Por que a pressão dos EUA não funciona em Pyongyang?
Spencer Kimball (av)22 de janeiro de 2016
Após suspender as sanções ao Irã, a Casa Branca considera aplicar medidas mais rigorosas contra a Coreia do Norte. Mas neste caso o potencial de retaliação é bem menor, devido ao isolamento do país e ao apoio da China.
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A política de Barack Obama para o Irã e a Coreia do Norte começou com uma mudança de retórica. Tachados de "Estados vilões" (rogue states) pelos presidentes anteriores, os dois países são agora classificados como "marginais" (outliers).
Segundo Robert Litwak, diretor do departamento de estudos de segurança internacional do Wilson Center,o presidente dos Estados Unidos apresentou a ambos "uma escolha estruturada": "Entrem em conformidade com as normas internacionais e colham os benefícios da maior integração no sistema internacional; ou persistam em práticas contrárias a suas obrigações sob o Tratado de Não Proliferação Nuclear, e enfrentem o isolamento."
Confrontados com opções idênticas, Teerã e Pyongyang adotaram caminhos diferentes. No último fim de semana, a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) verificou que os iranianos haviam cumprido suas obrigações nos termos do acordo nuclear firmado em julho de 2015. EUA e União Europeia retribuíram derrubando uma série de sanções econômicas.
Diferentes potenciais de pressão
Mas enquanto o Irã desmantelava centrífugas e jogava concreto no reator nuclear de Arak, a Coreia do Norte anunciou, na semana passada, ter detonado uma bomba de hidrogênio, em seu quarto teste nuclear da história. Especialistas colocam em dúvida o emprego da bomba de hidrogênio – para eles, a detonação foi de uma bomba atômica.
Seja como for, os EUA pretendem reagir ao incidente com sanções adicionais contra os norte-coreanos. Em meados deste mês, a Câmara dos Representantes aprovou punições mais rigorosas, e o Senado deverá votar um pacote de medidas semelhante no fim de janeiro. Apesar de todos os esforços, contudo, Washington tem menos influência sobre o país, extremamente isolado.
"A Coreia do Norte é muito menos integrada no sistema internacional do que o Irã, por não tentar vender no mercado internacional um bem de consumo de grande peso, como o petróleo", esclarece Litwak, que foi diretor para não proliferação no Conselho Nacional de Segurança de Bill Clinton.
Como o maior importador do petróleo iraniano era a UE, o Ocidente dispunha de potencial de pressão direta sobre a economia da República Islâmica. No caso da Coreia do Norte, a China, seu principal parceiro econômico, tem-se mostrado relutante em aplicar grande pressão, temendo um colapso nacional que desencadearia uma onda de refugiados através das fronteiras.
Paciência estratégica não rende resultados
Por mais isolado que Pyongyang seja, contudo, as sanções americanas tiveram impacto quando atingiram pontos de alta contundência. Em 2005, o governo George W. Bush ameaçou colocar na lista negra o Banco Delta Asia, de Macau, por suspeitar que estivesse implicado na lavagem de dinheiro norte-coreano.
Segundo o Wall Street Journal, as autoridades nacionais reagiram com o fechamento das contas da Coreia do Norte, congelando cerca de 25 milhões de dólares. China, Vietnã e Mongólia também passaram a congelar ativos norte-coreanos por precaução, temendo que, caso contrário, os EUA visassem suas contas.
Em resposta, Pyongyang boicotou as negociações com os americanos e realizou seu primeiro teste nuclear em 2006. Contudo, a pressão financeira se tornou tão grande, que o país concordou em desativar seu programa nuclear em troca do dinheiro bloqueado. No fim das contas, entretanto, ele não cumpriu sua parte no acordo.
Robert Litwak aponta que, segundo estimativas, a Coreia do Norte já possuía dez armas nucleares quando Barack Obama assumiu a Casa Branca. Os americanos então se concentraram em impedir que o Irã, que vinha expandindo seu programa de enriquecimento de urânio, também adquirisse armamento atômico.
"O governo declarou o Irã como prioridade e mobilizou a opinião nacional. Com a Coreia do Norte, ele adotou uma política chamada de paciência estratégica", afirma Litwak.
Isso significa que Washington se recusa a retomar as negociações até que Pyongyang aceda quanto à meta de desnuclearização. Até agora, os americanos estão esperando.
"A paciência estratégica não tem exercido pressão suficiente para ocasionar uma virada na política dos norte-coreanos, e no meio tempo eles estão ampliando seu arsenal nuclear, provavelmente na rota do enriquecimento de urânio", avalia o especialista em segurança.
Da energia à bomba nuclear
O Irã afirma que seu programa nuclear é exclusivamente para uso civil. No entanto, há muita semelhança entre a tecnologia nuclear para fins civis e a que tem objetivos militares.
Foto: aeoi.org.ir
Intenções obscuras
Há anos, o Irã amplia seus conhecimentos em tecnologia nuclear. A Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) está segura de que o país trabalhou em armas nucleares pelo menos até 2010.
Foto: aeoi.org.ir
Querer não é poder
Sem dúvida, a construção de uma arma nuclear com um sistema de transporte confiável impõe consideráveis desafios ao país. De forma simplificada, isso envolve cinco passos:
Foto: picture-alliance/dpa
Primeiro passo: obtenção da matéria-prima
Para fabricar uma bomba atômica, é necessário urânio altamente enriquecido ou plutônio quase puro. O Irã possui urânio suficiente, e o metal é extraído também para a indústria nuclear civil, como na minas de Saghand.
Foto: PD
Segundo passo: enriquecimento
Para seu enriquecimento, o urânio é concentrado em centrífugas de gás especiais, para facilitar a fissão. Para armas nucleares, é necessário um enriquecimento de 80%. Até novembro de 2012, o Irã alcançou oficialmente 20%. Mas após um acordo, a AIEA confirmou, em meados de 2013, que o país deixou de enriquecer urânio acima de 5% de pureza - nível suficiente para produzir energia.
Foto: picture-alliance/dpa
Terceiro passo: a ogiva
Ter urânio altamente enriquecido não basta. Para fabricar uma ogiva nuclear explosiva, os técnicos devem primeiro dar forma ao material puro e conseguir uma reação em cadeia através de um impulso controlado. Não se sabe até que ponto o Irã domina essas técnicas.
Foto: picture-alliance/dpa
Quarto passo: o detonador
A tecnologia para o detonador de uma arma nuclear é semelhante à de uma arma convencional. O Irã domina esse conhecimento. Além disso, cientistas iranianos realizaram extensos cálculos baseados em modelos e experimentos, simulando as propriedades de um detonador. Isso está comprovado por publicações das universidades Shahid Behesti e Amir Kabir.
Foto: AFP/Getty Images
Quinto passo: transporte
O Irã possui um sistema de transporte para armas nucleares. O míssil de médio alcance Shahab 3 é uma variante iraniana do Nodong-1, da Coreia do Norte. Ele alcança uma distância de 2 mil quilômetros e pode assim atingir alvos em Israel, a partir do Irã.
Foto: picture-alliance/dpa
A vontade de construir uma bomba
Sem controle, é difícil distinguir um programa nuclear civil de um militar, pois os recursos técnicos necessários são basicamente os mesmos. Precisa-se de centrífugas tanto na tecnologia nuclear civil quanto na militar. Se o Irã estará apto a fabricar uma bomba atômica e se vai realmente colocar isso em prática, depende decisivamente da vontade de quem está no poder.
Foto: dapd
Sem diálogo com Ahmadinejad
Após o programa nuclear do Irã ser descoberto, em 2002, os EUA e os aliados europeus pressionaram o país a suspender o enriquecimento de urânio. Mas a eleição do presidente Mahmoud Ahmadinejad, em 2005, interrompeu qualquer avanço nas negociações. Nos oito anos de seu governo, o número de centrífugas para o enriquecimento de urânio foi ampliado de 100 para 19 mil.
Foto: picture-alliance/dpa
Declínio econômico força Irã a negociar
Somente após a eleição do presidente Hassan Rohani, em agosto de 2013, o processo de negociações voltou a funcionar. O chefe de governo iraniano – na foto com o diretor geral da AIEA, Yukuya Amano – insta a um acordo, porque ele quer a suspensão das sanções econômicas que assolam o país há mais de uma década. As negociações diplomáticas, porém, durariam mais dois anos.
Foto: picture-alliance/dpa
"Novo capítulo"
Em 14 de julho de 2015, o Irã fechou um acordo histórico com as potências do grupo P5+1 (Estados Unidos, Rússia, China, França, Reino Unido e Alemanha). Enquanto a República Islâmica garante não produzir bomba nuclear, EUA e União Europeia prometem aliviar as sanções que têm afetado as exportações de petróleo e a economia iraniana. UE vê decisão como um "novo capítulo nas relações internacionais".
Foto: Reuters/L. Foeger
Parlamento aprova acordo
O acordo foi aprovado pelo Parlamento do Irã em 13 de outubro de 2015, efetivamente encerrando o debate entre os legisladores do país sobre o tratado e, assim, abrindo caminho para sua implementação formal. Líderes afirmam que as inspeções internacionais precisam ser aprovadas pelo Conselho dos Guardiões da Constituição. Já as sanções devem ser suspensas no final do ano ou até janeiro de 2016.