
Matéria bruta
Para extrair em média 300 g em um intervalo de duas semanas, os barrancos são escavados até que o cascalho subterrâneo seja exposto; é onde fica depositado o ouro de erosão, até 30 metros sob o solo. O garimpo atualmente é compreendido como atividade empresarial industrial de pequena escala, dado o impacto e investimento empregado na atividade.
Foto: Gustavo Basso/DW
Eletricidade a diesel
Todos os dias milhares de litros de óleo diesel são consumidos por todo tipo de veículos e maquinário pesado utilizado no suporte à extração do ouro. Os geradores de energia elétrica são presença geral e barulhenta em regiões dentro de áreas protegidas aonde a energia elétrica não chega.
Foto: Gustavo Basso/DW
Atividade artesanal ou pequena empresa?
Para o procurador federal Paulo de Tarso Oliveira, a sociedade necessita debater o garimpo e seus impactos. Segundo ele, uma atividade que emprega maquinários caros como balsas de até R$ 2 milhões não pode ser considerada artesanal como na época da Constituição Federal de 1988.
Foto: Gustavo Basso/DW
Várzeas ameaçadas
O ouro de garimpo é extraído nos "baixões": áreas de várzea às margens de igarapés, onde o minério lavado pelas chuvas se acumula. A contaminação por mercúrio e assoreamento dos igarapés é um dos grandes impactos da exploração além do desmatamento de áreas protegidas legalmente pela União. Na foto, um barraco abandonado em área de garimpo às margens da Rodovia Transamazônica (BR-230).
Foto: Gustavo Basso/DW
Atrativo aos retirantes
Como muitos outros retirantes da pobreza no nordeste, José Freitas, de 69 anos, veio para a região do Tapajós nos anos 1980 tentar a sorte no garimpo. Após anos trabalhando manualmente, acabou se assentando em Itaituba, onde comprou um terreno para plantar alimentos vendidos no mercado municipal.