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PolíticaBelarus

Pouso forçado em Belarus não foi caso isolado

27 de maio de 2021

UE e Otan manifestaram indignação com a aterrissagem forçada de uma aeronave civil em Minsk. A Rússia, por outro lado, citou um incidente semelhante em 2013 – que envolveu um voo que transportava Evo Morales.

O avião da Ryanair, que foi forçado a fazer escala em Minsk, pousa em Vilnius, Lituânia, em 23 de maio de 2021.
O avião da Ryanair, que foi forçado a fazer escala em Minsk, pousa em VilniusFoto: Mindaugas Kulbis/AP Photo/picture alliance

O que aconteceu?

A UE anunciou sanções mais duras contra Belarus – que incluem cortar o país do tráfego aéreo europeu. Os Estados europeus e a aliança militar da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) também solicitaram uma investigação internacional sobre o pouso forçado de um avião da Ryanair no domingo (23/05), no qual o blogueiro e crítico do regime belarusso Roman Protasevich e sua parceira foram presos.

Com a ajuda de um caça, Belarus forçou o avião de passageiros a fazer uma escala em Minsk. O voo, que no momento atravessava o espaço aéreo belorusso, fazia a rota de Atenas a Vilnius e tinha a bordo Protasevich, que até então estava exilado na Lituânia. As autoridades belorrussas afirmam que a razão para tal intervenção foi uma ameaça de bomba da organização terrorista islâmica radical Hamas – uma declaração que foi recebida com ceticismo internacional diante da prisão de Protassevich.

Já houve algum caso semelhante?

Ao se pronunciar sobre o episódio, o secretário-geral da Otan, Jens Stoltenberg, falou de um incidente perigoso e inaceitável e de sequestro de Estado. No Twitter, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, descreveu o acontecimento como um ataque à democracia.

Enquanto isso, a Rússia acusou o Ocidente de hipocrisia – e fez uma comparação com o pouso forçado de um avião de Evo Morales em 2013. Até hoje, as circunstâncias exatas do episódio ainda não foram esclarecidas, sobretudo devido a declarações contraditórias por parte dos envolvidos.

No entanto, aparentemente, o motivo do pouso não planejado na Áustria da aeronave em que se encontrava o então presidente boliviano teria sido a necessidade de reabastecer – afinal, França, Espanha e outros países da UE haviam fechado temporariamente seu espaço aéreo para o voo de Morales.

A justificativa teria se baseado em informações dos EUA, que sugeriam que a bordo do avião estaria o analista americano Edward Snowden, procurado por alta traição de Estado. Após uma busca na aeronave – supostamente com a permissão de Morales – , constatou-se a ausência do ex-funcionário do serviço de inteligência dos EUA e o presidente boliviano pôde prosseguir em seu trajeto. A legalidade da operação também foi contestada na época, com a Organização das Nações Unidas (ONU) e a Organização dos Estados Americanos (OEA) criticando a parada obrigatória. Os políticos europeus, por outro lado, silenciaram a respeito.

Edward Snowden revelou práticas de espionagem dos EUA em 2013 – e vive no exílio na Rússia até hojeFoto: Justin Sullivan/Getty Images

Outros casos semelhantes de poucos forçados são raros na história da aviação, explica Steven Truxal, especialista em direito aeronáutico. Vagamente comparável, no máximo, teria sido o fechamento do espaço aéreo para aeronaves do Catar pelo Egito, Bahrein, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos em 2017.

O pano de fundo na ocasião foi a interrupção das relações diplomáticas com o Catar, que havia sido acusado de apoiar grupos terroristas e desestabilizar a região. O bloqueio só terminou no início de 2021, quando os Estados do Golfo (e o Egito) resolveram o antigo conflito.

Houve violação de tratados aéreos?

Em princípio, conforme a Convenção de Chicago sobre Aviação Civil Internacional, os Estados podem sim solicitar pousos. Mas o pedido deve ser justificado e servir para evitar um risco de segurança ainda maior do que uma aterrissagem não programada.

"Segundo relatos, um jato militar teria disparado contra o avião. Algo assim é sempre arriscado, pois temos dois aviões voando muito próximos um do outro e em comunicação", explica Truxal, professor de direito aeroespacial da Universidade de Leiden, na Holanda.

Se a ameaça de bomba realmente se revelar apenas um pretexto para prender Protassevich, Belarus poderia, portanto, ter violado o Acordo de Chicago. Segundo Truxal, também pode ter relevância jurídica no caso o Acordo de Montreal sobre o Combate a Atos Ilícitos contra a Segurança da Aviação Civil. Belarus aderiu ao tratado em 1971 – ainda que com a reserva de não se vincular ao Artigo 14, que prevê que as disputas entre os Estados contratantes sejam levadas ao Tribunal Internacional de Justiça de Haia.

Roman Protasevich se encontra sob custódia em Belarus (imagem de arquivo)Foto: REUTERS

Segundo o especialista, a parada da aeronave de Evo Morales em Viena em 2013 é juridicamente diferente "no sentido de que não havia ameaça à segurança do voo, nem fabricada, nem real". Pelo que foi informado, o avião pousou na capital austríaca para reabastecer porque não havia recebido a permissão de alguns países europeus para atravessar seus respectivos espaços aéreos. "Isso é bem diferente do pouco emergencial de um avião devido a uma suposta ameaça de bomba."

Os países europeus, portanto, não teriam violado a Convenção de Chicago ao bloquear seu espaço aéreo para o voo de Morales, diz Truxal, se – e de acordo com relatos da mídia na época – se tratasse de um uma aeronave do governo boliviano. Afinal, os aviões estatais não são cobertos pela Convenção de Chicago e devem sempre solicitar autorização para sobrevoar o território de outro país.

Dois pesos e duas medidas?

Legalmente, a aterrissagem forçada do avião da Ryanair em Belarus é apenas em parte comparável com a escala do avião Morales em Viena em 2013. No entanto, pode ter havido violações de acordos em ambos os casos – e a atual indignação no Ocidente parece desproporcional em comparação com a da época.

O pouso forçado do avião da Ryanair foi uma questão importante na cúpula da UEFoto: Yves Herman/AP Pictures/picture alliance

Nem mesmo a Alemanha viu necessidade de pedir esclarecimentos sobre o incidente com o presidente boliviano, conforme se pode deduzir a partir da resposta do então secretário de Estado do Ministério do Exterior, Harald Braun, ao pedido de um membro do Bundestag: "A recusa de sobrevoo para o presidente boliviano, Evo Morales, por alguns Estados europeus, no início de julho de 2013, não foi tema de conversações entre o governo federal e o governo dos Estados Unidos, nem com os países europeus em questão".

As diferentes condutas europeias na questão certamente se devem, por um lado, ao contexto geográfico do episódio. Tratava-se, afinal, de um avião de uma companhia aérea irlandesa que viajava em Belarus de um país pertencente ao espaço Schengen para outro, com muitos passageiros europeus a bordo.

Por outro lado, as implicações foram maiores desta vez, pois houve de fato uma prisão – ao tempo que, no voo de Morales, não havia vestígios de Snowden. Mas e se o denunciante procurado estivesse a bordo? Então o escândalo teria sido provavelmente muito maior e os Estados da UE teriam sido forçados a se posicionar de forma mais clara.

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