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Arte falsa

15 de agosto de 2010

Os artistas russos radicados na capital alemã têm uma clientela fiel, que valoriza as reproduções de clássicos de Da Vinci, Rubens, Rembrandt e inúmeros outros mestres.

Semyon, Mikhail e Evgeni PosinFoto: Christoph Richter

Velázquez, El Greco, Rembrandt e Rubens são nomes de velhos mestres que fazem o deleite dos fãs das artes plásticas. Mas para admirar as obras deles é necessário fazer longas viagens. Como, por exemplo, para o Prado, em Madri, para o Louvre, em Paris, ou até o Stedelijk Museum, em Amsterdã.

Poucas pessoas na Alemanha sabem que numa pequena rua do bairro berlinense de Neukölln é possível encontrar muitas obras dos mesmos gênios do pincel. O Kunstsalon Posin (salão de arte Posin) é um ateliê esfumaçado que pertence a três habilidosos falsificadores de arte. Dentro dele estão empilhadas centenas de conhecidas pinturas de velhos mestres de cinco séculos. Elas teriam um valor inestimável caso fossem verdadeiras.

As obras foram pintadas pelos falsificadores de arte russos Evgeni, Mikhail e Semyon Posin. Três pintores geniais com idades em torno dos 60 anos que parecem ter saído de uma outra época. Eles mesmo se denominam copiadores de arte.

Um canto do ateliê exibe clássicos da pintura, um acervo de valor inestimável, caso fosse legítimoFoto: DW/Oxana Evdokimova



Como se tivesse a história da arte na cabeça

As roupas de Evgeni Posin são manchadas de tinta, seu cabelo é fino e desgrenhado, o olhar é de poucos amigos, e o cigarro fica preso desleixadamente entre os lábios. Parece uma mistura de monge russo com personagem de Dostoiévski.

Evgeni finaliza um clássico do modernismo expressionista, Os cavalos azuis, de Franz Marc. Ele executa o trabalho com traços rápidos e seguros, sem auxílio de um modelo, como se toda a história da arte estivesse em sua cabeça.

Evgeni: misto de monge russo e figura de DostoiévskiFoto: DW/Oxana Evdokimova

Mikhail Posin é o caçula dos três irmãos e é o filósofo da família. Gosta de enfatizar que eles não copiam simplesmente os quadros e compara a falsificação de uma pintura com o nascimento de uma criança.

"Quando alguém encomenda uma pintura de, digamos, Rubens, nós conhecemos as técnicas de pintura dele, o estilo, a rapidez, o temperamento", diz Mikhail, "Nós não reproduzimos, mas reconstruímos uma obra de arte."

As obras dos três possuem uma perfeição tão assustadadora que são muito valorizadas pelos colecionadores de arte. E o que eles fazem não é crime, garante Evgeni Posin. A cópia de uma obra de arte é legal se tiverem decorrido ao menos 70 anos da morte do criador do original.

Fazer cópias exige uma habilidade especial com os pincéis. No caso da arte barroca, por exemplo, 80% é técnica e 20% é talento e inspiração, explica Semyon, o mais velho dos três irmãos.

Eles não se cansam de repetir que o trabalho deles não é somente reproduzir os originais da forma mais próxima possível da perfeição. Eles também querem dar uma alma aos trabalhos.

Dissidentes da União Soviética

Mikhail (e) e Semyon mostra algumas de suas obras expostas no ateliêFoto: DW/Oxana Evdokimova

As pinturas à venda no atelier custam alguns milhares de euros. Quanto mais antigo for o original, mais cara é a falsificação. Pois o estilo dos grandes mestres não é simples de copiar e os clientes não querem comprar um pôster, mas uma obra que reproduza o espírito de toda uma época. Por isso, os irmãos só trabalham à noite, uma maneira de esquecer a realidade cotidiana e submergir no mundo dos artistas.

Vivendo na Alemanha desde meados anos 80, os irmãos Posin vêm de uma família de intelectuais de Leningrado. A mãe era alemã, o pai, um japanólogo de São Petersburgo, que foi exilado para a Sibéria durante o regime de Stalin, tendo sido enviado para o Gulag, onde foi morto.

Ainda assim, as crianças puderam estudar graças ao grande talento delas. Os irmãos aprenderam a grande arte de copiar nos anos 70, quando estudavam na Academia de Arte de Leningrado. Eles tomaram rapidamente contato com a cena artística ilegal e se tornaram dissidentes, fugindo para o Ocidente.

Irmãos faturam cerca de 120 mil por ano

Quem encomenda uma obra recebe um pacote completo, que inclui a moldura. Os clientes vêm de todas as áreas, incluindo o ex-secretário de Cultura de Berlim, Christoph Stölzl, que encomendou recentemente três obras de arte modernas, e o dirigente de futebol Rainer Calmund. O faturamento anual dos irmãos Posin é estimado em 120 mil euros, quantia nada mal para uma época de crise.

Semyon Posin ao lado de uma cópia do "Vaso com três girassóis", de Van GoghFoto: Christoph Richter

Mas os irmãos Posin não pintam somente pelo dinheiro, mas também como uma forma de terapia para esquecer o período de repressão comunista na União Soviética. Desde 1984, quando deixaram a terra natal, eles nunca mais estiveram lá, assim como não tem artistas russos em seu repertório.

O maior orgulho deles é La Gioconda, a Mona Lisa, o famoso quadro de Leonardo da Vinci. Por conta da obra, eles visitaram várias vezes o Museu do Louvre, misturaram cores e utilizaram madeira antiga.

Agora, a bela mulher se encontra recostada na parede do atelier e aquece os corações deles diariamente. Os corações de três irmãos falsificadores, cuja perfeição é única no mundo.

Autor: Christoph Richter/Leah McDonnell (md)
Revisão: Alexandre Schossler