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Prêmio a "La vie d'Adèle" reforça sintonia de Cannes com temas atuais

Bernd Sobolla (rc)29 de maio de 2013

Palma de Ouro de 2013 é vista por muitos como uma decisão com tendência política em meio à controvérsia sobre o casamento gay na França. Não é a primeira vez que o festival se posiciona frente a tema polêmico atual.

Foto: ALBERTO PIZZOLI/AFP/Getty Images

No último domingo, Paris viu uma das maiores e mais violentas manifestações contra o casamento gay – que dias antes fora legalizado na França. Quase ao mesmo tempo, em Cannes, o júri presidido por Steven Spielberg premiava com a Palma de Ouro La vie d´Adèle (A vida de Adèle, em tradução livre) – uma escolha oficialmente de cunho artístico, mas que, para muitos, pode esconder também uma conotação política.

Se for esse o caso, não seria a primeira vez que o júri do festival de cinema mais importante do mundo toma uma posição a favor de um tema social atualmente em discussão. O filme dirigido pelo franco-tunisiano Abdellatif Kechiche passa longe da militância, mas chega num momento oportuno ao retratar a história de amor entre duas mulheres.

O mesmo teria acontecido em 2008 com o filme Entre os muros da escola, de Laurent Cantent, vencedor da Palma de Ouro com a história do professor de uma escola parisiense com grande número de imigrantes.

Ao contrário dos colegas, ele, em vez de afastar da sala de aula os alunos mais problemáticos, busca resolver os conflitos internamente. Entre os estudantes estão adolescentes de 14 a 15 anos vindos de China, Argélia, Mali e Antilhas – a maioria com problemas com a Língua Francesa e, consequentemente, dificuldades para acompanhar as aulas. O filme é um estudo social, uma resposta direta aos violentos protestos nos subúrbios parisienses de 2005 e 2007 causados por jovens imigrantes que se viam excluídos da sociedade.

O direto Laurent Cantet E o elenco de "Entre os Muros da Escola"Foto: picture-alliance/ dpa

O filme A criança, dos irmãos belgas Jean-Pierre e Luc Dardenne, vencedor da Palma de Ouro em 2005, fala sobre o jovem Bruno, de 20 anos, e sua namorada Sofia, que vivem em uma degradada cidade industrial na Bélgica.

Bruno é o líder de uma gangue. Sua namorada engravida, mas ele não tem condições de construir um relacionamento emocional com o filho – e acaba o vendendo por 5 mil euros para um traficante de bebês. Os críticos exaltaram a questão da responsabilidade de um jovem em meio à degradação moral em subúrbios de Bélgica e França.

Cena do filme "A Criança" dos irmãos belgas Jean-Pierre e Luc DardenneFoto: Daphne Distribution

O documentário "Fahrenheit 11/9" de Michael Moore, vencedor em 2004, não era apenas uma declaração política, mas também um apoio à campanha presidencial democrata nos EUA. Moore havia concordado em realizar o filme para contribuir com a tentativa de evitar a reeleição de George W. Bush.

No filme, o diretor analisa as conexões da família Bush com empresas árabes, incluindo membros da família Bin Laden, e observa a política americana após os atentados do 11 de Setembro. O fato de o documentário ter entrado em competição – que normalmente conta apenas com filmes – gera um aceno a uma possível escolha política. O júri era, além disso, presidido por Quentin Tarantino, um americano.

Tendência também em Berlim

O Festival de Cinema de Berlim também já teve "coincidências" como as de Cannes. Há dois anos, o filme iraniano A Separação, de Asghar Farhadi, que era uma resposta à opressão do regime de Teerã, faturou o Urso de Ouro na Berlinale.

O filme narra a história de um homem e uma mulher casados há 14 anos, à beira do divórcio. A esposa não quer que sua filha cresça "sob essas condições". Ela deseja deixar o país com a a família, mas o marido se recusa a abandonar seu pai doente.

Cena do filme "A Separação"Foto: Alamode Film

Já o excelente Em Segredo (2006), de Jasmila Zbanic, pode ser visto como uma denúncia à falta de condenações após a guerra da Bósnia, que terminara 11 anos antes. O filme conta a história de Esma e sua filha Sara, de 12 anos. As duas vivem em Grbavica, um bairro de Sarajevo. Esma esconde da filha que é uma das incontáveis vítimas de estupros sistemáticos durante a guerra – e que Sara é fruto dessa violência.

Michael Winterbottom ganhou a Berlinale em 2003 com o filme Neste Mundo, que relata a fuga de uma família afegã moradora de Peshawar, no Paquistão. Os pais, no desejo de proporcionar ao filho uma vida melhor, compram através de contrabandistas uma passagem para Londres – e uma perigosa aventura se inicia. A premiação do filme foi, ao mesmo tempo, um protesto contra a política europeia para refugiados. Estima-se que, a cada ano, dois milhões de indivíduos caem nas mãos de traficantes de pessoas.

Apesar de ser uma tendência em diversos festivais de cinema, é quase consenso entre os críticos que apenas o caráter de protesto político de um filme não basta para que ele seja premiado. Deve-se compreender também os pré-requisitos artísticos para chamar a atenção do júri – e foi sem dúvida este o caso de La vie d'Adéle, que já era o favorito de muitos em Cannes.

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