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Por que a esquerda da Alemanha é tão fraca?

1 de julho de 2022

Socialistas governam em Portugal, Espanha e Colômbia, estão avançando na França. Êxitos com que seus correligionários alemães do A Esquerda só podem sonhar, na corda bamba entre visões de futuro e ideologias obsoletas.

Mãos erguidas contra logo do partido alemão A Esquerda (Die Linke)
Partido A Esquerda está dividido por disputas internasFoto: Picture-Alliance/dpa/M. Schutt

Por estes dias, os socialistas do partido A Esquerda da Alemanha devem estar olhando com inveja para sua vizinha França. Lá, a aliança esquerdista forjada por Jean-Luc Mélenchon emergiu das eleições legislativas como segunda principal força. No Sul da Europa, os socialistas estão efetivamente no governo há anos: Pedro Sánchez na Espanha, António Costa em Portugal. E na Colômbia, Gustavo Petro foi recentemente eleito presidente.

Isso indica que a ultraesquerda ainda pode ter êxito. Mas não na Alemanha, onde o A Esquerda é a menor bancada do Bundestag (câmara baixa do parlamento) e encarou uma série de fiascos eleitorais, só estando representado em nove dos 16 estados federados.

A sigla também está atolada em lutas internas. Em abril de 2022, foi abalada por acusações de sexismo: o semanário Der Spiegel primeiro publicou alegações de violência sexual na sucursal do estado de Hesse, ao longo de anos. Entre os acusados, estava o parceiro da copresidente esquerdista Janine Wissler.

Esquerda aferrada à "velha ideologia"

Outra razão para os fracassos recentes nas urnas são os posicionamentos contraditórios dos esquerdistas em relação à política externa e de segurança, sobretudo na reação à guerra da Rússia na Ucrânia.

Na convenção partidária de junho, a maioria dos delegados votou a favor uma moção classificando Vladimir Putin como "agressor e ocupador brutal" e apoiou sanções contra oligarcas russos e os que lucram com a invasão do país vizinho. "Não há nada que justifique a criminosa guerra de agressão", declarou Wissler, recém-reeleita copresidente da legenda.

Ao mesmo tempo, porém, enfatizou que essa guerra tem uma história. Ela se referia à Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), que se expandiu para o leste após o colapso da União Soviética, no início de 1990 – uma estratégia que A Esquerda sempre criticou. "Foi um erro não dissolver a Otan", comentou na ocasião a política de 41 anos. Alguns delegados foram ainda mais longe, ao falar de "imperialismo ocidental".

Antes da convenção, o porta-voz para política externa e ex-líder partidário Gregor Gysi acusara a ala mais radical de seu partido de se aferrar à "velha ideologia" de que "a Otan é má, os EUA são maus, o governo alemão é mau". No entanto, a Otan "não cometeu um único erro que justifique a guerra da Rússia", frisou o político veterano.

Apesar disso, os delegados esquerdistas se mantiveram unidos na rejeição dos planos para expandir as Forças Armadas alemãs (Bundeswehr) e os planos de um fundo especial de 100 bilhões de euros para aquisição de equipamento militar.

Nascida no solo comunista da Alemanha Oriental

Tradicionalmente o A Esquerda mantém boas relações com Moscou. Afinal de contas, ele tem raízes na República Democrática Alemã (RDA), a ditadura comunista do Leste, extinta com a revolução pacífica de 1989-90 e a reunificação do país. Em seguida, o todo-poderoso Partido Socialista Unitário (SED), que governara a Alemanha Oriental por décadas, se reformou e rebatizou-se inicialmente como Partido do Socialismo Democrático (PDS).

Entre 1998 e 2005, um governo de coalizão entre o Partido Social-Democrata (SPD), de centro-esquerda, e o Verde reestruturou radicalmente o mercado de trabalho, introduzindo uma série de reformas favoráveis ao empresariado, endurecendo significativamente as condições para obtenção de benefícios previdenciários ou de desemprego.

Então, membros desiludidos do SPD e sindicatos se uniram aos pós-comunistas alemães-orientais, intitulando-se A Esquerda. Seu grande sucesso veio na eleição federal de 2013, quando se tornou a maior sigla oposicionista pelos próximos quatro anos.

Contudo, os esquerdistas nunca obtiveram seus melhores resultados eleitorais no nível federal, mas sim nos estados do Leste Alemão, ou seja, no território da antiga RDA. Lá, os cidadãos descontentes, que se sentiam deixados para trás no país reunificado, encontraram um lar no A Esquerda.

O partido tentou se estabelecer politicamente à esquerda do SPD em toda a Alemanha, porém nunca conseguiu "pôr o pé na porta" das regiões populosas e abastadas do sudoeste, ficando cronicamente fora dos parlamentos estaduais.

Perigosa admiração do umbigo

O A Esquerda pode se dar por contente por integrar a coalizão de governo em quatro dos 16 estados: Berlim, Bremen, Mecklemburgo-Pomerânia Ocidental e Turíngia. Neste último, Bodo Ramelow, o primeiro e, até hoje, único governador esquerdista, há muito conclama a uma maior unidade, pois "um partido que só está interessado em seus conflitos ideológicos, sem qualquer relevância no mundo externo, pode desaparecer de cena muito rapidamente".

Por sua vez, a colíder Janine Wissler apoia suas esperanças num estudo recente da Fundação Rosa Luxemburg, afiliada ao partido. De 2.300 consultados em abril de 2022, 18% dos habitantes de cidades e áreas urbanas, mas também de localidades menores, se afirmaram dispostos a votar no A Esquerda. O mesmo se aplica a 24% dos baixos assalariados (até 2.500 euros por mês), para quem os valores centrais da legenda, como o combate à injustiça social, são prioridade absoluta.

"Mas temos que nos perguntar: por que não estamos explorando suficientemente esse potencial?", questiona-se Wissler. Sua própria resposta é contundente: perante questões vitais como a pandemia de covid-19, refugiados e proteção climática, o A Esquerda está mais ocupado consigo mesmo do que em enfrentar seus oponentes políticos.

Marcel Fürstenau Autor e repórter de política e história contemporânea, com foco na Alemanha.
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