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PF faz operação contra propagadores de fake news

27 de maio de 2020

Agentes cumprem mandados contra aliados de Bolsonaro que difundem ou financiam notícias falsas. Entre os alvos estão o ex-deputado Roberto Jefferson, o empresário Luciano Hang e nomes ligados ao "gabinete do ódio".

Luciano Hang
O empresário Luciano Hang, um dos alvos da PFFoto: Imago Images/Fotoarena/D. Portugal

A Polícia Federal cumpre nesta quarta-feira (27/05) 29 mandados de busca e apreensão no âmbito do chamado inquérito das fake news. A operação mira aliados do presidente Jair Bolsonaro, entre eles o ex-deputado e presidente do PTB Roberto Jefferson; as deputadas federais Bia Kicis (PSL-DF) e Carla Zambelli (PSL-SP); o empresário Luciano Hang, dono da rede Havan; o blogueiro Allan dos Santos, do site Terça Livre; a ativista de extrema direita e ex-assessora do Ministério da Família Sara Fernanda Giromini, conhecida como "Sara Winter"; e o deputado estadual Douglas Garcia (PSL-SP).

As ordens foram expedidas pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), relator do inquérito, que apura ofensas, ataques e ameaças contra ministros da Corte.

As ordens de busca e apreensão estão sendo cumpridas em São Paulo, Distrito Federal, no Rio de Janeiro, em Mato Grosso, no Paraná e em Santa Catarina.

O inquérito das fake news foi aberto em março de 2019, por meio de uma portaria do ministro Dias Toffoli, num movimento incomum. À época, a medida gerou críticas da Procuradoria-Geral da República (PGR), ainda comandada por Raquel Dodge, porque a investigação foi aberta pelo próprio Supremo, sem que o tribunal fosse acionado pelo Ministério Público ou pela polícia.

Em abril deste ano, em meio às investidas do Planalto para trocar o comando do PF, o ministro Alexandre de Moraes, do STF determinou que os delegados responsáveis pelo inquérito não podem ser substituídos, como forma de blindar as apurações.

Segundo uma reportagem do jornal Folha de S.Paulo publicada no final de abril, os investigadores da PF identificaram o vereador Carlos Bolsonaro, o filho "02" do presidente, como um dos líderes de um esquema criminoso de produção e propagação de notícias falsas. De acordo com a Folha, além de identificar Carlos, a PF investiga a participação de outro filho do presidente, o deputado Eduardo ("03"), no esquema de fake news. Apesar disso, os nomes dos dois não constam entre os mandados desta quarta-feira.

Entre outros alvos dos mandados estão o deputado federal Daniel Silveira (PSL-RJ), que se notabilizou em 2018 por rasgar uma placa em homenagem à vereadora assassinada Marielle Franco; o humorista Rey Biannchi; o empresário Edgard Corona, da rede de academias Smart Fit; entre outros.

Os empresários Corona e Hang são apontados como financiadores do esquema. Todos os alvos desta quarta-feira são conhecidos por disseminar em suas redes sociais boatos, calúnias e ataques virulentos contra críticos do bolsonarismo.

O blogueiro Allan dos Santos, por exemplo, já publicou informações falsas sobre jornalistas que fizeram reportagens investigativas sobre o governo Bolsonaro. Seu site também é um repositório permanente de difusão de teorias conspiratórias sobre temas como a pandemia de coronavírus.

O vereador Carlos Bolsonaro é suspeito de liderar esquemaFoto: Getty Images/AFP/S. Lima

Outros, como Roberto Jefferson, publicaram mensagens incitando violência. Recentemente, o ex-deputado, que já foi aliado dos ex-presidentes Fernando Collor, Luiz Inácio Lula da Silva e Michel Temer se metamorfoseou nos últimos meses em um bolsonarista radical, publicou no Twitter uma foto em que aparece segurando um fuzil com a legenda "contra os traidores". Sara Winter, por sua vez, vem propagandeado que estaria montando uma milícia para defender Bolsonaro. 

Após agentes terem vasculhado um de seus endereços, Jefferson reclamou da apreensão de seus computadores e armas e chamou o STF de "Tribunal do Reich", em referência ao regime nazista. "Atitude soez, covarde, canalha e intimidatória, determinada pelo mais desqualificado Ministro da Corte", escreveu no Twitter.

Ainda no âmbito do inquérito sobre fake news e ataques ao STF, o ministro Alexandre de Moraes cobrou explicações do ministro da Educação, Abraham Weintraub, sobre uma declaração feita na reunião ministerial de 22 de abril, cuja gravação em vídeo foi divulgada na semana passada. Na ocasião, Weintraub afirmou que os ministros do STF eram "vagabundos" que deveriam ser colocados "na cadeia". Agora, o ministro da Educação terá cinco dias para prestar depoimento à PF.

Moraes também é responsável pelo inquérito que apura a organização de atos antidemocráticos que pedem o fechamento do STF e do Congresso e até a volta do AI-5, o dispositivo da ditadura militar que marcou o início da fase mais repressiva do regime. Vários dos alvos desta quarta-feira também são investigados por envolvimento nos atos.

Após a operação ter sido deflagrada nesta quarta, o vereador Carlos Bolsonaro, filho do presidente, reclamou da ação da PF em sua conta no Twitter. "O que está acontecendo é algo que qualquer um desconfie que seja proposital", disse ele. "Querem incentivar rachaduras diante de inquérito inconstitucional, político e ideológico sobre o pretexto de uma palavra politicamente correta? Você que ri disso não entende o quão em perigo está!"

As suspeitas de uma eventual ligação de Carlos Bolsonaro com grupos difusores de fake news já remonta ao final do ano passado. Em dezembro, em depoimento à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) das Fake News, a deputada Joice Hasselmann (PSL-SP), ex-líder do governo no Congresso, denunciou um esquema de propagação de notícias falsas que funcionaria na sede da Presidência. Segundo ela, os mentores da rede são Carlos e Eduardo.

"Qualquer pessoa que eventualmente discorde [da família Bolsonaro] entra como inimigo da milícia", disse, acrescentando que o grupo atua com uma estratégia bem definida e organizada, começando com uma lista de pessoas consideradas "traidoras" e que são escolhidas como alvo dos ataques cibernéticos.

Um dos mais recentes "traidores" que vêm sendo alvo de ataques das redes de difusão bolsonaristas é o ex-ministro Sergio Moro. No mesmo dia da sua saída do governo, essas redes passaram a acusar Moro de ser "a favor do aborto", "de trair Bolsonaro", de ser "um tucano disfarçado" e até mesmo de ter sido leniente com a criminalidade.

Ao longo do ano passado, a artilharia das redes sociais já havia mirado outras figuras que ocuparam ministérios, como o general Santos Cruz e o cacique partidário Gustavo Bebianno, além de desafetos do Planalto, como o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Jornalistas que publicam matérias críticas ao governo também costumam entrar na mira dessa máquina de propagação de boatos e ataques, que foi apelidada de "gabinete do ódio".

JPS/ots

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