Renato Duque, ex-diretor da Petrobras, tem prisão temporária decretada após transferir 20 milhões de euros da Suíça para Mônaco, segundo Ministério Público. Outras quatro pessoas ligadas à estatal são detidas.
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Ao deflagrar a décima fase da Operação Lava Jato, a Polícia Federal (PF) prendeu preventivamente nesta segunda-feira (16/03) cinco pessoas envolvidas no escândalo de corrupção na Petrobras, entre elas o ex-diretor de Engenharia e Serviços da estatal Renato Duque.
Detido em dezembro do ano passado, o ex-diretor da Petrobras acabou sendo solto 19 dias depois, beneficiado por um habeas corpus concedido pelo ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal (STF). Ao mandar prender Duque novamente, o juiz Sérgio Moro destacou o fato de que, ao ser colocado novamente em liberdade, o acusado transferiu 20 milhões de euros de contas que mantinha na Suíça para bancos de Mônaco, segundo o Ministério Público Federal.
"O dinheiro que foi bloqueado em Mônaco sintetiza a necessidade de prisão de Renato de Souza Duque para a garantia da ordem pública", afirmou o procurador da República Roberson Henrique Pozzobon, um dos responsáveis pela décima fase da Lava Jato, que investiga crimes de associação criminosa, corrupção ativa e passiva, lavagem de dinheiro, uso de documento falso e fraude em licitação.
Pozzobon disse ainda ser necessário que Renato Duque, que não fechou acordo com o Ministério Público Federal, "tenha seus bens auferidos ilicitamente acautelados, seja no exterior ou no Brasil, de forma que os cofres públicos possam ser restituídos na sua integralidade". Pedro Barusco, que era gerente de serviços e subordinado de Duque, devolveu aos cofres públicos 97 milhões de dólares após ter celebrado acordo com o Ministério Público.
Duque foi apontado por dois delatores da operação da PF como um dos funcionários da estatal que recebiam propinas de empresas que assinavam contratos com a petroleira. Na casa de Duque, no Rio de Janeiro, foram apreendidas 131 obras de arte nesta segunda-feira.
Além do ex-diretor, também foram presos preventivamente o empresário paulista Adir Assad, investigado na CPI do Cachoeira, e Lucélio Góes, filho de Mário Góes, um dos suspeitos de intermediar o pagamento de propina pela empresa catarinense Arxo.
Entenda a Operação Lava Jato
A Polícia Federal apura, desde 2014, um esquema bilionário de lavagem e desvio de dinheiro envolvendo a Petrobras, grandes empreiteiras e políticos. Entenda a maior investigação sobre corrupção já conduzida no país.
Foto: AFP/Getty Images
O início
A Operação Lava Jato foi deflagrada pela Polícia Federal em 17 de março de 2014. Começou investigando um esquema de desvio de recursos públicos e lavagem de dinheiro e descobriu a existência de uma imensa rede de corrupção envolvendo a Petrobras, grandes empreiteiras do país e políticos. O nome vem de um posto de gasolina em Brasília, um dos alvos da PF no primeiro dia de operação.
Foto: picture-alliance/dpa/M. Brandt
O esquema
Executivos da Petrobras cobravam propina de empreiteiras para, em troca, facilitar as negociações dessas empresas com a estatal. Os contratos eram superfaturados, o que permitia o desvio de verbas dos cofres públicos a lobistas e doleiros, os chamados operadores do esquema. Eles, por sua vez, eram encarregados de lavar o dinheiro e repassá-lo a uma série de políticos e funcionários públicos.
Foto: Reuters/S. Moraes
As figuras-chave
O esquema na Petrobras se concentrava em três diretorias: de abastecimento, então comandada por Paulo Roberto Costa; de serviços, sob direção de Renato Duque; e internacional, cujo diretor era Nestor Cerveró. Cada área tinha seus operadores para distribuir o dinheiro. Um deles era o doleiro Alberto Youssef (foto), que se tornou uma das figuras centrais da trama. Todos os citados foram condenados.
Foto: imago/Fotoarena
As empreiteiras
As grandes construtoras do país formaram uma espécie de cartel: decidiam entre si quem participaria de determinadas licitações da Petrobras e combinavam os preços das obras. Os executivos da estatal, por sua vez, garantiam que apenas o cartel fosse convidado para as licitações. Entre as empresas investigadas estão Odebrecht, Andrade Gutierrez e Camargo Corrêa. Vários executivos foram condenados.
Foto: Reuters/P. Whitaker
Os políticos
O núcleo político era formado por parlamentares de diferentes partidos, responsáveis pela indicação dos diretores da Petrobras que sustentavam a rede de corrupção dentro da estatal. Os políticos envolvidos recebiam propina em porcentagens que variavam de 1% a 5% do valor dos contratos, segundo os investigadores. O dinheiro foi usado, por exemplo, para financiar campanhas eleitorais.
Foto: J. Sorges
De Cunha a Dirceu...
A investigação só entrou no mundo político em 2015, quando a Lava Jato foi autorizada a apurar mais de 50 nomes, entre deputados, senadores e governadores de vários partidos. Desde então, viraram alvo de investigação políticos como os ex-parlamentares Eduardo Cunha (foto) e Delcídio do Amaral, ambos cassados, os senadores Renan Calheiros, Fernando Collor e o ex-ministro José Dirceu.
Foto: Reuters/A. Machado
... e Lula
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva é réu em dez processos relacionados à Lava Jato, sendo acusado pelos crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e obstrução da Justiça. As denúncias indicam que Lula teria recebido benefícios das empreiteiras OAS e Odebrecht, envolvendo imóveis no Guarujá e São Bernardo do Campo. Em 2018, ele foi preso e teve uma nova candidatura à Presidência barrada.
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As prisões
A Lava Jato quebrou tabus no Brasil ao encarcerar altos executivos de empresas e importantes figuras políticas. Entre investigados e aqueles já condenados pela Justiça, estão o executivo Marcelo Odebrecht, ex-presidente da Odebrecht; Eduardo Cunha, ex-presidente da Câmara; Sérgio Cabral, ex-governador do Rio; os ex-ministros José Dirceu (foto) e Antonio Palocci, entre outros.
Foto: picture-alliance/dpa/EPA/H. Alves
As delações
Os acordos de delação premiada são considerados a força-motriz da operação. Depoimentos como o de Marcelo Odebrecht (foto) chegam com potencial para impactar fortemente a investigação. O acordo funciona assim: de um lado, os delatores se comprometem a fornecer provas e contar o que sabem sobre os crimes, além de devolver os bens adquiridos ilegalmente; de outro, a Justiça reduz suas penas.
Foto: Getty Images/AFP/H. Andrey
O juiz
Responsável pela Lava Jato na 1° instância, o ex-juiz federal Sergio Moro logo ganhou notoriedade. Em manifestações, foi ovacionado pelo povo e chegou a ser chamado de "herói nacional". Mas também foi acusado de agir com parcialidade política. Em 2018, deixou o cargo e aceitou ser ministro do presidente Jair Bolsonaro, cuja candidatura foi beneficiada pela prisão de Lula no ano anterior.
Foto: Getty Images/AFP/E. Sa
Expansão internacional
Se começou num posto de gasolina em Brasília, a Lava Jato ganhou proporções internacionais com o aprofundamento das investigações. Segundo dados do Ministério Público Federal levantados a pedido da DW Brasil, a investigação já conta com a cooperação de pelo menos outros 40 países (veja no gráfico acima). Além disso, 14 países, fora o Brasil, investigam práticas ilegais promovidas pela Odebrecht.
Um terremoto político
Ao longo de cinco anos, a Lava Jato influenciou o impeachment de Dilma Rousseff, enfraqueceu o governo Michel Temer e contribuiu para a derrocada de velhos caciques do PT, MDB e PSDB. Em 2018, Lula, então favorito para vencer as eleições presidenciais, foi preso e teve a candidatura barrada. As investigações também fortaleceram um discurso antissistema que beneficiou a campanha de Bolsonaro.
Foto: picture-alliance/dpa/ZUMAPRESS/C.Faga
Críticas e revelações
A Lava Jato também acumulou acusações de parcialidade e de abusos em seus métodos. Em 2019, os procuradores da força-tarefa foram duramente criticados por tentarem criar uma fundação para gerenciar uma multa bilionária da Petrobras. No mesmo ano, conversas reveladas pelo site "The Intercept" apontaram suspeita de conluio entre Moro e os procuradores na condução dos processos, o que é proibido.
Foto: Agência Brasil/F. Frazão
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Já Sônia Marisa Branco e Dario Teixeira Alves foram detidos temporariamente e devem ficar presos por apenas cinco dias. Um sexto mandado de prisão foi expedido contra Sueli Maria Branco que, segundo a PF, já morreu. Todos os presos foram encaminhados para a carceragem da Polícia Federal em Curitiba.
Segundo Pozzobon, as investigações que desencadearam a décima fase da Lava Jato identificaram que empresas que mantêm contratos com a Petrobras movimentaram mais de 100 milhões de reais em operações com características de lavagem de dinheiro.
Denúncia contra tesoureiro
O Ministério Público denunciou nesta segunda-feira à Justiça Federal 27 investigados na Operação Lava Jato. Entre eles estão o tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, Pedro Barusco, Renato Duque, o doleiro Alberto Yousseff e o ex-diretor de Abastecimento da Petrobras, Paulo Roberto Costa. Executivos de empreiteiras já investigados em outras fases da operação também fazem parte da lista encaminhada pelos procuradores.
Todos são acusados de crimes de lavagem de dinheiro e corrupção e serão julgados pelo juiz federal Sergio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba.
Segundo o Ministério Público, Vaccari Neto e Duque participaram de reuniões nas quais foram acertados valores que seriam transferidos ao PT por meio de doações legais. Vinte e quatro doações no valor de 4,26 milhões de dólares foram feitas ao todo, segundo o MPF.
Ameaça de rebaixar nota de empresas
Também nesta segunda-feira, a agência de classificação de risco Moody's ameaçou rebaixar a nota de todas as empresas sob investigação judicial no âmbito da Operação Lava Jato. "Para além das eventuais multas pecuniárias, a investigação ameaça prejudicar a reputação das empresas, enfraquecer a confiança dos investidores e reduzir seu acesso a financiamento das entidades públicas, dos mercados de capitais privados, dos bancos de desenvolvimento e das agências de financiamento multilateral", argumenta a Moody's.
Na semana passada, a Procuradoria Geral da República abriu investigação contra mais de dez empresas suspeitas de negociações ilícitas com a Petrobras, entre as quais estão as duas maiores empresas de construção e engenharia da América Latina, as construtoras Norberto Odebrecht e Andrade Gutierrez.
A Moody's acrescenta que, caso as investigações confirmem as acusações, as empresas poderão ficar vários anos de fora de concorrências públicas no Brasil, "o que causaria uma significativa contração de um setor que representa 25% a 30% do negócio" da Andrade Gutierrez.
No caso da Odebrecht, o panorama também é negativo, já que, por estar sob investigação, a empresa está impedida de celebrar novos contratos com a Petrobras, "o mais importante player no setor de petróleo e gás e a maior fonte de rendimento para as empresas ligadas a essa área".