“Precisamos repensar conceitualmente a Rodada de Doha”, diz Roberto Azevêdo
18 de maio de 2013Paciência, criatividade e pensamento realista serão os principais instrumentos usados pelo novo diretor-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), o embaixador brasileiro Roberto Carvalho de Azevedo, para comandar o órgão. Azevêdo, que tomará posse em 1º de setembro, vê como problemática a paralisação das negociações multilaterais e o avanço das negociações bilaterais ou em grupos menores – caminho adotado pelos países diante do fracasso da Rodada de Doha.
Segundo ele, para que um acordo mais concreto aconteça, os países precisam pensar nos "limites do possível, e não do desejável". "Precisamos esquecer o que gostaríamos de ter na rodada e procurar identificar o que é possível obter dela e, a partir daí, montar uma mesa de negociações que esteja voltada para esse enfoque", disse Azevêdo, em sua primeira visita ao Brasil após a confirmação de sua eleição para o cargo.
Em declaração à imprensa no Palácio do Itamaraty, em Brasília, o primeiro latino-americano escolhido para comandar a OMC apontou como estratégia a busca por visões e perspectivas novas, que serão desenhadas a partir das conversas que manterá com os membros até setembro. "O difícil é trazer as pessoas à mesa com um espírito construtivo, com a vontade de encontrar soluções", reforçou.
Conferência de Bali: tempo curto
Marcada para acontecer em dezembro em Bali, na Indonésia, a 9° Conferência Ministerial da OMC será o desafio mais urgente de Azevêdo, ciente do curto intervalo entre sua posse e a reunião. "As negociações não estão avançando com a velocidade e da maneira que nós esperávamos. Estamos em um momento delicado, de certo pessimismo em Genebra", disse Azevêdo, que espera conseguir "reverter a situação".
"Esse pra mim é o desafio maior. Acho que se formos bem sucedidos aí, a agenda da organização vai se movimentar com muito mais facilidade, não só nas negociações, mas também nas discussões dos temas da atualidade", avaliou.
A reunião de representantes de todos os países membros em Bali deverá se concentrar, segundo Azevêdo, em temas como a facilitação do comércio, agricultura, administração de cotas tarifárias e segurança alimentar.
Fim lento e gradual do protecionismo
Perguntado sobre as críticas às medidas brasileiras consideradas protecionistas por muitos países, Roberto Azevêdo enfatizou que, a partir de agora, seu papel como diretor-geral da OMC é procurar favorecer a liberalização comercial do mundo de maneira geral. Identificar determinado país como protecionista é papel dos membros.
Ele ainda reforçou que sua atenção agora estará voltada para as tendências gerais e alegou que, muitas vezes, é difícil chegar a um consenso quando o assunto é medidas de proteção. "Não é óbvio, muitas vezes, identificar uma medida como sendo uma medida restritiva ao comércio ou não. Cada um tem sua versão dos fatos".
Azevêdo lembrou que, a partir de 2008, o protecionismo tornou-se uma resposta comum à crise. Segundo ele, até o final do ano passado, cerca de 20% dessas medidas já haviam sido descartadas. Ele alerta que o movimento de liberalização será lento e gradual: "Não vamos ter reversão desse quadro de maneira muito abrupta."
O novo diretor da OMC também fez questão de ressaltar que, apesar de brasileiro, não irá representar os interesses nacionais na organização. Este será o papel do seu sucessor no cargo de embaixador brasileiro junto à organização, cujo nome ainda não foi anunciado.
Transição para o novo mandato
Azevêdo fica no Brasil até a próxima semana. Além de agradecer o governo brasileiro pelo apoio dado à sua eleição, sob o comando do embaixador Ruy Pereira, ele terá encontros com ministros, representantes da sociedade civil e empresários. Ainda não houve uma reunião com a presidente Dilma Rousseff, mas a conversa deverá acontecer nos próximos dias.
A visita faz parte do processo de transição até que ele assuma, oficialmente, o mais alto cargo na OMC, substituindo o francês Pascal Lamy. "A ideia é conversar sobre o sistema multilateral, o cenário da economia mundial e da própria economia brasileira", disse Azevêdo, que começa a pensar na composição do seu gabinete.