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Policiais recebem penas individuais de 624 anos por Carandiru

Ericka de Sá3 de agosto de 2013

Ao fim de cinco dias de julgamento, Justiça de São Paulo anunciou a sentença para os 25 acusados de matar 52 detentos na antiga Casa de Detenção, conhecida como Carandiru. Os policiais poderão recorrer em liberdade.

Foto: Marcelo Camargo/ABr

Na segunda etapa do julgamento do chamado "massacre do Carandiru", o júri considerou culpados os 25 policiais que atuaram no segundo pavimento da antiga Casa de Detenção, conhecida como Carandiru, em outubro de 1992.

O juiz Rodrigo Tellini de Aguirre Camargo, responsável por essa etapa do processo, leu a sentença na madrugada deste sábado (03/08). A pena para cada um é de 624 anos de reclusão em regime fechado, além da perda dos cargos públicos.

No último dos cinco dias de julgamento, Fernando Pereira, um dos promotores encarregados do caso, pediu a redução do número de vítimas para a segunda fase. Assim, os réus foram julgados pela morte de 52, e não de 73 detentos.

Durante o argumento final, o também promotor Eduardo Olavo Canto Neto afirmou que o julgamento era um "marco civilizatório". "Precisamos mudar essa mentalidade. Não queremos o país do jeito que ele é, de autoridade que vem de cima para baixo, de corrupção dominando tudo, e de polícia reprimindo e, às vezes, matando desnecessariamente", observou o jurista.

Réus e testemunhas

A primeira audiência da segunda etapa, na segunda-feira, foi dedicada aos depoimentos das testemunhas de acusação, entre elas ex-detentos e funcionários do presídio.

No segundo dia foram ouvidas seis testemunhas de defesa, sendo duas protegidas, duas por meio de vídeo e duas presenciais (o então governador de São Paulo, Luiz Antonio Fleury Filho, e Pedro Franco de Campos, secretário de Segurança Pública na época).

Sistema penitenciário brasileiro: um Carandiru a cada três anosFoto: picture alliance / dpa

Em seguida, foi a vez de cinco dos 25 réus. Dois acusados não compareceram, alegando problemas de saúde, e 18 optaram por usar o direito de permanecer em silêncio.

Depois disso, os jurados assistiram aos vídeos – um produzido pela defesa dos réus e outro, pelo Ministério Público – e depois puderam interrogar os réus. Na última parte do julgamento, acusação e defesa apresentaram os argumentos finais ao júri.

"Intervenção necessária"

Durante os depoimentos das autoridades da época, a versão de que os policiais agiram para se defender dos ataques dos presos foi reforçada. Pedro Franco de Campos sustentou que a decisão de invadir foi motivada pela necessidade de conter uma rebelião que poderia tomar proporções gigantescas. "Todos chegaram ao consenso de [que havia necessidade de] intervenção", disse o ex-secretário, referindo-se às consultas feitas a juristas e diretores de presídios na época.

Fleury Filho manteve a posição adotada na primeira etapa do julgamento, em abril. Ele reiterou que assume a responsabilidade política do fato, mesmo não se encontrando na cidade na época da invasão. Ainda assim, se tivesse que tomar novamente a decisão, não seria diferente. "A polícia tinha obrigação legal de agir", afirmou em seu depoimento da última terça-feira.

O perito criminal Osvaldo Negrini Neto, testemunha da acusação, descartou a versão sustentada pela defesa de que houvera confronto entre policiais e detentos. Apesar disso, os réus que depuseram afirmaram ter ouvido disparos de arma de fogo feitos pelos detentos.

"Eu portava naquele dia um revólver calibre 38 e uma metralhadora, e eu efetuei alguns disparos. Quantos, eu não sei, mas eu efetuei disparos. Efetuei mesmo", depôs na quinta-feira o tenente-coronel Salvador Modesto Madia, que na época comandava a Rota (Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar).

No dia anterior, o tenente-coronel Carlos Alberto Santos, que também comandava tropas que atuaram no massacre, alegou que a polícia atirou "para se defender".

Fases do processo

Devido à complexidade do caso, o processo foi dividido em quatro etapas, correspondentes a cada andar do Pavilhão 9, onde aconteceram as mortes. Os policiais estão sendo julgados em grupos, com base na localização de cada um deles no dia da invasão.

A primeira etapa, concluída em abril deste ano, durou seis dias. Nela, 23 policiais foram condenados a 156 anos de prisão, cada um, pela morte de 13 detentos. Outros três policiais foram absolvidos pelo júri. Enquanto a promotoria alegou que os condenados agiram em grupo, a defesa questionou a possibilidade de calcular penas individuais. Os réus recorreram e aguardam o julgamento dos recursos em liberdade.

Foto da primeira fase do processo, em abril de 2013Foto: picture-alliance/dpa

A terceira fase irá julgar a responsabilidade pela morte de oito detentos, enquanto os policiais que atuaram no quarto andar, onde foram mortos 15 prisioneiros, serão julgados na quarta fase.

Revolta e invasão

O massacre ocorreu em 2 de outubro de 1992. Para conter uma rebelião no Pavilhão 9 da Casa de Detenção de São Paulo, conhecida como Carandiru, policiais ocuparam o prédio. A ação resultou na morte de 111 detentos, outros 87 ficaram feridos. Da operação participaram mais de 300 policiais, além de cavalos e cães.

Antes da invasão, autoridades e diretores do presídio tentaram negociar com os presos, sem sucesso. A invasão começou por volta das 16h30, cerca de três horas depois do início dos confrontos entre grupos rivais dentro do pavilhão. Toda a ação durou 20 minutos.

Os sobreviventes foram orientados a se despirem e sentarem no pátio do presídio. Outros tiveram que carregarem os corpos para a galeria do pavilhão. No primeiro balanço da operação, o governo do estado anunciou oito mortes. Somente 24 horas depois do início da invasão, o número de 111 mortos foi confirmado.

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