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"Praia do Futuro", uma história de contrastes

Marco Sanchez, de Berlim11 de fevereiro de 2014

Único longa brasileiro em competição na Berlinale, novo filme do cearense Karim Aïnouz busca no drama do personagem de Wagner Moura embate entre medo e coragem, família e indivíduo, Brasil e Alemanha.

Berlinale Filmstills - A Praia do Futuro
Foto: Berlinale

Praia do Futuro, novo filme de Karim Aïnouz, é um longa de contrastes, mas também pode ser visto como uma narrativa sobre histórias pessoais e vidas que se completam.

A jornada de Donato (Wagner Moura) fala não só de procura, mas também de amor, família e da busca do sonho abstrato de ser você mesmo em sua totalidade, nem que para isso você tenha que se reinventar no mais inesperado dos lugares.

"Era importante que o filme falasse de personagens que se aventurassem, tivessem coragem e não medo. Queria que essa coragem os deixasse em movimento", disse Aïnouz durante a entrevista após a exibição do filme para a imprensa, nesta terça-feira (11/02).

Aïnouz faz sua estreia em dose dupla na Berlinale deste ano. Além de Praia do Futuro, ele contribuiu com um seguimento de Catedrais da Cultura, exibido fora de competição. Já Moura é quase um veterano no festival.

"Berlim é uma das minhas cidades favoritas. Estive duas vezes na Berlinale com os Tropa de Elite e ganhamos o Urso de Ouro. Passar dois meses em Berlim com a minha família e pessoas que conhecem a cidade foi bacana para a construção do personagem", disse o ator durante a coletiva.

A liberdade do incerto

Donato é um salva-vidas que trabalha na Praia do Futuro, uma popular praia de Fortaleza. Quando dois alemães se afogam no mar, o salva-vidas consegue resgatar Konrad (Clemens Schick). Enquanto o alemão espera o corpo do amigo aparecer, os dois começam a se aproximar.

O que era uma forte atração sexual acaba se tornando uma relação mais profunda e emocional. Donato também é muito apegado a seu irmão Ayrton (Sávio Ramos), um menino de 10 anos, fã de histórias em quadrinhos e que tem medo do mar. Quando o brasileiro vai para Berlim visitar Konrad, ele toma uma decisão que vai mudar profundamente sua vida. Ele decide ficar em Berlim.

"As questões de deslocamento e estranhamento estão presentes no filme, mais do que a questão clássica da imigração. Queria tratar de como você se coloca em outro espaço e como um lugar estrangeiro pode ser libertador. A cena em que ele decide ficar, se arriscar sem saber o que vai acontecer foi muito importante na história do filme", explicou Aïnouz, responsável pelo roteiro ao lado de Felipe Bragança.

Apesar de não tratar diretamente da imigração, o diretor brinca um pouco com os estereótipos que os alemães têm sobre os brasileiros – em certo momento do filme uma personagem diz para um melancólico Donato que achava que todos os brasileiros fossem felizes.

Karim Aïnouz: "Era importante que o filme falasse de personagens que se aventurassem"Foto: Alexandre Ermel

Donato é mais racional, e Konrad, mais emocional. As bem realizadas e realistas cenas de sexo dão um caráter mais amplo sobre o sentimento dos personagens e revelam detalhes que não precisam ser ditos.

O filme também acerta nos ângulos em que mostra Berlim, fugindo do convencional e revelando pequenos pedaços que ilustram bem a vida na cidade, além de sutilezas que evidenciam seu lado multicultural.

Destruindo mitos

Anos mais tarde, Ayrton (agora vivido por Jesuíta Barbosa) vai a Berlim atrás do irmão, que abandonou a família no Brasil quando decidiu se mudar para a Alemanha. O jovem vaga pela cidade antes de confrontar o irmão de maneira raivosa e violenta. Ele foi atrás de respostas deixadas pelo seu super-herói da infância.

"Fiquei duas semanas sozinho num albergue em Berlim. Foi minha primeira viagem internacional e ajudou muito para construir o personagem. Trabalhei muito em cima das questões de intimidade com a Fátima Toledo (preparadora do elenco). Tinha esse sentimento de abandono relacionado com a minha experiência com o meu pai", revelou Barbosa durante a entrevista coletiva.

A visita de Ayrton faz com que Donato reencontre Konrad e repense sua vida e seu passado. De diferentes maneiras, o encontro acaba libertando o trio de fantasmas do passado.

O diretor brinca um pouco com os estereótipos que os alemães têm sobre os brasileirosFoto: Alexandre Ermel

"Acho bonito quando os personagens são liberados no final de uma história e você não sabe o que vai acontecer. Gosto quando o cinema funciona fora do quadro porque trabalha o espectador de uma maneira viva. Sou brasileiro, gosto de ter a ideia de um mistério redentor nos meus filmes", disse o diretor.

Politicamente importante

Quando questionado se não teve receio de viver um personagem gay, Moura declarou que isso não teve nenhuma relevância na hora de escolher o papel.

"O filme não é uma história de amor. Quanto mais tratarmos o assunto com naturalidade, mais ajudamos politicamente na questão do preconceito. No filme ela é dramaticamente secundária, mas acho importante dois homens estarem se beijando e se amando na mostra competitiva da Berlinale", disse o ator.

"Engraçado que Ninfomaníaca pode, mas isso aqui é um problema. Temos que sempre estar nas margens. Não! Esse negócio de margem acabou", concluiu Aïnouz.

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