Político alemão chama Memorial do Holocausto de vergonha
18 de janeiro de 2017
Björn Höcke, do populista AfD, causa indignação ao dizer que alemães são os únicos do mundo a terem um "monumento da vergonha" no coração de sua capital. Embaixador israelense exige pedido de desculpas.
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Políticos e organizações judaicas manifestaram repúdio nesta quarta-feira (18/01) às declarações feitas na véspera por um membro do partido populista de direita Alternativa para a Alemanha (AfD) sobre a cultura da memória do Holocausto no país.
Durante um comício voltado para a organização juvenil da sigla na cidade alemã de Dresden, Björn Höcke chamou o famoso Memorial aos Judeus Mortos da Europa, situado no centro de Berlim, de um "monumento da vergonha".
"É profundamente ofensivo e completamente inaceitável descrever o Memorial do Holocausto de Berlim como um 'monumento da vergonha'", disse em comunicado o presidente do Conselho Central de Judeus na Alemanha, Josef Schuster.
"Com estas observações antissemitas e extremamente misantrópicas, a AfD está mostrando seu verdadeiro rosto. Eu jamais acreditaria que um político na Alemanha pudesse dizer tais coisas 70 anos depois da Shoah", afirmou, utilizando o termo hebraico para designar o Holocausto.
As palavras de Schuster surgem um dia depois de Höcke, líder da AfD no estado alemão da Turíngia, dizer que a história alemã está se tornando "pavorosa e risível".
"Nós, alemães, ou seja, nosso povo, somos os únicos do mundo a ter plantado um monumento da vergonha no coração de sua capital", afirmou. E foi além: "Essas políticas estúpidas de enfrentar o passado nos paralisam – tudo que precisamos é uma virada de 180 graus na política da memória", afirmou o professor de história, que atualmente está de licença.
Em seu discurso de cerca de 40 minutos, Höcke foi ovacionado por uma plateia de pé e arrancou gritos de "Wir sind das Volk" (Nós somos o povo), lema associado aos protestos que ajudaram a pôr fim na ditadura comunista da Alemanha Oriental e a abrir o caminho para a Reunificação alemã nos anos 90.
Em nota nesta quarta-feira, Höcke se justificou dizendo que estava apenas criticando o peso dado ao Holocausto na forma como a Alemanha lida com sua própria história. Ele ameaçou processar quem descontextualizar suas palavras.
O discurso de Höcke provocou reações indignadas de todos os lados, inclusive de dentro de seu próprio partido.
Em entrevista ao jornal de direita Junge Freiheit, a chefe da AfD, Frauke Petry, chamou o político de um "fardo para o partido". "Nós temos que ser realistas, ou nos tornaremos politicamente irrelevantes", disse Petry ao semanário.
O líder da sigla na Renânia do Norte-Vestfália, Marcus Pretzell, também se distanciou de Höcke através do Facebook, dizendo que, mais uma vez, Höcke mexe "num período histórico de 12 anos, cuja revisão, na verdade, não cabe à AfD".
A polêmica também repercutiu na embaixada de Israel. Segundo o jornal Berliner Morgenpost, o embaixador israelense na Alemanha, Yakov Hadas-Handelsman, exigiu um pedido de desculpas de Höcke. "É uma vergonha que existam pessoas entre nós que querem tirar as consequências erradas da história alemã", disse o diplomata ao diário.
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O Memorial do Holocausto
Artístico, abstrato, imponente. O monumento lembra, desde 10 de maio de 2005, que foi em Berlim que o extermínio dos judeus europeus foi planejado e organizado. Hoje, ele é uma atração turística popular.
Foto: picture-alliance/Wolfram Steinberg
Monumento incomum
Normalmente, monumentos celebram heróis de uma nação. O Memorial do Holocausto de Berlim é exatamente o oposto. Ele é, como afirmou o famoso escritor Martin Walser, em 2011, "o primeiro monumento construído por um povo em memória de seus crimes". A construção recebe diariamente milhares de pessoas e fica 24 por dia aberto ao público.
Foto: picture-alliance/dpa/W. Kumm
Obra de arte imponente
Durante a Segunda Guerra Mundial, os nazistas assassinaram seis milhões de judeus. O genocídio é considerado o maior crime da história. "É um enorme monumento. Ele faz juz ao crime que se destina a lembrar. E o mais incrível é que ele é uma obra de arte", disse Walser. Na foto, é possível ver, ao fundo, a Potsdamer Platz.
Foto: picture-alliance/dpa/S. Stache
Como um campo ondulado
Em meados de 1998, foi apresentado o modelo para o memorial nas proximidades do Portão de Brandemburgo. Antes, houve uma concorrência. Quatro projetos foram escolhidos. Entre eles, o de um campo repleto de blocos de concreto, do arquiteto americano Peter Eisenman. O então chanceler alemão, Helmut Kohl, achou a ideia a melhor e se empenhou pela sua construção.
Foto: picture-alliance/dpa
O nascimento da ideia
A ideia para o Memorial do Holocausto nasceu em 24 de agosto de 1988, durante um painel de discussão em Berlim Ocidental. A jornalista Lea Rosh reivindicou a construção de um memorial na cidade. Sem a dedicação dela, o monumento não existiria. Ela fez do projeto seu objetivo de vida. Na foto, Rosh faz um discurso durante a inauguração simbólica das obras do monumento, em janeiro de 2000.
Foto: picture-alliance/Berliner_Zeitung
No coração de Berlim
A construção, no centro de Berlim, demorou vários anos. O monumento, de grandes dimensões, entre Reichstag, Portão de Brandenburgo e a Potsdamer Platz, é uma tarefa hercúlea. Ele foi construído em uma área de 19 mil metros quadrados, contendo 2.710 blocos de concreto, dispostos simetricamente. Todos eles ocupam a mesma área, mas têm diferentes alturas. Os custos foi de 27 milhões de euros.
Foto: picture-alliance/dpa
O Stonehenge de Berlim
O monumento se tornou uma atração turística. Todos os anos, centenas de milhares de turistas mergulham no mar de blocos de concreto, muitos deles judeus de diferentes países. O Memorial do Holocausto é um dos lugares mais visitados da capital alemã.
Foto: picture-alliance/Wolfram Steinberg
Detalhes sobre o Holocausto
Sob o campo de blocos de concreto, está um centro de informação. O museu complementa a forma abstrata da lembrança expressada pelo monumento. A exposição permanente dá nomes e rostos às vítimas, mostra destinos individuais e de famílias, suas vidas, sofrimento e morte. Não há imagens dramáticas. O terror se desenrola nas mentes dos visitantes.
Foto: picture-alliance/dpa/P. Grimm
Solidão e desorientação
O quanto mais fundo a pessoa entra no labirinto ondulante, mais aumenta a sensação de desorientação existencial. O visitante perde a noção de lugar. No meio de Berlim, é possível se estar infinitamente longe de tudo. A pessoa pode se sentir solitária, ameaçada, abandonada. É uma tentativa de transmitir a sensação, em escala menor, que a maioria das vítimas do Holocausto experimentou.
Foto: picture-alliance/dpa/O. Spata
O arquiteto
Peter Eisenman (82 anos), autor do memorial, se diz satisfeito que o monumento seja tão bem recebido, que crianças brinquem de se esconder, que jovens façam selfies e casais se beijem. Ele não tinha intenção de criar "um lugar sagrado". Ele também gosta do fato de que o memorial seja tão abstrato. "As pessoas não pensam nem em um campo de concentração ou sequer em algo terrível", ressalta.
Foto: picture-alliance/dpa/B. Pedersen
Convite à reflexão
"Não é possível organizar a forma como as pessoas se lembram do Holocausto", diz Peter Eisenman. Alguns vêm com flores, outros rezam, se sentam nos blocos, brincam, riem ou refletem. Em Berlim, todos são livres para decidir como querem se lembrar do Holocausto. O memorial está sempre aberto e livre. A lembrança também.